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Quando não há desenvolvimento o coronelismo prevalece

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"Segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), compilados ainda em 2019 pelo portal De Olho nos Ruralistas, 50 empresas ligadas ao agronegócio acumulam R$ 205 bilhões em dívidas com a União" - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A continuidade do latifúndio não permitiu a evolução sociocultural do país, nem a evolução econômica

O livro escrito por Victor Nunes Leal “Coronelismo, enxada e voto” marcou época e tornou-se obra imprescindível para entender a formação política e cultural do Brasil. Embora escrita para explicar como se estruturava a rede de interação do cabresto dos trabalhadores rurais para as eleições, feitas pelos coronéis durante a República Velha, período em que vigorava a desorganização e/ou a organização segmentada e direcionada dos serviços públicos para beneficiar extratos específicos da sociedade eram norma, a obra readquire nesse momento extrema atualidade.

Hoje, faz 74 anos do lançamento da obra, que nasceu explicando o medo dos coronéis ante a perda de influência do poder privado e a ascensão do poder público. A essência do compromisso coronelista, isto é, do acordo firmado entre poder privado decadente e poder público em ascensão era estabelecido de forma que o governo municipal, estadual, apoiado pelo coronel, garantia os seus interesses em face de seus rivais, já o coronel hipotecava o apoio ao governo na forma de votos. O bolsonarismo em uma aliança com o setor do agronegócio, especialmente, reestabeleceu o coronelismo violento, com voto a cabresto, tal e qual o coronelismo de outrora, todavia, hidratado pelas novas tecnologias e pelo coronelismo neopentecostal.

O coronel da obra de Victor Nunes Leal não difere muito do fazendeiro do agronegócio de agora, tampouco dos seus interesses, o coronel tinha terras, mas a fazenda estava hipotecada e ele procurava negociar com as autoridades públicas para pagar menos impostos, renegociar dívidas, sonegar sem ser incomodado, alguns privilégios negociados que lhe permitissem sobrevida e enfrentar suas dificuldades financeiras. Segundo dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), compilados ainda em 2019 pelo portal De Olho nos Ruralistas, 50 empresas ligadas ao agronegócio acumulam R$ 205 bilhões em dívidas com a União, apenas para exemplificar.

A continuidade do latifúndio não permitiu a evolução sociocultural do país, tampouco a evolução econômica e ambiental, pelo contrário, fez com que se preservem os sentimentos mais arcaicos e retrógrados que o escravismo cunhou, racismo e exclusão. Transformando o país num eterno exportador de produtos primários, a fazenda modernizou-se “está ao alcance do smartphone”, o modelo de desenvolvimento que inclui distribuição de renda, industrialização, educação e diversidade produtiva, todavia, continua distante dos planos da elite brasileira. A pobreza, característica da República Velha, continua um projeto, necessário para manutenção do cabresto econômico e religioso.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko