As urgências que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU), alertou, no início de 2022, foram amplificadas pela guerra da Rússia contra a Ucrânia, que cruelmente se estende. O documento avisa que, somente acelerando os cortes nas emissões de gases de efeito estufa, será possível evitar piora nas já muito graves consequências para o clima no planeta.
O conflito evidenciou um mundo com interdependências de gás, fertilizantes, de produção agrícola, sem que haja um plano B em casos de interrupção de fornecimento.
Esse cenário está nos submetendo ao uso prolongado da energia do carvão, danosa ao meio ambiente, em nome da garantia de segurança energética. O planeta revira-se na busca de novos relacionamentos comerciais, que não tornem os países sujeitos a apenas um fornecedor. Vimos a alta dependência e o impasse, a partir da guerra, das importações pelo Brasil dos fertilizantes russos.
Enquanto segue insano, o conflito ceifa vidas no presente e atrasa iniciativas para salvar mais vidas em um futuro com menos emissão de gás-estufa. Apresenta-se como essencial que os governos se dediquem ao planejamento do futuro com mais opções para o suprimento de necessidades.
Em nossa cidade, Maricá, na região metropolitana do Rio de Janeiro, estamos empenhados nos exercícios de planejar e construir o futuro. Recebemos a maior fatia de receita de royalties do petróleo entre todas as prefeituras do país. Mas o petróleo um dia vai acabar, além de não pertencer à matriz energética limpa.
Após estudos e parcerias com universidades, decidimos usar o dinheiro de agora para sedimentar a Maricá do amanhã com iniciativas atuais e reais, voltadas à prática ESG (Environmental Social and Governance, sigla em inglês), que preza o ambiente, o social e a governança.
Criamos em 2018 um fundo soberano municipal, como uma poupança mensal com estimativa de alcançar R$ 2 bilhões em 2024; praticamos agricultura urbana em praça pública, plantando a segurança alimentar, com colheita gratuita pela população; iniciamos testes do piloto de ônibus híbrido, movido a eletricidade e hidrogênio ou a etanol, para renovação da frota municipal; aprovamos uma política de hidrogênio para estimular o uso da energia limpa e renovável e atrair a instalação de indústrias com incentivos fiscais.
Criamos ainda um regime diferenciado de tributação local para iniciativas de proteção ambiental, com moedas verdes (criptomoedas sustentáveis); exercitamos uma política de reflorestamento, com plantio e doação de mudas na cidade; e, antes disso tudo, em 2013, criamos a nossa moeda social local (Mumbuca) para transferir renda a quem mais precisa de forma permanente.
Alguns, desconfiados, dirão que a cidade só desenvolve tais ações porque tem o dinheiro dos royalties.
Pois antes de receber essa receita, Maricá começou com o S (social) do ESG, a partir da transferência de renda à população e, com governança, tratou de dar à cidade praiana e de belíssimo relevo montanhoso a experiência de respirar melhor com práticas sustentáveis. A grande questão para as gestões é que o difícil pode ser simples, nem sempre o que é difícil, é complicado ou até impossível. Precisa é querer fazer.
*Fabiano Horta é prefeito de Maricá, na região metropolitana do Rio de Janeiro.
**Este é um artigo de opinião. A visão das autoras não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Mariana Pitasse