O dia 3 de fevereiro de 2021 foi marcante para a história da Lava Jato. Exatamente um ano atrás, o Ministério Público Federal (MPF) anunciava a dissolução da força-tarefa de procuradores da República montada em 2014, em Curitiba, para investigar crimes na Petrobras.
Coordenada por mais de seis anos por Deltan Dallagnol, a força-tarefa realizou 79 fases da operação e obteve 298 ordens de prisão. Também denunciou ao então juiz Sergio Moro o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o qual chegou a ser condenado e preso em 2018 por sentenças depois anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Considerando suas ações contra Lula e outros políticos, o trabalho da força-tarefa sempre foi criticado por réus e investigados por ter um suposto viés partidário. Menos de um ano após a dissolução do grupo, Moro já é pré-candidato a presidente pelo Podemos, enquanto Dallagnol deve ser candidato a deputado federal pelo mesmo partido.
Para quem acompanhou a operação, isso só reforça a real intenção de seus membros mais ilustres.
“Deltan e Moro claramente tinham o objetivo de usar a estrutura da Lava Jato para atingir o poder”, afirmou o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que atuou na defesa de mais de uma dezena de investigados pela operação.
Segundo Kakay, a parcialidade de Moro para julgar Lula já foi, inclusive, reconhecida pelo STF. Isso significa que o juiz não era isento para julgar e condenar o ex-presidente pouco antes das últimas eleições presidenciais, quando Lula liderava as pesquisas de intenção de voto.
“As candidaturas de Deltan e Moro confirmam de forma inequívoca que as ações da força-tarefa tinham interesses políticos e eleitorais”, complementou Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo de advogados Prerrogativas, que reúne alguns dos principais criminalistas do país. “As ações da força-tarefa atendiam a interesses de cada um dos integrantes por destaque frente a projetos pessoais.”
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"Quarentena política"
Para Carvalho, as pretensões políticas de Moro e Dallagnol apontam para a necessidade da criação de uma regra que obrigue membros do Judiciário a cumprir um período de quarentena ao deixarem seus cargos para se candidatarem a cargos eletivos.
O advogado Flávio D'Urso, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), não vê essa quarentena como obrigatória, mas diz que a candidatura de Moro e Dallagnol são inadequadas.
"Não vejo como adequado alguém que atuou num processo que teve impacto direto nas eleições posteriormente ingressar no sistema político", considera D'Urso, citando o caso do ex-juiz. "Isso não causa uma boa impressão à Justiça brasileira perante o mundo."
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Novo formato
Carvalho, do Prerrogativas, disse ainda que o MPF acertou em encerrar a Lava Jato no Paraná. Para ele, a força-tarefa até cumpriu um papel importante no combate à corrupção, mas havia perdido seu foco e, por fim, servia somente a objetivos de seus membros.
Kakay compartilha dessa mesma opinião. “A Lava Jato do Paraná criou uma estrutura maior que a do próprio Ministério Público”, afirmou ele.
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Quando a força-tarefa foi encerrada, ela se travava de uma disputa interna entre membros do MPF alinhados ao procurador-geral da República, Augusto Aras, nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
Aras havia criticado em eventos públicos o excesso de poder que membros da Lava Jato haviam ganhado no decorrer da operação. Ele articulou a substituição das forças-tarefas por Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaecos) no MPF.
Em fevereiro de 2021, a Lava Jato foi oficialmente incorporada pelo Gaeco do Ministério Público Federal do Paraná. Dallagnol não fazia mais parte da força-tarefa. Outros antigos membros da operação, contudo, foram trabalhar no novo grupo.
Dentro dessa nova estrutura, pelo menos três fases da operação Lava Jato foram deflagradas. Uma delas aconteceu em outubro. O MPF e a Polícia Federal sequer mencionaram em comunicados públicos que a ação fazia parte da Lava Jato, após o desgaste da operação diante de tantas críticas.
Mantra contra corrupção
O legado da Lava Jato, contudo, segue como o principal ativo político de Moro e Dallagnol em busca da eleição. O ex-juiz e o ex-procurador têm repetido em eventos públicos que o combate à corrupção é um dos grandes desafios do país.
Intenções de voto
Pesquisa eleitoral divulgada pelo instituto PoderData nesta quarta-feira (2) aponta que Moro tem 7% das intenções de voto para presidente, o mesmo que Ciro Gomes (PDT). Ambos seguem atrás de Lula, com 41%, e do presidente Bolsonaro, que tem 30%.
Ainda não foram divulgadas pesquisas sobre intenções de voto para deputado federal no Paraná. O Podemos, partido de Dallagnol, aposta que o ex-procurador será eleito com facilidade para o cargo, com votação recorde.
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Silêncio
Procurados, nem Moro, nem Dallagnol quiseram comentar o aniversário do fim da Lava Jato e as críticas ao viés político de membros da operação.
O MPF também não se pronunciou sobre o fim da força-tarefa e sobre as pretensões políticas do seu ex-coordenador.
Edição: Rodrigo Durão Coelho