Decisões do Judiciário na terça (7) foram emblemáticas na defesa das liberdades sem falsas retóricas
As ameaças de morte aos jornalistas do portal de notícias Congresso em Foco, com vazamento de seus dados pessoais, após a publicação de uma reportagem sobre as táticas de um fórum anônimo para produzir Fake News a favor do presidente Jair Bolsonaro, assim como o desaparecimento do jornalista britânico Dom Phillips, correspondente do jornal The Guardian, no Vale do Javari, na Amazônia, com o indigenista Bruno Pereira, marcaram a semana em que paradoxalmente se comemora o Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, ocorrido nesta terça-feira (07).
Em tempos em que a liberdade de expressão é usada como argumento para propagação de discurso contrário à democracia, evidencia-se a necessidade de maior proteção à operacionalização da comunicação por seus profissionais, inclusive com garantia da integridade física, tutela que decorre da obrigação de resguardar a ordem jurídica e o regime político.
Em contrapartida, decisões do Poder Judiciário da mesma terça-feira foram emblemáticas no sentido da defesa das liberdades sem falsas retóricas e intolerância com práticas que atentam contra a própria Constituição.
Condenando, pela primeira vez na História do país, um presidente da República em exercício por dano moral coletivo, a decisão da juíza Tamara Hochgreb Matos, da 24ª Vara Cível de São Paulo, que impôs a Jair Bolsonaro pagar R$ 100 mil de indenização à categoria dos jornalistas, responde aos inúmeros abusos cometidos pelo mandatário em quase quatro anos no exercício do cargo. O presidente, cotidianamente, realiza agressões verbais, constrangimentos e difamações que inviabilizam a segurança no exercício da atividade jornalística e incentivam comportamentos violentos contra os profissionais da imprensa por seus apoiadores, conduta totalmente incompatível com o exercício do cargo de chefe de Estado e chefe de Governo.
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O discurso antidemocrático também foi condenado na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) ao manter, por maioria, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que cassou o mandato do deputado estadual Fernando Francischini, do Paraná. O parlamentar divulgou Fake News contra o sistema eleitoral em 2018, quando afirmou fraude nas urnas eletrônicas usando um vídeo falso em que um eleitor, supostamente, não conseguia votar.
Elementos de um mesmo núcleo, ambas as decisões importam para que a sociedade perceba que a obrigatoriedade de obediência ao regime democrático é de todos e, em especial, dos agentes políticos, que não existe direito fundamental em atacar a democracia a pretexto de se exercer qualquer liberdade.
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Por derradeiro e não menos relevante, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) negou ao ex-juiz e ex-ministro de Bolsonaro, Sérgio Moro, o domicílio eleitoral. O pretenso candidato nas próximas eleições havia oferecido o endereço de um hotel como residência e tentou burlar o sistema de justiça sem comprovar qualquer vínculo com a cidade, residindo no Paraná.
Em um país cada vez mais solapado por um populismo de extrema-direita, ameaças golpistas e total desrespeito às instituições, é necessário que decisões emanadas do Poder Judiciário possuam o firme comprometimento com a ordem legal. Sobretudo por ter sido esse mesmo Poder corresponsável pelo atual estado de coisas desordenadas, por ações e omissões, conivência e conveniências, com ênfase na ruptura constitucional de 2016 e na sustentação da operação Lava Jato.
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A postura de larga parte da imprensa tradicional pode ser igualmente enquadrada nessa culpabilidade. Por interesses financeiros ou comerciais, veículos jornalísticos venderam espetáculo e condenaram investigados na via pública, contrariando o princípio da presunção de inocência.
Urge, portanto, que a mudança de postura nas linhas editoriais verificadas nos últimos tempos, assim como de juízes em todas as instâncias, seja de fato uma porta de transformação trilhada pela percepção de que os desvios éticos e normativos nos conduziram até aqui, alçaram um juiz parcial e ativista político à condição de herói e possibilitaram a eleição de um amante da ditadura.
*Tânia Maria Saraiva de Oliveira é advogada, historiadora e pesquisadora. É integrante do Grupo Candango de Criminologia da UNB (GCcrim/UNB) e integrante da Coordenação Executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD). Confira outros artigos aqui.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Glauco Faria