Um ato reuniu servidores e indígenas em frente à sede da da Fundação Nacional do Índio (Funai), na região central de Brasília (DF), na manhã desta quinta-feira (23). A manifestação foi convocada em todas as unidades do órgão no país.
"Sempre denunciamos essa gestão. Nós, povos indígenas e servidores indigenistas, tememos pelas nossas vidas", disse Kamuu Dan, um dos líderes indígenas presentes.
Entidades da sociedade civil cobraram a saída do presidente do órgão, Marcelo Xavier, que, segundo a convocação do ato, "demonstra não possuir qualidade mínima para gerir a política indigenista". "A política da gestão de Bolsonaro e do Marcelo Xavier a frente da Funai é de morte. Eles não atuam para estes povos e sim para seus interesses próprios", discursou Eduardo Theodoro, da organização Jovens Pelo Clima.
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A mobilização, que culminou em uma paralisação da Funai, foi convocada depois dos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, na Amazônia. Os servidores têm como reivindicação a exoneração do presidente da Fundação. A decisão pelo ato e pela paralisação foi feita em Plenária Nacional Extraordinária na última sexta-feira (17), com a participação de 198 servidores.
Os trabalhadores da autarquia estão mobilizados desde o primeiro dia do desaparecimento de Bruno e Dom, fazendo vigílias diárias em frente à sede da Funai em Brasília.
"Lutamos para que as investigações cheguem até a ampla cadeia de crime organizado instalada no Vale do Javari", expõem os servidores. "E para que nunca mais tenhamos que passar por situação semelhante, o que requer a imediata proteção dos nossos colegas indigenistas, dos Povos Indígenas e de suas lideranças, organizações e territórios", diz um manifesto assinado por servidores.
O desaparecimento de Bruno e Dom em 5 de junho e a posterior confirmação de suas mortes "têm como pano de fundo o desmonte da Funai", segundo os servidores do órgão. Por isso, "precisamos dar um basta na atual gestão anti-índigena", ressaltam no documento, que foi assinado pela Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef/Fenasef), pela Associação Nacional dos Servidores da Funai (Ansef) e pela INA – Indigenistas Associados.
Xavier, "um interventor"
Delegado da Polícia Federal, Marcelo Augusto Xavier da Silva preside a Funai desde julho de 2019. Sua nomeação teve apoio da bancada ruralista, que assiste a promessa de campanha de Bolsonaro de não demarcar "nenhum centímetro" de terra indígena ser cumprida. Quatro dias depois do desaparecimento de Bruno e Dom, Xavier deu uma declaração pública com a informação falsa de que a dupla teria que ter pedido autorização à Funai para estar no local onde desapareceram.
A afirmação não se sustenta, pois eles estavam fora da Terra Indígena. Além disso, segundo comunicado da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Bruno havia recebido permissão para ingressar na área protegida, em documento assinado no mês anterior pela gestora da unidade descentralizada da Funai na região. "Ao invés de incentivar as buscas e manifestar preocupação com o desaparecimento, Xavier trabalhou para prejudicar a imagem desses profissionais, como se estivessem fazendo algo equivocado. É um ato indigno de uma autoridade pública", avalia Fernando Vianna, presidente da INA.
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Uma prática comum desses três anos de gestão de Xavier tem sido provocar a Polícia Federal para investigar opositores da agenda ruralista. Foi o caso de procedimentos contra Sonia Guajajara, coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib); Fabiano Contarato, senador (PT-ES); e Ciro Barbuda, procurador da própria Funai que havia feito um parecer jurídico favorável a tupinambás da Bahia. Todos os procedimentos foram arquivados.
Pouco depois de completar quatro meses à frente da Funai, Marcelo Xavier fez uma exoneração em massa e trocou 15 coordenações de áreas do órgão. Nessa mesma leva, Xavier destituiu Bruno Pereira do cargo de coordenador-geral de povos indígenas isolados.
Pouco antes disso, Pereira havia coordenado uma grande operação contra o garimpo ilegal na região do Vale do Javari, que resultou na queima de dezenas de balsas. "Já não há condição de aceitar esse corpo estranho na Funai. Ele é um interventor", define Vianna. "Ele tem que sair da Funai para que seja possível o órgão voltar a atuar na defesa, promoção e proteção dos direitos indígenas".
Edição: Nicolau Soares