Os primeiros seis meses de 2022 foram de alta da inflação no Brasil. De janeiro a junho, os preços dos produtos mais consumidos no país subiram 5,49% na média, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O cigarro, entretanto, subiu apenas 0,06% no período.
A diferença não é exceção. Desde 2018, ano da eleição do presidente Jair Bolsonaro (PL), o cigarro sobe menos que a inflação no Brasil.
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A situação contraria recomendação especialistas em tabagismo. Para eles, o aumento dos preços é uma das formas mais eficazes de reduzir o consumo de cigarros.
Ela também coincide com o fim da política de preços e impostos sobre cigarro, que vigorou de 2011 a 2016 e pressionou por aumentos anuais nos produtos de tabaco.
Sem a política e com cigarros menos caros, pesquisas apontam que o percentual de fumantes no Brasil parou de cair. Há levantamentos que indicam, inclusive, que o percentual de adolescentes fumantes cresceu.
Em 2015, 6,6% dos adolescentes com entre 13 e 17 anos eram fumantes, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), também realizada pelo IBGE. Em 2019, esse percentual chegou a 6,8% – 0,2 ponto percentual a mais.
Já a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde, indica que o percentual de fumantes no Brasil caiu de 13,4% em 2011 para 10,2% em 2016 –período de vigência da política de tributos e preços.
Em 2019, já após o fim da política, ainda estava em 9,8%. Caiu para 9,1% no ano passado.
A Vigitel também aponta que, de 2016 a 2018, o consumo de cigarros por pessoa cresceu. Até 2016, esse indicador apresentava queda.
“Houve uma política até meados de 2016. Ela elevou os preços e ajudou a reduzir o consumo de cigarro no Brasil”, afirmou o economista e especialista no mercado de cigarro Roberto Iglesias. “Com o fim da política, o preço do cigarro não cresceu como a renda e o restante dos produtos. As pessoas tendem a fumar mais.”
Preço e tributos
A política de preços e impostos sobre cigarro foi criada pela Lei 12.546, de 2011. Ela aumentou a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) cobrado sobre o cigarro assim como estabeleceu valores mínimos para a venda do produto.
A partir de 2011, por exemplo, nenhum maço de cigarro poderia ser vendido por menos de R$ 3 no país. Esse valor aumentou R$ 0,50 por ano até 2016, chegando a R$ 5.
Só por conta desse preço mínimo, o maço de cigarro subiu 66% em menos de seis anos. Já o preço do maço da marca mais vendida subiu de R$ 3,25 para R$ 6,25 de 2011 a 2015. Em 2016, esse mesmo maço baixou para R$ 5,50. Ainda assim, são 69% de aumento.
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Desde então, porém, esse preço segue o mesmo. Enquanto isso, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita no país cresceu.
Para comprar 100 desses maços de cigarro em 2016, era necessário empenhar 1,81 PIB per capita brasileiro. Em 2021, o empenho necessário para a compra dos 100 maços baixou para 1,36 PIB per capita –mesmo nível de 2008, ou seja, de antes do início da política de preços e impostos.
“Quando a vigência da política acabou, a Receita pediu um prazo para avaliar seus resultados e decidir os próximos passou. Até hoje, não se tomou uma decisão”, afirmou Iglesias, que participa de discussões sobre o assunto como consultor da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT).
Moro quis baixar
Para Iglesias, falta vontade para o governo aumentar o preço dos cigarros em busca da redução do consumo. Segundo ele, fábricas de cigarro mantêm intenso lobby entre autoridades contra políticas de prevenção ao tabagismo.
Iglesias disse também que o aumento do preço também esbarra no combate ao contrabando. Em tese, quanto maior o custo do cigarro legal vendido no Brasil, maior o incentivo a contrabandistas a importar cigarro ilegal principalmente do Paraguai.
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Quando foi ministro da Justiça do governo Bolsonaro, Sergio Moro, chegou a criar um grupo de trabalho para estudar a desoneração do cigarro brasileiro com o objetivo de combater o contrabando. O grupo, porém, rejeitou a proposta.
Iglesias disse que a ideia contraria a visão e sanitaristas. Para ele e a ACT, a política de aumento de preços e impostos dos cigarros deveria ser retomada pois salva vidas.
Hoje, 11% das mortes consideradas prematuras na América Latina têm relação com o tabagismo.
O Brasil de Fato procurou Receita Federal, Ministério da Economia e Ministério da Saúde para obter informações sobre a eficácia da política de preços e tributos sobre cigarros, e questionou os órgãos sobre sua eventual retomada. Ninguém respondeu.
Edição: Rodrigo Durão Coelho