Apelidado de “PL da Grilagem”, o Projeto de Lei 410/21, de autoria do governador paulista João Doria (PSDB), foi aprovado nesta terça-feira (8) na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
O placar foi de 57 votos favoráveis e quatro contrários ao projeto. Do quórum de 62 deputados presentes, os que votaram contra o PL foram Carlos Gianazzi, Érica Malunguinho, Isa Penna e Mônica Seixas, todos do PSOL.
O texto aprovado impõe que agricultores familiares que vivem em lotes e assentamentos rurais no estado comprem o título de posse da área.
Pontos polêmicos
Dois pontos do PL foram os mais criticados por movimentos ligados à defesa da reforma agrária.
Um deles, o artigo 4° (que deu origem ao apelido do projeto), previa que cerca de um milhão de hectares de terras públicas devolutas fossem vendidas para fazendeiros que as ocupam irregularmente.
Como resultado de pressão e articulação política de movimentos sociais, esse artigo foi retirado do projeto e, de acordo com o deputado Vinicius Camarinha (PSB), líder do governo, será apreciado em “outro momento”.
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“Consideramos que foi a luta popular que barrou a legalização da grilagem de terras no estado de São Paulo”, ressalta Kelli Mafort, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). “E na atual conjuntura do nosso país, isso é uma vitória”, complementa.
O outro ponto, esse sim aprovado pelos deputados estaduais de São Paulo, diz respeito à titulação de terras assentadas. A proposta de Doria impõe que o agricultor familiar compre o Título de Domínio (TD) dos lotes dos assentamentos.
Pesquisadores e entidades da sociedade civil, como o MST e a Associação dos Funcionários da Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Afitesp), questionam a insuficiência desta modalidade como única opção. O analista de Desenvolvimento Agrário no Instituto de Terras (Itesp), Vinícius Paroni manifestou, no chat da sessão virtual, que “os assentados sonham com um título, mas vão ganhar uma dívida impagável”.
A reivindicação de que fosse respeitado e incluído na Lei o direito constitucional à Titulação de Concessão de Direito Real de Uso, a CDRU, não foi atendida no projeto aprovado.
A CDRU funciona da seguinte maneira: a terra continua sendo do Estado, mas as famílias assentadas e seus sucessores têm garantidos seus direitos de uso sobre ela. Diferentemente do TD, que é oneroso e permite que a terra, depois, seja vendida, a Concessão de Direito Real de Uso é gratuita e torna a área invendável.
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“O MST tem uma posição explícita de defesa do CDRU, mas a gente entende que esse é um direito de escolha dos assentados. O que nós sempre fomos contrários é em relação à imposição de um único título, que é o Título de Domínio”, explica Mafort.
“A luta não se limita ao parlamento”
Segundo um requerimento técnico-científico protocolado por pesquisadores ao Ministério Público no ano passado, sete mil famílias assentadas no estado de São Paulo serão afetadas pela lei.
Durante a sessão, o deputado Carlos Giannazi (PSOL), caracterizou o projeto como “perverso” e como “a privatização da reforma agrária”. Em sua avaliação, estão em risco “a agricultura familiar, a segurança alimentar e reforma agrária no estado de São Paulo”.
“A maldade maior é o que vão fazer depois, porque é um incentivo à venda de terras”, alega Giannazi, um dos poucos deputados que votou contrário ao projeto. “Os assentados serão assediados pelos grandes proprietários de terra. Vamos ter a expansão do agronegócio predatório no estado de São Paulo. O Doria vai transformar esses assentamentos em terrenos que serão vendidos, uma grande imobiliária”, define.
Para Kelli Mafort, o dia foi de batalha. “Nessa batalha tivemos uma vitória, que foi a retirada do artigo 4°, e uma derrota, que foi a não inclusão da CDRU. Mas para nós, que somos de movimento social, a luta não se limita ao parlamento. Vamos continuar essa luta em outras trincheiras”.
Edição: Monique Santos