O Conselho Nacional de Defensoras e Defensores Públicos Gerais (Condege) emitiu uma nota técnica na última quinta-feira (28) apontando inconsistência no Decreto 11.150/2022, do governo federal, que regulamenta as condições para considerar um cidadão superendividado e define valor mínimo existencial que não pode ser comprometido com dívidas.
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A nota do Condege critica a definição do mínimo existencial em um valor fixo de 25% do salário mínimo, ou seja, R$ 303 neste ano. De acordo com o documento, a regulamentação do mínimo deve respeitar a Lei do Superendividameto, "sob pena de ilegalidade e consequente nulidade (...) como forma de evitar a exclusão social do consumidor".
"Esse decreto tem a aptidão de tornar a Lei de Superendividamento vazia, além de autorizar, de forma inconstitucional, o vilipêndio à dignidade e à subsistência da pessoa miserável e vulnerabilizada pela oferta irresponsável do crédito, em prol somente dos bancos", disse o coordenador do Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (Nudecon), o defensor público Eduardo Chow De Martino Tostes.
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Ainda de acordo com a nota do Condege, o decreto "estimula o fornecimento de crédito irresponsável, pois autoriza que as instituições financeiras realizem empréstimos desde que a prestação mensal preserve apenas R$ 303,00 da renda mensal do devedor, em evidente abuso de direito e em contrariedade aos art. 6º, inciso XI, e 54-D, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor".
Com 44 milhões de superendividados, o Brasil vê a inadimplência crescer como resultado da inflação em alta, os juros em patamares elevados e o desemprego que atinge mais de 10 milhões de trabalhadores.
Em 2018, a Defensoria Pública do Rio realizou um estudo que apontou que pessoas de 55 anos eram as mais afetadas pelo superendividamento. De acordo com o levantamento aposentados e funcionários públicos eram os mais atingidos pelo problema.
Defesa do consumidor
A coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, criticou a lógica de que todos os serviços considerados essenciais podem ser pagos com esse valor.
"Agora pense se isso é possível. Como pagar o aluguel, a conta de energia, de água, o condomínio, comprar comida, água para beber, gastos básicos com saúde e educação com R$ 300? É isso que o governo Bolsonaro diz ser factível", questionou Ione Amorim.
Segundo o Idec, o restante do valor fica liberado para que bancos, que serão o mais beneficiados com o decreto de Bolsonaro, possam pegar como pagamento de dívidas das pessoas.
"Em uma grande manobra para favorecer os bancos, o governo entrega ao setor a vida financeira dos consumidores. Entre as medidas recentemente anunciadas está a ampliação da margem de consignação de 35% para 45% da renda dos usuários do crédito consignado, inclusive com a possibilidade de consignação do Auxílio Brasil, programa social para a população em situação de vulnerabilidade. Agora os bancos ainda podem utilizar 75% da renda do consumidor para pagar as dívidas bancárias", explicou a coordenadora do Idec.
Edição: Eduardo Miranda