Paraná

Direitos indígenas

Violência institucional e invisibilidade penal afetam indígenas encarcerados no Paraná

Audiência pública realizada pela Assembleia Legislativa debateu formas de melhorar a defesa de indígenas presos

Curitiba (PR) |
Audiência pública realizada na manhã desta segunda-feira (06) debateu a situação carcerária da população indígena no Paraná - Foto: Giorgia Prates

A situação carcerária de indígenas no Paraná foi tema de uma audiência pública realizada nesta segunda-feira (06), na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), por proposição do presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Tadeu Veneri (PT). O debate contou com a participação de parlamentares, professores, especialistas e estudiosos do assunto.

Notas técnicas do Ministério da Justiça e uma pesquisa da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) em parceria com a Procuradoria Geral da República mostraram o processo de apagamento étnico nas prisões. De acordo com os órgãos, há o fichamento dos indígenas como “pardos” nas instituições de Justiça. Além disso, muitos sofrem com a questão linguística, já que existem registros de indígenas presos que não possuem o domínio da língua portuguesa. Dessa forma, não conseguem comunicar suas demandas.

“Os indígenas que adentram no sistema carcerário possuem uma série de prerrogativas, considerando direitos específicos e necessidades culturais. Pairam, porém, em diversos estados, assim como no Paraná, denúncias de violações, principalmente por motivo de descaracterização étnica, ausência de intérpretes e antropólogos e desrespeito aos direitos indígenas”, afirmou o deputado Tadeu Veneri.

Entre os principais problemas identificados pelos participantes estão a invisibilidade legal indígena; a falta de intérpretes das línguas nativas; o pouco ou nenhum acesso à defesa (a maioria das aldeias ficam em comarcas onde a Defensoria Pública não opera, obrigando o Estado a designar um dativo, que muitas vezes não têm conhecimentos dos povos e línguas); as especificidades culturais que no contato interétnico são tipificadas como crime ou ofensa grave; além da incompreensão do rito processual e dos motivos que resultaram na prisão.

"Estamos diante de um caos"

Florêncio Rekaygang Fernandes, professor, pedagogo, mestre em educação, doutorando em antropologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) é pertencente ao povo indígena do Tronco Jê – Etnia Kaigang e estuda o tema. O especialista comentou que a autodeclaração como indígena ainda é um tabu, ainda mais quando se trata de presídios. “Há toda a questão de discriminação dentro dos presídios, com um tipo de pressão. Muitos se sentem envergonhados em se declarar indígenas”, lembrou.

Para o desembargador Ruy Muggiatti, supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização (GMF) do Sistema Carcerário e do Sistema de Socioeducação do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), o sistema carcerário brasileiro é deficiente como um todo e isto tem profundos reflexos na questão indígena.

“Há um excesso de pessoas, o que significa a existência de um caos. É fácil de perceber como a Lei Anticrimes, que provocou um endurecimento da lei penal, refletiu em mais presos em um sistema já cheio. Aumentou o problema ao invés de diminuir. Neste cenário está inserido o cidadão indígena. A posição do indígena é muito mais vulnerável. Estamos diante de um caos e quem é mais vulnerável vai sofrer muito mais”, ponderou.

Encaminhamentos

Para fazer frente às dificuldades, uma carta foi elaborada pelos participantes da audiência para ser encaminhada para as autoridades competentes.

Entre as medicas sugeridas, estão a designação de intérprete e antropólogo pelo Estado para auxiliar em casos de indígenas que não dominam a língua portuguesa; a notificação à Fundação Nacional do Índio (Funai) dos casos de indígenas presos no contexto urbano; a permissão para a operação da Defensoria Pública em casos de réus indígenas, independentemente da comarca; e a capacitação de operadores do direito e agentes prisionais.

O deputado Goura (PDT) lembrou que os resultados da audiência devem ser práticos. “Temos de falar da inviabilização de toda temática que cerca as lutas indígenas. Quando falamos da situação carcerária, isso continua. Temos o desmonte de uma série de políticas públicas. O Paraná tem mais de 26 mil indígenas, que estão muito mais expostos e passam por muitas violações”, disse.

*Com informações da comunicação da Assembleia Legislativa do Paraná.

Edição: Lia Bianchini