Bolsolão do MEC

Ministro da Educação, Milton Ribeiro, entra na mira do TCU e da PGR; Bolsonaro é poupado

Órgãos vão apurar suposta corrupção na distribuição de verbas para prefeituras intermediada por pastores

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

Ouça o áudio:

"Ações não republicanas": Ribeiro disse que solicitou investigação dos pastores em agosto de 2021 - Clauber Cleber Caetano/PR

O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu, nesta quarta-feira (23), abrir uma fiscalização extraordinária na estrutura de transferência de recursos do Ministério da Educação para estados e prefeituras. A decisão vem após a repercussão do áudio vazado do ministro Milton Ribeiro, no qual afirma que prioriza destinar recursos para as prefeituras cujas solicitações foram negociadas pelos pastores Arilton Moura e Gilmar dos Santos a pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL). 

"Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar. (...) Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar", diz o ministro em áudio. 

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Nas palavras do ministro do TCU, Vital do Rêgo, “nesse contexto de indícios de irregularidades, considero indispensável que o TCU prontamente exerça seu papel constitucional para fiscalizar a estrutura de governança do MEC responsável pelas transferências de recursos financeiros aos entes subnacionais, em especial aquelas voluntárias e de assistência técnica e financeira”. 

Em outra frente, o procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) autorização para abrir um inquérito contra Ribeiro. O PGR, no entanto, não incluiu o presidente Bolsonaro em seu pedido.  

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Ministro de Educação de Bolsonaro, Milton Ribeiro, vem sendo criticado por falas capacitistas e transfóbicas / Marcello Casal Jr / Agência Brasil

Segundo Aras, deve se apurar se houve “cometimento dos delitos de corrupção passiva privilegiada (art. 317, § 2- do Código Penal), prevaricação (art. 319 do Código Penal), advocacia administrativa (art. 321 do Código Penal) e tráfico de influência (art. 332 do Código Penal)”, escreveu o procurador-geral. “Em face do exposto, o procurador-geral da República requer a instauração de inquérito em desfavor de Milton Ribeiro.” 

A análise do pedido será de responsabilidade da ministra Cármen Lúcia, que foi escolhida como relatora do caso na Corte, depois que o STF recebeu, nesta terça-feira (22), da liderança da minoria na Câmara dos Deputados, Alencar Santana Braga (PT-SP), e do senador Fabiano Contarato (PT-ES) pedidos de investigação contra Bolsonaro e o ministro. 

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Ribeiro, que evitou se pronunciar sobre o caso publicamente até então, disse nesta quarta-feira (23) que solicitou uma investigação dos pastores Gilmar dos Santos e Arilton Moura, citados no esquema, à Controladoria-Geral da União (CGU) por “ações não republicanas”, em agosto de 2021.  

“Quando em agosto eu recebi uma denúncia anônima a respeito da possibilidade de que eles [os pastores Gilmar e Arilton] estariam praticando algum tipo de ação não republicana, imediatamente eu procurei a CGU e fiz redigir um ofício em que eu noticio o ministro da CGU que houve esse tipo de indicação”, disse o ministro em entrevista à Jovem Pan. 

Em nota encaminhada à imprensa, a CGU confirmou o recebimento do pedido de investigação. Também disse ter constatado “possíveis irregularidades cometidas por terceiros” e encaminhado o caso à Polícia Federal (PF). 


Ministro é o terceiro a chefiar a Educação no governo Bolsonaro; antes de Milton Ribeiro, vieram Ricardo Vélez e Abraham Weintraub / Reprodução/Twitter

Esquema na Educação envolvia compra de bíblia, dinheiro para igrejas e propina em ouro 

De acordo com entrevistas de prefeitos, o esquema de negociação de recursos no Ministério da Educação esbarrava em compra de bíblias, pedidos de propina em ouro e fila de pastores para participar das negociações. 

Ao O Globo, os prefeitos de Bonfinópolis (GO), Professor Kelton, e de Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza, afirmaram que o esquema envolvia a compra de bíblias para serem distribuídas nos municípios visitados pelo ministro Milton Ribeiro e dinheiro da igreja evangélica. Um dos pastores supostamente envolvidos no conluio, Gilmar Santos, é dono da editora Cristo para Todos, que fabrica versões da bíblia. 

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O prefeito Professor Kelton também disse ao O Estado de S. Paulo que durante uma reunião do Ministério, em 2021, o pastor Arilton Moura pediu R$ 15 mil para custeio de despesas em Brasília e a compra de bíblias, no valor de R$ 50 cada, para distribuir no município de Bonfinópolis.  

José Manoel de Souza também recebeu proposta parecida para conseguir acessar recursos do Ministério da Educação. “Ele [o pastor Arilton Moura] disse: Eu falo lá, já faz um ofício, mas você tem que fazer um depósito de R$ 40 mil para ajudar a igreja”, afirmou Souza, cuja declaração dá conta de que o município de Boa Esperança não recebeu qualquer ajuda do Ministério em projetos. 

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Em outra ocasião, o pastor Arilton Moura teria pedido um quilo de ouro para o prefeito do município de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB) em troca da liberação de recursos para a construção de escolas e creches. “Ele [Arilton] disse: ‘Traz um quilo de ouro para mim’. Eu fiquei calado. Não disse nem que sim nem que não”, afirmou Braga sobre uma conversa que teria ocorrido em abril de 2021, durante um almoço no restaurante Tia Zélia, em Brasília, depois de uma reunião com Milton Ribeiro, ministro da Educação. O quilo do ouro valia, de acordo com a cotação desta terça-feira (22), R$ 304 mil. 

Mesmo após levar o caso à CGU, em agosto de 2021, o ministro Milton Ribeiro se encontrou pelo menos cinco vezes com o pastor Arilton Moura no Ministério da Educação e outras duas fora da pasta, sendo uma delas em Camboriú (SC), segundo um levantamento do O Estado de S. Paulo. Na ocasião Ribeiro destacou a amizade “ao pastor Gilmar e Arilton, que estão lá em Brasília mais perto”. No total, o ministro recebeu ao menos 44 prefeitos ao lado dos pastores Moura e Santos, entre visitas tidas como “cortesia” e “alinhamento político”. 

Edição: Vivian Virissimo