O presidente Jair Bolsonaro (PL) iniciou o último ano de seu mandato sancionando um orçamento para universidade federais 12% menor do que aquele reservado às instituições no primeiro ano do seu governo.
Em 2022, as universidades federais terão R$ 5,33 bilhões disponíveis para investimentos, manutenção e bolsas estudantis. O valor é 18% maior do que os recursos destinados às instituições em 2021: R$ 4,51 bilhões.
Ainda assim, é menor do que o orçamento para universidades sancionado pelo próprio Bolsonaro dias após tomar posse como presidente da República, em 2019: R$ 6,06 bilhões.
Desde 2019, a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ultrapassa os 20%. Considerando esse índice e o orçamento de 2019, a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) aponta que o montante reservado às universidades deveria ser de pelo menos R$ 7,2 bilhões para que mantivesse sua capacidade de compra. Atualmente, ele é 25% menor que isso.
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As conta são referentes só ao orçamento discricionário das universidades. Por lei, o governo é obrigado a transferir às instituições recursos para pagamento de salários, por exemplo. Isso está dentro do orçamento chamado de obrigatório. Já o discricionário é o que vai às universidades e que cabe a elas administrar.
De acordo com Marcus Vinicius David, presidente da Andifes, a redução acumulada desse orçamento já acarretou no corte de bolsas de iniciação científica pagas a alunos, na redução de ações para assistência de estudantes mais pobres e no sucateamento de estruturas.
“No caso da minha universidade, nós tivemos que demitir mais de 300 trabalhadores terceirizados, reduzimos o valor das bolsas pagas a estudantes e o número de bolsas foi cortado”, disse David, que também é reitor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). “A universidade tinha R$ 40 milhões ou R$ 50 milhões por ano para investimento. Hoje, nós temos R$ 3 milhões.”
Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o prédio da reitoria precisa de uma reforma em suas instalações elétricas, mas a instituição não tem recursos para isso. Segundo a UFRJ, há risco de incêndios.
Em 2019, a UFRJ tinha um orçamento discricionário de R$ 389 milhões. Em 2022, tem R$ 329 milhões, e ainda cerca de R$ 20 milhões em contas de 2021 que terão de ser pagos com recursos deste ano.
Presencial vira problema
David afirmou que a redução do orçamento das universidades mantém uma tendência de queda desde 2016. Ele disse que isso está ligado a um contexto político favorável à austeridade fiscal, que surgiu no segundo mandato de Dilma Rousseff (PT) e ganhou força com a chegada de Michel Temer (MDB) à Presidência e a eleição de Bolsonaro.
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Em 2015, as universidades federais chegaram a receber R$ 7,86 bilhões para administrarem. O orçamento de 2022 é 32% menor.
David ressaltou que, de 2019 em diante, os cortes começaram a inviabilizar o trabalho das instituições. Em 2020, a pandemia fez com que universidades adotassem o ensino remoto, o que acabou suavizando o impacto dos cortes.
Em 2022, no entanto, a expectativa é que todas as universidades retomem suas aulas presenciais. Aí, a falta de recursos para manutenção e principalmente para apoio a alunos mais carentes pode fazer diferença.
“Estamos muito temerosos de descobrir, com o retorno presencial, um crescimento muito grande da evasão”, afirmou David, citando a dificuldade que alunos possam vir a ter para manterem-se presentes nas universidades sem a assistência dela.
O presidente da Andifes disse que representantes da Universidade Federal do Piauí (UFPI) já manifestaram preocupação com a evasão neste ano. Lembrou que a Universidade Federal de Goiás (UFG) teve muita dificuldade para sua manutenção em 2021.
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O pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças da UFRJ, Eduardo Raupp, ratificou a preocupação com o retorno das aulas presenciais em entrevista concedida ao jornal da própria universidade.
“O ano de 2022 será de desafios”, declarou. “A volta das aulas presenciais fará com que as despesas com manutenção básica tenham um aumento significativo. Ainda é difícil prever como faremos este equacionamento.”
STF cobra informações
Na semana passada, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que o Congresso Nacional e o Ministério da Educação (MEC) apresentem, em até 10 dias, informações sobre cortes realizados no orçamento das universidades federais. A determinação foi feita após o Partido Verde (PV) ingressar com uma ação na Suprema Corte para evitar o colapso orçamentário e a pane administrativa das instituições.
David, da Andifes, disse que as universidades sofrem também com corte de orçamento de instituições que fomentam a pesquisa, como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O órgão teve, em 2019, R$ 4,19 bilhões a sua disposição. Em 2022, tem R$ 3,83 bilhões reservados no Orçamento da União. O valor, contudo, ainda pode ser suplementado.
Também são afetadas pelos cortes em orçamentos da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), que presta serviços de saúde à população usando a estrutura de hospitais universitários federais. Neste ano, Bolsonaro vetou R$ 100 milhões em recursos do Orçamento da União que seriam destinados à empresa.
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Para David, isso tudo demonstra a falta de sensibilidade do atual governo com o Ensino Superior. E disse que isso deve comprometer o desenvolvimento do país por anos.
“O Brasil é um país que, para dar um salto econômico e social, precisa de investimento em Educação. Da básica à superior”, disse. “Quando o governo não demonstra sensibilidade com a educação, ele demonstra miopia com o projeto de desenvolvimento da nação.”
David ressalta que, apesar dessa falta de sensibilidade e dos cortes orçamentários, as universidades federais não irão fechar.
“A gente podia parar tudo, mas a preocupação é que talvez seja este o projeto [do atual governo]”, afirmou. “Vamos resistir e manter as universidades funcionando a todo custo.”
Edição: Rebeca Cavalcante