A mineração é uma atividade de contrastes. Ao mesmo tempo em que gera lucros altos e arrecadação para os municípios, causa pobreza e impactos ambientais importantes.
Essas contradições da mineração são tema de um levantamento do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração, que no ano passado criou o ”Projeto De Olho na CFEM”, sigla que se refere à Compensação Financeira pela Exploração Mineral.
O projeto tem como objetivo estimular e ajudar a população de comunidades impactadas a compreender o que é a CFEM, onde esse recurso está no orçamento das prefeituras e de que maneira poderiam ser inseridos nas discussões de utilização dos recursos para garantia de direitos e redução da pobreza.
"O modelo mineral é concentrador de renda. Praticamente toda riqueza gerada a partir da extração de recursos minerais remunera os acionistas e pessoas fora do município e fora do país, ou seja, não remunera a economia local. Não cabe à CEFM corrigir esses problemas, mas o uso desse recurso poderia ajudar a mitigar esses problemas. Poderia estimular a economia local e contribuir para a redução da pobreza", avalia Larissa Alves, uma das pesquisadoras do projeto.
O projeto aponta que entre os três municípios que mais arrecadaram recursos da CEFM em 2021, o campeão é Parauapebas (PA), com mais de R$ 2,4 bilhões em recolhimento. Ao mesmo tempo, é a cidade com mais famílias em situação de extrema pobreza entre eles: 15.607.
Em Parauapebas, conhecido como o município mais minerado do país, a população conta com apenas 45,7% de esgotamento sanitário adequado e somente 27,3% dos moradores do município tem emprego formal.
Depois de Parauapebas estão os municípios Canãa dos Carajás, também no estado do Pará, em segundo lugar, com recolhimento de mais de R$ 1,8 bilhões, seguido por Conceição do Mato Dentro, em Minas Gerais, com mais de R$ 668 milhões.
Os pesquisadores avaliam que a disparidade entre a arrecadação e a quantidade de famílias em situação de extrema pobreza está relacionada, entre outros fatores, à falta de transparência no uso dos recursos e na falta de políticas públicas voltadas para benefícios destinados à população mais carente.
"O que mais tem chamado a nossa atenção durante todo o período de pesquisa é a falta de transparência na utilização da CEFM. Apesar de haver leis como a 13.540 de 2007, que define que as prefeituras devem tornar público como esse recurso vem sendo utilizado, isso não vem acontecendo", explica Larissa.
O projeto alerta ainda que se os recursos minerais são bens da União, a sua exploração e os seus lucros devem estar atrelados a benefícios para todo o país, em especial para as comunidades impactadas.
Para isso, os pesquisadores apostam em formação nas escolas, movimentos e organizações sociais, a fim de que a própria população possa se organizar coletivamente e exigir que estes recursos sejam usados na garantia de direitos.
"Depois desse mapeamento, creio que é possível direcionar esse recurso, por exemplo, para uma política que valorize a economia local, independente da mineração, que possa gerar renda para essas famílias. Mais investimentos em saúde, educação em determinadas localidades, entre outras ações que as comunidades, depois de consultadas, demandarem", diz a pesquisadora.
A iniciativa é desenvolvida em conjunto com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), o Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (PoEMAS) e em parceria com Justiça nos Trilhos e Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa).
Todo material produzido pelo grupo de pesquisadores do "Projeto De Olho na CEFM" pode ser acessado no site do Comitê em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, incluindo cinco cartilhas referentes aos municípios Parauapebas (PA), Marabá (PA), Canaã dos Carajás (PA), Alto Horizonte (GO) e Açailândia (MA).
Contraste
Em maio de 2022, a Prefeitura de Parauapebas virou manchete nacional por apoiar um dos maiores churrascos do mundo. O evento ofereceu vinte toneladas de carne em comemoração ao aniversário de 34 anos da cidade, organizado pelo Siproduz (Sindicato dos Produtores Rurais de Parauapebas).
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O evento chamou atenção pelo contraste entre os recursos gastos na festa, em especial por conta do alto preço das carnes nos frigoríficos de todo o país, e os níveis de insegurança alimentar e de extrema pobreza registrados no município.
A equipe do Brasil de Fato tentou contato com a Prefeitura de Parauapebas sobre a utilização dos recursos e denúncias de falta de transparência, mas não recebeu resposta até a conclusão desta matéria.
Edição: Thalita Pires