“Que país é esse que nós estamos vivendo, excelências? Quantos mais Brunos e quantos mais Doms têm que morrer? É público e notório que a diretoria da Univaja toda está marcada com a mesma marca que Bruno e o Dom. Temos que andar com segurança, temos que andar com carro blindado. Isso não é vida, nós não estamos em um país em guerra.” O desabafo é do procurador jurídico da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), Eliesio Marubo, em depoimento na audiência pública conjunta das comissões de Direitos Humanos (CDH) e Temporária sobre a Criminalidade na Região Norte do Senado, nesta quarta-feira (22). O tema central da reunião – convocada por iniciativa do senador Humberto Costa (PT-PE), presidente do colegiado – foi a violência na Amazônia.
Marubo pediu à Polícia Federal que faça uma investigação mais ampla sobre os assassinatos do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Araújo. Ele afirmou que, além de a diretoria da Univaja estar “marcada” e ameaçada de morte, a tensão e a violência se intensificaram a partir de 2019. Não por acaso, foi o primeiro ano do atual governo de Jair Bolsonaro.
“O que o MP fez com as denúncias?”
Segundo Marubo, a atuação da Univaja é pautada pelo interesse das comunidades da região, já que o Estado vem atuando de forma omissa. “Gostaria muito de ouvir o que a Funai tem a dizer. O que o Ministério Público fez com tantas denúncias que temos feito?”, questionou.
O dirigente se mostrou pessimista. “Certamente teremos mais casos na região”, alertou. “Trouxemos nossas preocupações que não foram ouvidas e o resultado foi esse: essa catástrofe que nós tivemos no Javari e certamente teremos mais. Eu estou afirmando que nós teremos mais. É importante que essa Casa atue! É importante que o Parlamento acompanhe essa situação”, pediu.
É unânime a denúncia pelos representantes de entidades indigenistas de que os assassinatos de Bruno e Dom não foram fatos isolados, mas fazem parte de um cenário de criminalidade na região amazônica, em especial no Vale do Javari, que não para de crescer. Segundo o presidente do Indigenistas Associados (INA), Fernando Vianna, há um quadro de invasão de pessoas “que ingressam nas terras para atividades ilegais”.
“Junto com os crimes ambientais mais costumeiros, como pesca e caça ilícitas, há articulações com forças do crime muito mais complexas, com conexões com o narcotráfico internacional e o comércio de armas”, disse Vianna. Ele afirmou ainda que a atual diretoria da Funai não está comprometida com direitos indígenas, mas com grupos econômicos interessados na posse de terras e nos recursos naturais.
Premonição
Segundo o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), entre as denúncias feitas pela Univaja há um ofício de abril em que já há informações sobre pesca ilegal naquela região da Amazônia com a participação de um homem conhecido como Pelado, que foi agora apontado como um dos assassinos de Bruno e Dom.
“Esse ofício é quase uma premonição. Dá informações sobre quem faz a atividade ilegal, onde mora, como atua e que está armado. Não demorou 60 dias, mataram Bruno e Dom”, disse o senador. “Deixaram ocorrer esses homicídio, no mínimo, com a prevaricação criminosa do Estado brasileiro”, acrescentou.