Carlos Alberto Litti Dahmer, o Litti, é caminhoneiro autônomo e diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL). Ele não sabe se conseguirá seguir trabalhando na boleia de seu caminhão após a Petrobras anunciar um reajuste de 24,9% no preço do diesel nesta quinta-feira (10).
“Não há mais condição de trabalhar”, pontuou. “Não tem como acomodar um aumento desse no combustível no preço de um frete”, argumentou.
Segundo Litti, ainda antes do reajuste, o custo do diesel já comprometia cerca de 60% do ganho com um frete realizado por um caminhoneiro no país. O percentual é alto justamente porque, desde janeiro de 2021, o combustível foi reajustado pela Petrobras 11 vezes.
Leia também: Para conter preço dos combustíveis, Senado aprova PL que cria auxílio e fundo de estabilização
O reajuste mais recente foi o maior. Segundo estimativas do Observatório Social da Petrobras (OSP), ele fará com que o preço médio do litro do diesel em postos do país encoste na marca dos R$ 6,50.
Litti disse que caminhoneiros, assim como empresas de transporte em geral, não podem arcar com o reajuste.
“Não há mágica. Quem consegue, de um dia para outro, se adaptar a um aumento de 25% no seu custo?”, questionou, em tom de revolta.
:: Maior reajuste em um ano deve elevar gasolina a R$ 7 em todo o país, aponta observatório ::
Base de apoio de Bolsonaro
Revolta, aliás, é o que o anúncio do reajuste da Petrobras causou em caminhoneiros com quem Litti disse ter feito contato nesta quinta-feira.
Segundo Litti, a categoria ainda não tem movimentos organizados para reclamar do aumento. Ele, porém, disse que a insatisfação vem crescendo. E isso deve ser manifestado brevemente.
Em 2015, caminhoneiros realizaram uma greve nacional que acabou desgastando politicamente a então presidenta Dilma Rousseff (PT). Nas eleições de 2018, a categoria compôs, em sua maioria, a base de apoio a Jair Bolsonaro (PL), que acabou eleito. Hoje, entretanto, estão majoritariamente descontentes com o governo.
“Eu diria que 70% da categoria votaram em Bolsonaro”, lembrou Litti. “Hoje, 70% não votariam nele”, estimou.
:: Alta dos combustíveis levou 15% dos motoristas de aplicativo a abandonar a profissão ::
Lucro insustentável
Para Litti, Bolsonaro precisa dar um ponto final na política de preços da Petrobras baseada no custo do petróleo no mercado internacional. Essa política foi adotada após o impeachment de Dilma, em 2016, e perdura.
Com ela em vigor, quanto mais o petróleo sobe, mais sobem a gasolina e o diesel no Brasil. Só durante 2021, o preço do petróleo subiu 38% – de 44,23 dólares para 60,90 dólares. No período, o preço médio da gasolina subiu 46% nos postos, segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP).
Leia mais: Petrobras anuncia aumento de 19% na gasolina e 25% no diesel após disparada do petróleo
Dolarização dos combustíveis
Já em 2022, o petróleo subiu ainda mais, principalmente por conta da guerra entre Rússia e Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro. Naquele dia, o barril de petróleo custava cerca de 90 dólares. Desde então, ele chegou a subir a 130 dólares. Agora, está na casa dos 116 dólares.
Foi esse aumento que, segundo a Petrobras, motivou o reajuste do diesel e da gasolina. Litti, entretanto, disse que essa lógica precisa mudar.
“Não dá para pagarmos diesel baseado no dólar quando exploramos petróleo no Brasil e temos refinarias para produzir o nosso combustível aqui mesmo”, afirmou o sindicalista.
Litti disse que a dolarização dos combustíveis só beneficia acionistas da Petrobras, que teve lucro recorde de R$ 106 bilhões em 2021.
“Chegou a hora de a dúzia de acionistas perder um pouco”, afirmou. “Isso está insustentável, o povo brasileiro não aguenta mais!”, bradou.
:: O contraste entre preço do combustível e lucro da Petrobras ::
Reações em Brasília
O presidente Bolsonaro disse, nesta quinta-feira (10) , ainda antes do anúncio do reajuste da Petrobras, que não define preço de combustível na estatal. "Eu não defino preço na Petrobras. Eu não decido nada, não", disse ele a apoiadores.
O Senado, por sua vez, aprovou um projeto de lei que muda o cálculo de impostos sobre combustíveis e cria um fundo de estabilização de preços. A proposta segue para a Câmara.
:: PT rejeita PEC dos Combustíveis e propõe fundo como alternativa ::
Litti disse que as ideias em debate no Congresso são boas, mas insuficientes. Ele clama por mudanças na Petrobras, estatal que, para ele, deveria atender o povo.
“Para que a Petrobras foi criada? Não era na época do ‘petróleo é nosso’? Então, está na hora de a empresa entender que sua função não é satisfazer a ganância de investidor."
Edição: Rodrigo Durão Coelho