A gente precisa da terra para viver. Esse é o elemento
A luta de famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Sul da Bahia não se encerra com a conquista da terra. A transformação é contínua e passa por um processo de plantar e colher de forma agroecológica.
No Assentamento Jacy Rocha, em Prado (BA), o sistema agroflorestal de cultivo do café é uma mistura entre técnica, ancestralidade e relação afetiva.
A cada linha de árvores nativas, são três linhas de café. Mais altas, as árvores tradicionais reduzem a incidência direta do sol e do vento, e assim evitam pragas e a perda de água. E para ajudar a fixação do nitrogênio no solo, são usadas plantas, chamadas carinhosamente de adubo verde.
"A gente sempre trabalha com a prevenção e o controle. Tipo, as pragas, a gente sabe por exemplo, a ferrugem no café, a gente sabe que é uma doença que vem e que nos modos convencionais são as que mais atacam a lavoura. No modo agroflorestal uma coisa que ajuda no controle da ferrugem é a diversidade de nativas. Você tem um sistema com árvores, com barreiras, com quebra ventos, ajuda a não estar trazendo algumas doenças, né?", conta o jovem camponês Iago Alves.
Contraponto ao Agronegócio
A produção do café agroecológico no local, que envolve mais de 20 famílias, iniciou com o programa Alianças Produtivas, do governo da Bahia. Cada assentado contemplado tem disponível em seu lote um hectare para o cultivo de 3 mil pés do grão.
A produção, que ainda aguarda selo de certificação, é um contraponto às lavouras convencionais que predominam em Prado e outros municípios da região sul da Bahia.
"Então nós estamos em um caminho, em uma construção. Nós entendemos que ainda estamos chegando lá, mas já teve uma grande diferença na qualidade do café, no tempo de maturação do café, em um café de boa qualidade, um grão bem formado, uma planta sadia", aponta o engenheiro agrônomo Rafael Passos Rangel.
Uma década de agroecologia
Com 267 famílias assentadas, o Jacy Rocha tem uma história de dez anos como referência em agroecologia no sul da Bahia.
A área foi reconhecida como assentamento pelo Incra em 2015. No ano seguinte, o movimento organizou a partilha dos lotes familiares e desenvolveu em cada um deles os chamados quintais produtivos. É o que explica Felipe Campelo, coordenador da Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto, que funciona no local.
"A gente preparava a terra, calcariava a terra, fazia uma uma reposição de fósforo, de fosfato reativa, uma rocha que a gente usava. A gente inseriu leguminosas, a gente inseriu plantas nativas, a gente inseriu frutíferas. E as famílias começam suas vidas com as suas hortas, com a mandioca, com a abóbora, com culturas mais rápidas".
"Ou seja, as famílias depois de oito, dez anos acampadas tinham uma necessidade econômica muito grande de começar a ir pra frente. E as culturas anuais rápidas foram fundamentais para a manutenção das famílias, mas também para gerar renda de forma rápida", explica Campelo.
A criação da Escola foi outro importante passo para aprimorar a formação das famílias em torno da produção de alimentos saudáveis.
O local, reconhecido pela Secretaria de Educação da Bahia, também é um polo de alfabetização no extremo Sul da Bahia. Por lá, cerca de 800 famílias da região aprenderam a ler e escrever.
Edição: Letícia Viola