Recebeu propostas

Em encontro com movimentos, Lula diz querer ser cobrado constantemente em futuro governo

Sonia Guajajara: "Geraldo Alckmin, nós queremos confiar em você"

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Lula se encontrou com movimentos populares nesta sexta, em São Paulo - Elineudo Meira / @fotografia.75

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se encontrou com representantes de movimentos populares, nesta sexta-feira (27), em São Paulo. Em clima de unidade em torno da chapa de Lula e do ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), as lideranças cobraram que as propostas entregues a Lula neste dia sejam incorporadas ao programa de governo.

No total, são dez proposições formuladas por cerca de 80 entidades para a superação da crise e reconstrução do Brasil, caso Lula saia vitorioso das eleições deste ano. Os organizadores calculam que estiveram presentes cerca de mil lideranças de movimentos da cidade, do campo, sem-terra, mulheres, movimento negro, juventude, ambientalistas e LGBTQIA+.

Lula disse que é preciso substituir a "responsabilidade fiscal" pela "responsabilidade social" para "em vez de pagar banqueiro, pagar a dívida que existe do Estado com o povo". O ex-presidente pediu ajuda dos movimentos para "fazer o que precisa ser feito". "Se a gente voltar a governar esse país, eu vou precisar do apoio de vocês para o que precisa ser feito. Sem vocês cobrarem, a gente não faz o que precisa ser feito. Então não se incomodem de cobrar", disse o petista.

"Vocês são as pessoas que quando a gente governa continuam com a mesma honestidade com os movimentos populares. Eu sei que vocês já fizeram manifestação contra Alckmin, contra mim e eu nunca pedi pra vocês não fazerem. Se não fosse vocês, a gente não fazia tudo o que a gente faz." 

"Eu estava ouvindo o discurso de vocês e estava imaginando o que estava esperando quando a gente voltar a governar. Esse povo está desde 2016 querendo beber um pouco de democracia, participação, respeito, dignidade e não deram. É como se a gente estivesse no deserto e de repente aparecesse um oásis, mas a gente não sabe se tem água para todo mundo." 

"Quando a gente ganhar, essa quantidade de gente correndo com a sede que está para pedir direitos que o estado tem negado, imagina a dificuldade que a gente vai ter. A cobrança é verdadeira e histórica. A única razão pela qual temos interesse em disputar a eleição é dizer que o estado pode tratar vocês com a dignidade que o povo precisa. É preciso parar de dizer não ao povo trabalhador, aos que querem casa e educação."

"Ao invés de discutir responsabilidade fiscal para pagar banqueiro, a gente precisa discutir responsabilidade social para pagar a dívida que a gente tem com o povo."

Outras falas

O documento entregue para Lula foi elaborado pelas entidades ao longo dos últimos dois anos e foi feito a partir de “um diagnóstico da situação política, econômica e social do país, do governo Bolsonaro e apresenta dez propostas para superar a crise e reconstruir o Brasil”, afirma Raimundo Bonfim, coordenador nacional da Central de Movimentos Populares (CMP). 

As propostas abordam a redução das desigualdades sociais; trabalho, emprego e renda; Estado e serviços sociais; reforma urbana com cidades inclusiva; segurança pública cidadã; questões democráticas, como controle social por plebiscitos e referendo; meio ambiente; reforma na agricultura familiar, soberania alimentar; igualdade e diversidades; políticas públicas para mulheres e juventude; além de questões de soberania internacional. 


O candidato a vice, Geraldo Alckmin (PSB) estava ao lado de Lula / Guilherme Frodu

No encontro desta sexta, ocorrido na Casa de Portugal, discursaram representantes de diversos movimentos populares. Sonia Guajajara (PSOL), coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), destacou a violência contra grupos minoritários e, se dirigindo a Alckmin, disse querer “confiar em você”.  

“Nós lutamos todos os dias contra o garimpo ilegal que segue matando e estuprando nossas meninas, que acontece nos quilombos, nas periferias de São Paulo. Por isso eu estou aqui agora. Em 2022 nós vamos aldear a política.”

“Geraldo Alckmin, nós queremos confiar em você. Não vamos mais admitir um novo golpe neste país. Estamos vivendo até agora as consequências do golpe de 2016, com tantos ataques, com o genocídio preto. Não podemos permitir um Brasil nesse caminho, estamos aqui com todos os movimentos que vão derrotar o Bolsonaro com um novo pacto pelo Brasil”, disse ela, que deve concorrer a uma vaga na Câmara dos Deputados. 

A secretária de articulação política da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTT), Bruna Benevides, questionou: “o que nós podemos firmar de pacto para proteger essas parlamentares [mulheres]? As parlamentares do PT precisam de apoio. Hoje nós aprendemos que estamos também dando o tom da política que diz que vai nos representar. Eu preciso de representação, compromisso e a possibilidade de não sermos mais assassinadas.”

A violência  - de Estado ou não - que afeta mais o povo preto, foi tema da fala de Simone Nascimento, do Movimento Negro Unificado (MNU). “Não é por acaso que a mesma bala que atravessou Marielle foi encontrada nos lotes da chacina de Barueri. É preciso reaver a política de drogas, o encarceramento em massa."

“É por isso que nós queremos aproveitar hoje para fazer um chamado: nós precisamos reagir à violência racial ou seremos mortos e mortas. Na próxima quarta-feira, sete dias da morte do Genivaldo, nós convocamos todos para estarem às 18h no Masp no ato contra a violência policial e racista”, disse, referindo-se ao assassinato de Genivaldo de Jesus Santos, em Sergipe, morto por políciais em uma câmara de gás improvisada em uma viatura nesta semana.

Simone Nascimento disse ainda que um dos objetivos para o pleito de outubro é “eleger uma bancada de negros e negras que estarão com você [Lula]”.

Propostas

Raimundo Bonfim, da CMP, havia dito ao Brasil de Fato que a expectativa é que grande parte das dez propostas estejam contidas no programa de governo Lula. “Sabemos que tem muitas coisas que não dependem de uma caneta, de uma decisão só do presidente, mas nós vamos continuar a luta após o período eleitoral para que os dez pontos sejam implementados. É uma espécie de um contrato dos movimentos populares com o presidente Lula”, afirma. 

O documento não foi elaborado apenas para ser entregue ao ex-presidente Lula, mas se trata de “um instrumento de luta e diálogo com as próprias bases dos movimentos populares”. “Não é um programa de governo ou de emergência. É um instrumento que vai além do processo eleitoral, ainda que essas entidades já tenham decidido pelo apoio à pré-candidatura do ex-presidente Lula”, afirma Bonfim. 

Ele ainda enfatiza que os movimentos presentes, e que elaboraram o documento, têm estreita relação com “o povo, o território, as lutas, seja no campo ou na cidade. Esse é um ponto que eu destacaria como sendo importante. É quem está muito próximo do povo vivendo as suas angústias, suas dificuldades de emprego, falta de renda, falta de políticas públicas e o impacto que tem o processo de privatização dos instrumentos de construção de política de desenvolvimento econômico social”.

Assista abaixo a íntegra do encontro:

 

 

Edição: Rodrigo Durão Coelho