Na década de 1990, organizações globais começavam a usar um termo já conhecido pela luta feminista e pela academia no debate sobre as desigualdades entre homens e mulheres. A palavra gênero, como expressão usada para tratar das imposições sociais sobre o que é feminino ou masculino, foi popularizada nos movimentos de luta pelos direitos às mulheres e nas universidades nos anos 1970.
Somente na década de 1990, a expressão entrou no vocabulário de instituições como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização Mundial da Saúde (OMS). A igualdade de gênero e a busca pelo fim das diversas violências que vitimam mulheres estavam cada vez mais presentes na pauta.
Em reação, um movimento dos setores mais conservadores da igreja católica criou e alimentou uma teoria da conspiração que hoje é presente em praticamente toda a direita mundial. Para essas vertentes do catolicismo, combater as desigualdades de gênero é uma forma de destruir o que o conservadorismo chama de “família natural”.
Nesta edição o BdF Explica a ideia falsa de que uma ideologia de gênero vem sendo propagada globalmente para manter a sociedade desigual.
Uso político
Para os religiosos que criaram a ideia de um complô global destinado a destruir a família, os papeis impostos pela sociedade a mulheres e homens são naturais e não devem mudar ou ser questionados.
Em 2004, por exemplo, o religioso Joseph Aloisius Ratzinger, que posteriormente foi papa e ficou conhecido como Bento 16 - representando o lado mais conservador do catolicismo -, escreveu um texto em nome do Vaticano no qual condenou tal “ideologia de gênero”.
O documento responsabiliza o feminismo pela criação de uma rivalidade radical entre os homens e mulheres, o que causaria uma "confusão prejudicial que tem sua implicação mais imediata e nefasta na estrutura da família".
Isso inclui não só a luta das mulheres, mas também os direitos da população LGBTQIA+ e até mesmo a garantia de educação sexual nas escolas e o combate à violência doméstica. Em certa medida, todos os avanços nesses setores são vistos como um risco à estrutura tradicional da sociedade capitalista e à “família natural” da Bíblia.
Atualmente, a presença do discurso na sociedade foi ampliada e atinge, inclusive, as esferas políticas. No Brasil, por exemplo, o combate à ideia falsa da ideologia de vento teve papel central para o governo de Jair Bolsonaro (PL)
Desde a campanha eleitoral de 2018, tanto o presidente como aliados e aliadas propagam os riscos do monstro inexistente inventado pela direita.
A tendência se repete em outros países do mundo. Uma pesquisa encomendada pelo Brasil de Fato ao coletivo Actantes, revelou que já em 2017 a ocorrência do termo "Ideologia de Gênero" nas redes sociais era significativa na América Latina.
Esse mesmo levantamento revelou que as ideias propagadas pela nova direita têm aproximação temática com o que defendem grupos evangélicos e católicos. Na pauta estão justamente a defesa da família e dos valores tradicionais.
Edição: Rodrigo Durão Coelho