Muito constrangimento fechou o encontro ocorrido nessa segunda (18) entre o presidente, Jair Bolsonaro (PL) e um grupo de embaixadores estrangeiros, no Palácio do Planalto. Nele, o mandatário disparou fake news contra os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE), colocou em dúvida o sistema eleitoral brasileiro e não economizou em teorias conspiratórias - sem fundamento na realidade.
“Nós não podemos enfrentar mais uma eleição, sob o manto da desconfiança. Temos que ter a certeza de que o voto de um eleitor, vai para aquela pessoa”, começou Bolsonaro, que em seguida, o presidente mirou em ministros da Corte.
“Quando se fala em eleições, vem à nossa cabeça transparência. E o senhor Barroso (Luís Roberto Barroso, ministro do STF), também como senhor Edson Fachin (presidente do TSE), começaram a andar pelo mundo me criticando, como se eu estivesse preparando um golpe. É exatamente o contrário o que está acontecendo”, acusou Bolsonaro.
Em seu discurso, o presidente requentou acusações já rebatidas pelo TSE. Ele partiu de um inquérito aberto pela Polícia Federal em 2018 sobre uma tentativa de invasão de um hacker ao sistema do TSE. O tribunal já esclareceu que esse acesso foi bloqueado e não teve qualquer interferência no resultado das eleições. Não foi a primeira vez que Bolsonaro utilizou esse inquérito para atacar a segurança das urnas, sendo inclusive alvo de investigação no STF por ter vazado documentos sigilosos da PF relacionados ao inquérito em suas redes sociais.
O pedido de encontro com embaixadores estrangeiros surgiu às pressas, após o presidente do TSE ter se reunido com os representantes de outros países. “Aqui uma reunião do ministro Fachin com alguns dos senhores ou representantes alertando-os contra acusações levianas. O que eu estou falando aqui não tem nada de leviano.”
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Os ataques aos ministros seguiram. “Me acusam de atentar contra as eleições e a democracia. Quem faz isso é o próprio TSE ... Nós vemos claramente, ministro Fachin foi quem tornou Lula elegível, e agora é presidente do TSE. Ministro Barroso foi advogado do terrorista Battisti que recebeu aqui o acolhimento do presidente Lula em dezembro de 2010. O ministro Alexandre de Moraes advogou no passado para grupos que, se eu fosse advogado, não advogaria”, insinuou Bolsonaro.
Para o encontro desta segunda-feira, a Presidência da República convidou Fachin e Barroso. Ambos recusaram o convite. O presidente do TSE afirmou que “o dever da imparcialidade impede de comparecer ao evento.”
Antirrepublicano e eleitoreiro
Parlamentares da oposição reagiram com rapidez às declarações de Bolsonaro, e anunciaram que entrarão com representações na Justiça contra o presidente “Eu e os demais líderes dos partidos da oposição vamos denunciar Bolsonaro pelo crime que cometeu ao chamar embaixadores de outras nações para atacar e desacreditar o sistema eleitoral brasileiro, que o elegeu, aliás, por 30 anos. E ainda cometeu esse crime usando uma TV pública!”, afirmou em suas redes sociais o deputado federal e líder da minoria na Câmara, Alencar Santana (PT-SP).
A reunião convocada por Bolsonaro, que é pré-candidato à reeleição, aconteceu no Palácio da Alvorada, usando estrutura do governo e com transmissão da TV Brasil.
“Não haverá trégua à escalada fascista e autoritária de Jair Bolsonaro!”, concordou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). “Estamos encaminhando, ainda hoje, representação ao TSE nos seguintes termos: 1. Condenar o pré-candidato Jair Bolsonaro por propaganda irregular; 2. Condenar o partido de Bolsonaro a imediatamente divulgar errata desmentindo os termos das declarações do seu candidato em TVs públicas.”
“Ao convocar embaixadores de vários países e ministros de Estado para uma exposição, mais uma, contra o sistema eleitoral brasileiro, Bolsonaro usa uma prerrogativa de chefe de Estado para uma agenda que é a um só tempo antirrepublicana e eleitoreira”, acusou o senador Humberto Costa (PT-PE)
Um dos alvos de Bolsonaro, o ministro do Supremo tribunal Federal Edson Fachin classificou a reunião como uma “encenação” para divulgar “narrativas nocivas”. "Há um inaceitável negacionismo eleitoral por parte de uma personalidade pública importante dentro de um país democrático e é muito grave a acusação de fraude, de má fé, a uma instituição, sem apresentar prova alguma", afirmou, sem citar diretamente Bolsonaro, em uma palestra na Ordem dos Advogados do Paraná (OAB-PR) na tarde desta segunda (18).
Já o próprio STF divulgou, no início da noite desta segunda um comunicado - sem citar Bolsonaro nominalmente - contra mentiras já desmentidas.
Não caia em fakenews! A urna eletrônica vive sendo testada e nunca teve fraude comprovada. Ela é segura e auditável! Confira o vídeo produzido pelo @TSEjusbr para combater os boatos que andam circulando por aí. Compartilhe a verdade! pic.twitter.com/TvZZGmvwFC
— STF (@STF_oficial) July 18, 2022
Até mesmo o presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), aliado do presidente, criticou as declarações. Pacheco tratou sobre os questionamentos sobre as urnas eletrônicas como "questões superadas”. “A segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral não podem mais ser colocadas em dúvida. Não há justa causa e razão para isso. Esses questionamentos são ruins para o Brasil sob todos os aspectos”, afirmou.
O líder nas pesquisas de intenção de voto para o pleito de outubro, Lula (PT) também se manifestou lamentando a atitude do atual mandatário
É uma pena que o Brasil não tenha um presidente que chame 50 embaixadores para falar sobre algo que interesse ao país. Emprego, desenvolvimento ou combate à fome, por exemplo. Ao invés disso, conta mentiras contra nossa democracia.
— Lula (@LulaOficial) July 18, 2022
Edição: Rodrigo Durão Coelho