A condenação do jogador Robinho por violência sexual pela participação em um estupro coletivo deveria motivar ações práticas de clubes, federações e patrocinadores contra a desigualdade de gênero no esporte. A avaliação é de especialistas no tema ouvidos pelo Brasil de Fato.
Segundo eles, a decisão da Corte de Cassação da Itália, mais alta instância do Poder Judiciário do país europeu, que confirmou na quarta-feira (19) a condenação do jogador e de seu amigo Ricardo Falco a nove anos de prisão, deve ser celebrada.
Fernanda Ribeiro Haag, doutoranda em História pela USP e colunista de futebol do BdF Paraná, e o especialista em marketing esportivo Amir Somoggi apontam, no entanto, a necessidade de uma mobilização para evitar novos casos como o de Robinho.
"A condenação em última instância e, por isso, sem direito a recursos, traz um sentimento de justiça. Primeiramente, para a vítima que era uma jovem de apenas 23 anos quando sofreu um estupro coletivo e, depois, para todas as mulheres, especificamente para aquelas que vivem o futebol", comemora Haag.
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A pesquisadora apontou a necessidade de clubes não contratarem mais jogadores, treinadores e funcionários que tenham histórico de violência contra as mulheres e citou o caso do técnico Cuca, condenado na Suíça por um estupro coletivo e que nunca cumpriu a pena: "O Cuca continua sendo celebrado por diversos torcedores, tendo destaque. Esses homens não poderiam estar nas posições que eles estão ou estavam".
"O que eu gostaria é que todo esse processo impulsionasse, dentro do meio do futebol-espetáculo dos homens, discussões sobre a violência contra a mulher e, mais ainda, ações práticas contra isso. Ações que começassem, por exemplo, nas categorias de base, conscientizando os futuros jogadores sobre desigualdade de gênero e violência de gênero", avalia.
Na visão de Somoggi, o caráter mercadológico do esporte força, cada vez mais, que personagens como Cuca e Robinho tenham que prestar contas de suas atitudes fora de campo: "Tudo o que é polêmica afasta o interesse dos patrocinadores em ter atletas como embaixadores para as marcas."
"Trazendo para os clubes, isso ocorre mais ainda, porque os clubes têm o jogador como ídolo. Essa reação muito dura com relação a times que tentam trazer jogadores que foram punidos ou que foram condenados, é uma modernização da sociedade, que já não aceita mais a lógica de 'só porque é atleta pode?' 'Não'. Ninguém está acima do bem e do mal", afirmou.
O especialista em negócios do esporte ressalta não haver "o menor sentido" em um clube fechar contrato com Robinho após a decisão da Corte de Cassação da Itália.
"O clube vai fechar o contrato com Robinho e, automaticamente, um patrocinador vai dizer que vai rescindir o contrato. Lá no contrato, é dito que se o clube de alguma maneira botar em risco a integridade da marca da empresa – e algumas são cotadas em bolsa –, e isso pode ser muito grave", ressalta.
Somoggi afirma que alguns países aplicam medidas duras contra a sonegação fiscal, por exemplo, e que é preciso praticar a mesma lógica em crimes de violência de gênero:
"Isso é muito forte na questão fiscal. Muitos países como Estados Unidos, Japão e Espanha são muito duros com ídolos e não permitem que eles soneguem. Podem até botá-los na cadeia para mostrar à população que todo mundo tem que pagar imposto".
Haag pontua que a condenação não pode ser enxergada apenas pela lógica do punitivismo: "Claro que é preciso sempre lembrar que aqui não é uma iniciativa ou uma tentativa de sanha punitivista e que vale a pena investir nisso. A condenação é importante para nos lembrar que alguém que cometeu um estupro coletivo não pode ser ídolo de milhares de pessoas e influenciar crianças e jovens, porque isso naturaliza a violência".
Edição: Leandro Melito