Arte

Resistência e afeto dão o tom de exposição que reescreve antigas fotografias indígenas

“Retomada da Imagem” exibe obras coletivas dos artistas Denilson Baniwa, Gustavo Caboco e convidados no Museu Paranaense

Curitiba (PR) |
Evento tem entrada gratuita - Foto: Marco Novak

A relação com a terra, os laços familiares e a resistência indígena são os temas centrais de uma série de obras produzidas coletivamente pelos artistas indígenas Gustavo Caboco, Denilson Baniwa e convidados. As produções são resultado do projeto Retomada da Imagem, do Museu Paranaense (MUPA), que propõe a revisão do seu próprio acervo a partir de outros olhares.

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A abertura da exposição, que é fruto da residência artística realizada no projeto, acontece nesta quinta-feira (16) às 19h, com a presença dos artistas. A exposição tem entrada gratuita.

O Projeto Retomada da Imagem começou em agosto de 2021, com a aproximação de Baniwa e Caboco do vasto acervo de fotografias do Museu Paranaense que retratam diversos povos indígenas do Paraná e da América Latina.

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Na segunda etapa do projeto, os artistas propuseram um museu-ateliê com a participação de indígenas paranaenses. A partir do contato com esse material, das reflexões, conversas e até mesmo de um sonho, foram surgindo formas, cores e conexões que traduzem resistências e afetos.

“A gente percebeu que o material precisaria ser exposto, virar uma exposição, onde pudessem ser colocados todos os nossos pensamentos, questionamentos, entendimentos de produção de imagem em contraste com o próprio acervo fotográfico do museu”, relata Baniwa. O artista e curador amazonense, vencedor do Pipa, maior prêmio de arte contemporânea do Brasil, tem participado de importantes exposições nacionais e internacionais.

“É importante a gente fazer, como diria o Ailton Krenak, essas alianças afetivas onde aquilo que nos afeta pode ser compartilhado e juntos a gente pode pensar uma solução ou uma resposta para alguma pergunta que esteja aberta”, reflete Denilson Baniwa. Ele é considerado um artista antropófago, pois apropria-se de linguagens ocidentais para decolonizá-las em sua obra.

Uma das perguntas abertas pelo olhar indígena para esses acervos foi quem representa quem nessa produção artística ou fotográfica. Outro questionamento levantado pelo grupo foi como se forma essa imagem indígena a partir desses acervos.

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“Na construção de narrativas de imagens há exotizações, tipificações que funcionaram no campo acadêmico que podem até revelar uma ideia de racismo na imagem. A arte traz a ideia de poder recontar algumas das histórias que para a gente não fazem sentido”, explica Caboco.

Gustavo Caboco, um dos expoentes da arte indígena contemporânea, participou recentemente da 34ª Bienal de São Paulo com um amplo conjunto de obras. Sua investigação poética gira em torno do retorno à terra e se traduz em desenhos, bordados, na animação e no diálogo entre objetos diversos e sua identidade indígena.

Álbum de família e novas histórias

Denilson conta que o grupo conseguiu identificar quem eram os fotografados em algumas imagens do acervo que traziam legendas genéricas. “Nomear essas pessoas fotografadas dá um sentido de retomada, identifica-se e se reapropria essas imagens. Não mais como só um registro etnográfico, mas como registro familiar, como álbum de família”, diz.

O trabalho coletivo foi realizado por Caboco e Baniwa, com Camila dos Santos e Thais Krīg (Kanhgág), Indiamara e Nicolas Paraná (Xetá), Juliana Kerexu, Ricardo Werá, Flávio Karai, Elida Yry (Mbyá-Guarani) e Lucilene Wapichana (Wapichana). A exposição foi pensada pelos artistas para expressar, para além dos limites do museu, a história, presença e perspectiva indígenas.

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“É um grito de basta, de estar presente, porque, quando a gente traz essa retomada desse olhar nosso, desmonta todo esse processo de colonização que foi e ainda existe. A gente está nesse processo há 521 anos, mas hoje a gente está falando do que as imagens nos trazem, do que é de fato, não desse olhar do colonizador. Então trazemos isso em forma de luta, de levantar a mão e trazer essa percepção de que nós existimos, estamos aqui e sabemos para onde vamos”, afirma Juliana Kerexu.

Fonte: BdF Paraná

Edição: Lia Bianchini