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Precisavam de um leiloeiro com voz alta e potente, e que tivesse capacidade para fazer o papel de leiloeiro, coisas que não faltavam ao meu ex-colega - Creative Commons
Era boa gente, amistoso, mas tinha compulsão de brigar com motoristas de ônibus, não sei porquê

Um vizinho meu tem a voz tão forte que parece uma trombeta, e por causa dele me lembrei de um cara que foi meu colega no curso de Geografia, na Universidade de São Paulo.

Era o Valdemar. Tinha um vozeirão.

Quando entramos na faculdade, havia duas linhas de ônibus do centro para a Cidade Universitária. Uma delas de uma empresa à beira da falência, tinha só dois ônibus velhos, o intervalo entre as viagens era grande e às vezes o ônibus quebrava e nos deixava no meio da rua.

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A outra era melhor e, claro, era a nossa preferida. O ônibus era sempre superlotado, mas eu não me importava de fazer o trajeto de uma hora em pé, apertado no meio de todo mundo. Só tinha uma coisa que eu receava: torcia para não encontrar o Valdemar no ônibus, porque era certeza que haveria encrenca.

Era boa gente, amistoso, mas tinha compulsão de brigar com motoristas de ônibus, não sei porquê. De vez em quando, eu estava distraído conversando com algum colega no ônibus abarrotado de gente e logo escutava um bate-boca do Valdemar com o motorista.

Um dia, em plena rua Augusta, ele pentelhou tanto o motorista que o sujeito puxou o freio de mão, desligou o motor, abriu a porta do ônibus e saiu correndo, gritando: “Não dirijo mais essa porcaria, vou embora pra casa”. Jogou fora um emprego público na CMTC, a Companhia Municipal de Transportes Coletivos, por causa do Valdemar.

Depois que terminamos o curso de Geografia, passei muitos anos sem saber do Valdemar, até que me contaram que um grupo de criadores de gado queria fazer em São Paulo leilões como viram em outros países, coisa que não existia aqui.

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Precisavam de um leiloeiro com voz alta e potente, e que tivesse capacidade para fazer o papel de leiloeiro, coisas que não faltavam ao meu ex-colega.

Um dos fazendeiros contou que no seu prédio, no bairro de Perdizes, morava um sujeito lá no alto, chegado a uma discussão, cuja voz era ouvida a longa distância.

— Ele mora pra cima do décimo andar. Quando discute com alguém no apartamento dele, eu escuto do meu, no primeiro andar — contou.

Pronto! Era ele! Estava decidida a sorte do Valdemar. Virou leiloeiro, ganhou um dinheirão com isso e virou empresário.

 

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Daniel Lamir