Uma massa polar chegou ao Sul, Centro e Sudeste do Brasil e fez com que a sensação térmica na capital paulista entre terça (17) e quarta-feira (18) chegasse a -4°C. A temperatura mínima de 6°C a partir desta quarta (18) se combina, ainda, com rajadas de vento que podem chegar a 60km por hora.
A frente fria antecipada vem em um momento em que, com a inflação nas alturas e o aumento da pobreza, doações ficaram literalmente mais ralas, enquanto a população vivendo nas calçadas de São Paulo cresceu ao menos 31% em dois anos.
Segundo levantamento feito pela Prefeitura de São Paulo e divulgado no início do ano, a situação de rua é a realidade de 31.884 pessoas. A pesquisa registrou ainda que, de 2019 para cá, o número de barracas na cidade aumentou 330%.
Grupos que atuam nesse tema há décadas, como a Pastoral do Povo de Rua e o Movimento Nacional da População em Situação de Rua, contestam a metodologia do censo da prefeitura e afirmam que o resultado está subnotificado. Para Alderon Costa, da Associação Rede Rua, há ao menos 40 mil pessoas nessas condições na capital paulista.
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Somada ao grande número de famílias inteiras que, durante a pandemia, passaram a viver nas ruas, a inflação em abril chegou ao seu maior patamar desde 2003. Medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ela atingiu 12,13% em 12 meses e teve especial impacto nos alimentos.
Itens típicos de cesta básica, marmita e sopão, tais como batata, tomate, óleo de soja e leite longa vida tiveram uma alta de preço de até 18,28%. Quanto mais difícil de conseguir, mais gente precisa e assim, cria-se um ciclo.
“A alimentação está muito cara e as doações também diminuíram. Hoje mesmo recebemos algumas cestas básicas. O óleo que vinha um litro, hoje veio meio litro. Nunca vi isso. Estamos realmente numa crise única, que a há muito tempo a gente não passava”, constata Alderon. A sua é uma das organizações que, ao longo da onda de frio, vai fazer ações de distribuição de comida, agasalhos e cobertores em São Paulo durante as madrugadas.
Iniciativas da Prefeitura e números que não fecham
Questionada pelo Brasil de Fato sobre as medidas que estão sendo tomadas, a Prefeitura de São Paulo, sob gestão de Ricardo Nunes (MDB), informou que deve contratar mais 56 orientadores socioeducativos e adquirir 13 novas viaturas para a “realização de abordagem social”. Além disso, anunciou ter criado duas mil novas vagas em sua rede de acolhimento.
Somadas às já existentes, as vagas em hotéis e Centros de Acolhida oferecidas pela gestão municipal somam 19.254. A conta não fecha nem se o número levado em conta for o do censo da Prefeitura, acusado pelos movimentos de estar subnotificado.
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A Prefeitura anunciou, ainda, que sempre que a temperatura ficar abaixo dos 10ºC, serão instaladas 10 tendas pela cidade, onde serão ofertados cobertores, sopas, vacinas e encaminhamentos aos Centros de Acolhida.
Em declarações à imprensa, o secretário municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, Caros Bezerra Júnior, afirmou que os esforços se ampliaram já que no ano passado os novos leitos ofertados foram 1,2 mil e, agora, são dois mil.
Movimentos sociais preocupados e mobilizados
Em junho e julho de 2021, de acordo com o Movimento Estadual da População em Situação de Rua de São Paulo, 16 pessoas morreram de frio na capital paulista.
“No último ano foi necessário que as várias denominações das igrejas abrissem os templos nos dias frios para acolher. E o metrô também. Para minimizar um pouco a questão do frio a prefeitura precisaria ousar mais. E a sociedade como um todo, todas as organizações, serem solidárias nesse momento”, atesta Alderon.
“As estruturas dos Centros de Acolhida não são suficientes. Fizeram um aditamento para aumentar as vagas, mas a situação dos abrigos já é crítica em tempos normais”, critica.
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Darcy Costa, do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (MNPR), salienta que “a pretensão é que dessa vez não ocorra nenhuma morte. Temos dialogado com a gestão a respeito disso”.
O coordenador da Rede Rua salienta que apenas com a solidariedade das pessoas vai ser possível evitar mortes e sofrimento, nesse momento em que São Paulo vive os dias mais frios do mês de maio dos últimos 15 anos. “A dor do frio é terrível. É uma tortura quase. Então o que a sociedade puder ajudar nesse momento, vai ser importante”, destaca.
Veja como contribuir
Pontos de doação e vaquinha em SP:
São Miguel Arcanjo – rua Taquari, 1100 (Belenzinho)
Casa de Oração do Povo da Rua – rua Djalma Dutra, 3 (Luz)
Associação Rede Rua - rua Campo Sales, 88 (Brás) / rua Sampaio Moreira 110, casa 9 (Brás) / rua Tabatinguera, 192 (Centro) / PIX: 03.221.537/0001-70
Espaço Sociocultural Cisarte – viaduto Pedroso, 111 (Bela Vista)
Armazém do Campo SP – alameda Eduardo Prado, 499
Cruz Vermelha – av. Moreira Guimarães, 699 (Indianópolis)
Fatiado Discos – av. Prof. Alfonso Bovero, 382 (Sumaré)
Entrega por SP – rua Harmonia, 1275 (Vila Madalena) / rua João Moura, 613 (Pinheiros) / av. Paulista, 2537, 9º andar (Bela Cintra) / rua Clodomiro Amazonas, 889 (Vila Nova Conceição)
Vaquinha do Instituto Conhecimento Liberta em parceria com padre Júlio Lancellotti e João Gordo: PIX [email protected]
#Vidas Na Cracolândia Importam - Teatro de Contêiner: rua dos Gusmões, 43 / doação de meias e cobertores pela internet
Casa Neon Cunha - rua Luiz Ferreira da Silva, 183 (Anchieta, São Bernardo do Campo): doações para a população LGBTQIA+ / PIX 37.211.131/0001-28
Edição: Rebeca Cavalcante