RACISMO RELIGIOSO

Terreiro é incendiado no litoral sul de Pernambuco: "Querem apagar nossa história"

Perícia e coleta de provas no local começa nesta quarta (05); incêndio aconteceu no 1º de janeiro, Dia Mundial da Paz

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Vizinhos acordaram com o cheiro da fumaça poucas horas após o local encerrar as festividades de Ano Novo - Divulgação

No litoral sul de Pernambuco, o Ilê Axé Ayabá Omi, também conhecido como Terreiro das Salinas, que fica no município de São José da Coroa Grande, foi surpreendido no primeiro dia do ano com um incêndio. Seguindo a tradição Jeje-nagô, o terreiro foi fundado há dois anos pelo babalorixá Lívio Martins.

As chamas surpreenderam os filhos da casa. Uma delas é Vanessa Ferreira, filha de santo no terreiro há mais de um ano. “O sentimento é de revolta, porque o tempo todo as pessoas querem apagar nossa história, nossa identidade, nosso modo de vida… até porque o candomblé não é só uma religião, é um modo de vida, de história ancestral”, lamenta.

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Em nota veiculada nas redes sociais, o Ilê aponta o fato como racismo religioso e reafirma que a ofensiva conservadora sobre as religiões de matriz africana é um fato antigo “Não é de hoje que os terreiros das religiões de matriz africana, afro-brasileira e afro-indígena tem sido alvo constante das violências, intolerâncias e racismo religioso que tentam impedir a realização de nossos rituais, da adoração aos nossos orixás e entidades sagradas”. 

Perícia

Os procedimentos jurídicos estão sendo feitos com o acompanhamento do Projeto Oxé, que fornece atendimento jurídico e psicossocial contra o racismo. Na segunda-feira (3), foi feito um Boletim de Ocorrência na Delegacia de São José da Coroa Grande, e nesta quarta (5) inicia o processo de perícia, coleta de provas e outros procedimentos. Também foi feito um pedido de investigação pelo Ministério Público de Pernambuco.


Chamas se espalharam rápido, já que o local continha muita palha e folhas secas, mas a suspeita é de um incêndio criminoso, de acordo com os religiosos da casa / Divulgação

Histórico

De fato, a casa já tem um histórico de impedimento de realização das atividades, com rituais interrompidos em três ocasiões, como explica Vanessa: “As ‘denúncias’ eram feitas por alguma pessoa, não sabemos se era sempre a mesma, mas chegava lá [no terreiro] justamente a Polícia Militar de Pernambuco”.

Ela também explicou que por questões de segurança, as atividades religiosas há algum tempo só são realizadas durante a manhã. No data do acontecido, o local, que recebeu visitas até o começo do dia, foi incendiado poucas horas após o fechamento.

A avaliação da casa é que o impedimento das atividades já havia sido resolvido, inclusive porque, além das atividades religiosas, o Terreiro de Salinas realiza ações de solidariedade na comunidade como a distribuição semanal de sopa, o reforço escolar gratuito às crianças e entrega de cestas básicas da Campanha Tem Gente Com Fome, da Coalizão Negra por Direitos.

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Apesar do acontecido, a casa deve se reconstruir e continuar funcionando, como a nota ressalta: “O que aconteceu foi uma tentativa de apagamento, de silenciamento e opressão, mas que não nos impedirá de continuar a cultuar nosso sagrado”, afirmam.

Agora, o esforço de reconstrução conta com a ajuda de doações em dinheiro, através da chave pix [email protected]. Além das doações em dinheiro, o Terreiro Salinas também está recebendo doações de material didático, mesas e carteiras escolares para a retomada das aulas de reforço.

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Rebeca Cavalcante e Francisco Barbosa