Coluna

Soneto da despedida

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Para resolver o problema de popularidade de Bolsonaro, Paulo Guedes foi convocado na sua melhor versão de Mister M - Agência Brasil
O capitão não tem como ignorar a queda de popularidade trazida pela escalada da inflação

Olá, 

Sem pandemia, 

nem corrupção,

decorar este versinho

foi difícil pro capitão.

.Um capitão e dois soldados. Cada vez mais, o golpe é o plano A de Bolsonaro. Até porque a possibilidade de uma reeleição pelas regras do jogo é cada dia mais improvável. A economia brasileira não dá sinais de melhoras e as próprias intenções golpistas de Bolsonaro são um dos motivos para a estagnação econômica. O Auxílio Brasil nem mitigou a miséria, nem se converteu em votos, mesmo com versinhos infantis na TV. Mesmo privatizando a Eletrobrás, Bolsonaro tem implorado o socorro do (super) mercado para congelar os preços. Além da incompetência para colocar a máquina do Estado a seu serviço, Bolsonaro vê a pecha de vagabundo e preguiçoso colando na sua imagem. Sem nada de concreto e real para apresentar, já era evidente que a sua campanha apostaria em temas morais e no fantasma do comunismo. E, mesmo assim, cada vez mais limitado ao seu círculo mais próximo e fiel.  Mas só conversa fiada não tem sido suficiente para desviar a atenção da economia, nem para acalmar o “desespero” do capitão. Para quem tem dúvidas de que uma versão tupiniquim do Capitólio está em curso, basta notar que a molecagem de André Mendonça e Kassio Nunes no julgamento da cassação de mandato por fake news, mais do que uma infantil lealdade ao chefe, foi um ataque coordenado ao TSE, pavimentando o caminho para o chilique de Bolsonaro no dia seguinte, ao mesmo tempo em que o Ministério da Defesa prepara outro ataque às urnas eletrônicas e o pincher Kassio Nunes provoca outra vez a própria corte com mais uma anistia de um bolsonarista. E nem Biden escapou de ouvir a pregação de Jair contra as urnas. Tudo isso convergindo para a convocação de novas manifestações em 31 de julho e depois em 7 de setembro, às vésperas das eleições, ainda que movimentando, por enquanto, só o baixíssimo clero da política e o núcleo mais duro do bolsonarismo.

.Os ilusionistas do Planalto. Mesmo apostando nas pautas ideológicas e tentando jogar a crise econômica para baixo do tapete, as pesquisas mostram que o capitão não tem como ignorar a queda de popularidade trazida pela escalada da inflação. Até porque o risco é uma debandada do centrão e a perda de palanques estaduais. Para resolver o problema, Paulo Guedes foi convocado na sua melhor versão de Mister M. O truque consiste em propor um teto de 17% para o ICMS dos estados sobre o diesel e o gás de cozinha. Em contrapartida, o governo federal compensaria o valor e ainda zeraria os impostos federais PIS, Cofins e Cide que incidem sobre os combustíveis. Recebida pelos presidentes da Câmara e do Senado como proposta séria, a gambiarra não convenceu nem os amigos caminhoneiros, nem o mercado financeiro, que teme que futuramente a isenção não possa ser revertida conforme o prometido e acabe ameaçando seu sagrado teto de gastos. O problema é que, permanecendo a tendência de aumento no preço dos combustíveis, os quase R$ 50 bilhões previstos pelo governo para bancar as isenções seriam uma gota d’água no deserto e em pelo menos 11 estados não haveria mudança no valor cobrado na bomba. Ou seja, a safadeza de Bolsonaro resume-se a tentar reverter sua impopularidade passando a batata quente para a mão dos governadores, como fez outras vezes. Mas além do risco de não dar nenhum resultado, a medida vai tirar recursos de outras áreas, inviabilizando por exemplo o prometido reajuste aos servidores públicos federais. Tudo isso para evitar a questão central, que é a precificação internacional imposta pela Petrobras à população brasileira. E se já não fosse o bastante, o governo não tem qualquer plano para evitar o possível desabastecimento de diesel no segundo semestre, além da ideia genial de fazer escambo de comida por óleo no mercado internacional, agravando ainda mais a insegurança alimentar num país que já contabiliza 33 milhões de famintos.

.O choro é livre. Quanto mais Lula cresce nas pesquisas, maior é a expectativa do PT de solucionar o embate no primeiro turno. Isto teria duas vantagens. A primeira é convocar desde já o voto útil, fazendo da eleição um plebiscito sobre o governo e capturando especialmente os eleitores de Ciro Gomes. A segunda é enfraquecer o discurso de fraude eleitoral, garantindo uma vitória avassaladora e incontestável. O que não é menos importante, quando cerca de 10% da população apoiam explicitamente um golpe liderado por Bolsonaro. Mas ao que parece, o empresariado não quer entregar o jogo tão rápido assim para Lula. Sinal disso é que as 90 diretrizes do plano em elaboração enviado para discussão dos partidos aliados já foram suficientes para deixar os porta-vozes da Faria Lima aos prantos. O esboço programático defende a revogação do teto de gastos e da reforma trabalhista, reforma tributária, ampliação das cotas, renovação do Bolsa Família e fim das privatizações. Nada de novo do que Lula já vinha falando, como a reversão da privatização da Eletrobras, mas suficiente para o choro correr solto. No UOL , do Grupo Folha, a plataforma petista foi definida como “esquerdismo enrustido”, cheirando  naftalina e “não programa”. “Amontoado de equívocos”, esperneia O Globo. No Estadão, a pergunta era onde estava o dedo de Alckmin no programa? A reação encabeçada pela mídia parece confirmar a percepção petista sobre o empresariado: são majoritariamente bolsonaristas, mas uma parte teria perdido o entusiasmo diante da instabilidade política e dos ataques golpistas. A partir de agora, a agenda de Lula deve incluir contatos diretos com o topo do PIB, sem intermediários mas, tornando público agora estes eixos do seu programa, a margem para o mercado exigir um recuo é menor. Até lá, alguns expoentes da Faria Lima como a XP adotaram uma medida bastante adulta para negar o crescimento de Lula nas pesquisas: fecham os olhos e tapam os ouvidos para fingir que não é real.

 

.Ponto Final: nossas recomendações.

.Top Gun: Maverick é outro vídeo de recrutamento militar disfarçado de filme. Tom Cruise quer repetir a ajuda que deu para a marinha americana na era Reagan. Na Jacobin.

Ponto é editado por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.

Edição: Glauco Faria