Existia também o voto de cabresto. Certos empregados eram obrigados a votar em quem o patrão mandava
Por que Bolsonaro fica fazendo declarações contra as urnas eletrônicas?
Tem sentido... Antes da implantação das urnas eletrônicas, em 1996, o voto era em cédulas de papel. O eleitor tinha que escrever o nome do candidato a qualquer cargo nessa cédula. Se não escrevesse nada, era voto em branco, que não conta para ninguém, mas às vezes acontecia de o pessoal que fazia a apuração ser todo ligado a um determinado candidato e escrevia o nome dele nessas cédulas.
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No Rio de Janeiro, em 1994, fizeram tanto isso que virou escândalo. Alguns candidatos a deputado tiveram um monte de votos em que a caligrafia usada ao escrever o nome do candidato era a mesma. Adivinhem quem era um desses candidatos!
Coisas como essa justificavam um ditado usado por candidatos corruptos: eleição não se ganha na votação, mas na apuração.
Numa eleição na Bahia, Antônio Carlos Magalhães, ligado à ditadura e conhecido como Toninho Malvadeza, resolveu detonar um adversário. Ele mandava e desmandava na Bahia, até na Justiça. Acho que foi em 1982, quando Waldir Pires se candidatou a senador e era favorito para vencer, mas veio a apuração... e ele perdeu. Num município, o resultado divulgado foi que ele não teve nenhum voto. Zero voto! Todos foram para o candidato do Toninho Malvadeza.
Existia também o voto de cabresto. Certos empregados eram obrigados a votar em quem o patrão mandava.
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E também existia o hábito de transportar eleitores até o local de votação. No interior, iam buscar os eleitores na roça, de caminhão, e davam até um lanche para ele. Depois da votação o mesmo caminhão levava a turma de volta pra roça.
Numa eleição para prefeito na minha terra, no tempo da ditadura, não havia oposição, mas a Arena, partido da ditadura, tinha duas facções: Arena 1 e Arena 2. E cada uma tinha seu candidato.
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A Arena 1 ofereceu aos eleitores da roça sanduíches de mortadela e guaraná. O candidato da Arena 2, metido a mais moderno, ofereceu aos seus eleitores uma novidade: em vez de mortadela, como sempre, foi sanduíche de presunto, coisa que não existia lá.
Na volta dos eleitores para a roça, de caminhão chacoalhando na estrada esburacada, um eleitor que estava no caminhão da Arena 1 não aguentou e vomitou. Ficou com fama de traidor: é que vomitou presunto, sinal que esteve nas bases da Arena 2, porque o resto do pessoal do caminhão tinha comido mortadela.
*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Daniel Lamir