A eleição de 2022, além de marcada pela disputa polarizada entre Lula (PT) e Bolsonaro (PL), tem a característica de ser aquela em que, desde a redemocratização, mais movimentos populares lançam, de forma coordenada, candidaturas próprias.
Buscando ocupar espaço na Câmara dos Deputados em Brasília, em Assembleias Legislativas Estaduais, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tem 15 candidaturas neste pleito.
Não é inédita a disputa institucional por parte de militantes sem-terra. A primeira foi quando o gaúcho Adão Pretto, dois anos depois do surgimento do MST (do qual foi um dos fundadores), foi eleito deputado estadual constituinte em 1986 pelo PT, também recém-criado na época. Em 2022, no entanto, é a primeira vez que o MST entra na disputa eleitoral com essa quantidade de candidatos e uma campanha articulada nacionalmente.
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O mesmo pode ser dito da campanha indígena lançada pela Articulação dos Povos Indígenas (Apib) sob o mote “Aldear a política” e de setores do movimento negro impulsionados pela Coalizão Negra por Direitos, com o eixo “Quilombo nos parlamentos”.
Entre os principais aspectos que, segundo lideranças do MST ouvidas pelo Brasil de Fato, motivam essa escolha política, está a avaliação de que a disputa eleitoral contribui para articular a luta pela reforma agrária com pautas mais amplas; que essas cadeiras devem ser ocupadas por segmentos representativas da sociedade brasileira; além de que as decisões tomadas por quem as ocupa têm impacto na vida da população brasileira.
Trata-se, também, de uma “contraofensiva institucional”, como diz documento do MST a respeito de suas candidaturas, entendendo ser uma resposta ao que nomeiam como “avanço das forças fascistas”.
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“Os nossos candidatos são porta-vozes da luta pela terra, pela agricultura familiar, alimento saudável, emprego, distribuição de renda, soberania nacional”, elenca Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST. Cumprem também o papel, diz ele, “de fazer a disputa eleitoral contra Bolsonaro e em defesa da eleição do presidente Lula”.
Ampliação de pautas e de espaços ocupados
Lembrando que o movimento está a dois anos de completar quatro décadas de existência, a também coordenadora nacional Débora Nunes, aponta que “o lugar de fala” do MST é o da luta pela conquista da terra, mas que essa bandeira está relacionada com outras que são “de interesse e necessidade de toda a sociedade”.
“Nós também fomos compreendendo que a luta na rua é importante, mas que existem outros espaços na estrutura da nossa sociedade que, no final das contas, também definem os rumos do atendimento ou não dessas pautas”, afirma Débora.
“Minha cabeça pensa onde meus pés pisam”
Segundo Nunes, o MST entende que “esses sujeitos sem-terra que estão neste pleito têm a legitimidade de serem representantes de um segmento da sociedade que demanda desse poder as ações, leis e políticas que efetivamente resolvam problemas de injustiças no nosso país”.
“Precisamos eleger a maior bancada possível de trabalhadores para fazer uma ampla disputa no Congresso Nacional, que é hoje tomado pelo poder do agronegócio, das grandes empresas”, diz Alexandre Conceição.
Para se ter uma ideia, dos parlamentares que representam os nove estados que compõem a Amazônia Legal, 74% dos senadores e 56% dos deputados federais fazem parte da bancada ruralista. Além disso, de 513 parlamentares que compõem a Câmara dos Deputados, 71% são homens brancos.
“O ideal é que a representação do povo fosse feita efetivamente por quem vivencia os problemas. Minha cabeça pensa onde meus pés pisam”, complementa Nunes. “Quem está na periferia vendo vários jovens sendo assassinados por uma polícia que desrespeita o povo pobre, quem está na luta pela moradia, no sindicato, pela reforma agrária, é quem efetivamente sabe dos problemas, é quem constrói a resistência e é quem deveria estar no parlamento representando esse povo”, defende a coordenadora do MST.
Reação ao momento político
A escolha por dar maior peso à disputa eleitoral parte de uma avaliação do MST que se amadurece a partir do impeachment da então presidenta Dilma Rousseff (PT), em 2016. “Em seguida vem o [Michel] Temer (MDB) e o governo Bolsonaro, vem a pandemia, um maior ataque desta política neoliberal”, descreve Alexandre Conceição.
“Isso nos leva a uma condição de termos que nos organizar, ainda mais, para a luta institucional e para as ações de solidariedade”, explica, ao contar que o MST doou, durante a pandemia, cerca de sete mil toneladas de alimentos, um milhão de marmitas e 170 mil livros.
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Citando a fome, que atinge atualmente 33,1 milhões de pessoas no Brasil e faz com que cerca de um terço da população de Alagoas esteja nesse momento sem ter o que comer, Débora Nunes resume que “esse contexto ajudou na definição do movimento de trilhar pela luta institucional nesse momento histórico”.
“Estamos cada vez mais acordados e preparados”, salienta Alexandre Conceição, para quem a disputa eleitoral de 2022 vai ser acirrada e na qual “está em jogo o futuro do Brasil”.
Edição: Rodrigo Durão Coelho