O ex-piloto de Fórmula 1 Nelson Piquet se tornou alvo de uma representação feita pela bancada do Psol na Câmara dos Deputados ao Ministério Público do Distrito Federal. Na peça jurídica, os parlamentares o acusam de prática do crime de racismo, após terem vindo à tona declarações em que o piloto britânico Lewis Hamilton era chamado de "neguinho" por Piquet.
Em entrevista concedida ao jornalista Ricardo Oliveira em novembro do ano passado, mas que viralizou nas redes sociais somente nesta semana, Nelson Piquet utilizou o termo racista diversas vezes ao se referir a Hamilton. Na sexta-feira (1º), um outro trecho da entrevista, este inédito, foi divulgado pelo portal Grande Prêmio apontando que o ex-piloto repetiu a expressão junto com uma fala homofóbica na mesma ocasião.
"O racismo estrutura as relações sociais no Brasil. Nesse sentido, tratar seres humanos negros de forma evidentemente pejorativa, como faz o senhor Nelson Piquet, não se coaduna com as práticas para efetivação do dispositivo da igualdade", afirmam os deputados do Psol, de acordo com informações da jornalista Mônica Bergamo.
No meio da semana, o ex-piloto emitiu um comunicado pedindo desculpas e alegando que a palavra seria usada de forma coloquial no português brasileiro, justificando que a expressão teria sido traduzida de forma incorreta. "O que eu disse foi mal pensado, e não defendo isso, mas vou esclarecer que o termo usado é aquele que tem sido amplamente e historicamente usado coloquialmente no português brasileiro como sinônimo de 'cara' ou 'pessoa' e foi nunca teve a intenção de ofender."
Durante a semana, a imprensa britânica divulgou que a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) teria banido o brasileiro do paddock de todas as etapas, embora não tenha havido um comunicado oficial a respeito. Já na quinta-feira (30), Piquet foi suspenso do Clube de Pilotos Britânicos, entidade que reúne nomes do automobilismo e do qual ele era membro honorário. Hamilton também integra o clube.
"Diante da política de zero tolerância a qualquer ato envolvendo ou sugerindo racismo, o quadro do Clube de Pilotos Britânicos concluiu que o uso de linguagem ofensiva racialmente pelo Sr. Piquet para descrever um colega membro do Clube (e sete vezes campeão) é inaceitável e totalmente inapropriado para um membro honorário do Clube, a despeito de sua consequente desculpa", afirmou a nota da entidade, que declarou ainda que deve encerrar formalmente a associação do brasileiro em uma reunião do conselho a ser realizada dentro de sete dias.
A luta de Hamilton contra o racismo
"Precisamos unir as pessoas, somos todos iguais. Continuo firme e focado no meu trabalho e realmente tentando promover a inclusão da diversidade em nossa organização. Realmente precisamos de todos", disse nesta sexta-feira Lewis Hamilton em entrevista concedida em Silverstone, onde será disputado neste final de semana o GP da Inglaterra de Fórmula 1. O ativismo do britânico em prol da igualdade, entretanto, não vem de agora.
Sua atuação se tornou mais notória em maio de 2020, após o assassinato de George Floyd, quando ele esteve presente em manifestação do movimento Black Lives Matter e passou a cobrar a Fórmula 1 por ações mais notórias contra o racismo. Foi um dos responsáveis pela sua equipe, a Mercedes, a trocar em um GP a cor prateada dos carros pela preta como forma de protesto.
Em setembro daquele ano, usou no pódio de sua 90ª vitória na modalidade, no GP da Toscana, uma camiseta com a frase "Prendam os policias que mataram Breonna Taylor". Breonna, mulher negra de 26 anos, era paramédica e foi assassinada em março daquele ano após a polícia invadir sua casa, na cidade de Louisville, estado do Kentucky.
A postura de Hamilton não só fez com que a maioria dos pilotos adotasse publicamente discursos antirracistas como também foi fundamental para que a organização também adotasse a iniciativa pró-diversidade We Race As One, novidades em uma categoria que costuma ser alheia a essa pauta.
O heptacampeão, em reação às ofensas de Piquet, cobrou mais ação da modalidade. Na quinta-feira, a parceria Ignite, que une Hamilton e a Mercedes, anunciou suas primeiras doações como parte de seu compromisso para aumentar a diversidade no esporte. Entre as iniciativas anunciadas, ambos comprometeram um aporte de US$ 6,2 milhões para o fundo. Hamilton também doou £ 20 milhões para seu projeto Mission44, voltado pra "apoiar, defender e capacitar jovens de grupos sub-representados no Reino Unido", com a finalidade de promover a diversidade.
Edição: Glauco Faria