O golpe perpetrado contra a presidente Dilma Rousseff, em 2016, abriu no Brasil as portas para o fascismo declarado e descarado, cujos agentes com maior representação explícita são Jair Bolsonaro e Sérgio Moro; sendo este último muito mais perigoso para o povo brasileiro do que o primeiro.
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Isto porque Bolsonaro nunca escondeu de ninguém sua preferência por atos antidemocráticos, manifestou-se frequentemente com desrespeito à ordem constitucional de 1988 e declarou-se publicamente um adorador do regime ditatorial que governou o Brasil entre 1964-1985, na sua linha mais dura.
Sérgio Moro, com suas roupas escuras e “aparência limpinha”, fez parte da burocracia mais repressiva, que declaradamente colocou-se contra a Constituição de 1988 e seus princípios fundamentais, consagrados pela ordem liberal ocidental que diz defender. Além disso, o ex-juiz federal, durante o exercício de suas funções jurisdicionais atentou sistematicamente contra os interesses do país, colaborou para a destruição das empresas brasileiras de engenharia e abriu o caminho para a entrega da Petrobras ao capital internacional.
Ou seja, enquanto integrante do judiciário, Moro agiu em nítido favorecimento aos interesses imperialistas dos Estados Unidos da América, tanto assim que foi lá que buscou proteção logo depois que deixou o governo fascista de Jair Bolsonaro, em abril de 2020. Depois de permanecer um período sob o abrigo do Tio Sam, retorna ao Brasil e, pouco tempo depois, começa a ser construída a sua imagem como candidato à presidência da República.
Como manifestei, Sérgio Moro, por sua formação de burocrata frio, calculista e repressor, representa um perigo para o povo, pois violou a Constituição para atingir seus interesses políticos pessoais e oportunistas.
O projeto político de Moro coloca ainda mais em risco a soberania e o desenvolvimento do Brasil, que têm sido golpeados continuamente desde o indevido impeachment de Dilma Rousseff em 2016.
Assim, para que possamos entender o projeto do ex-juiz Sérgio Moro (apoiado por parte da classe dominante brasileira, que despreza o país e o povo), inicialmente, é importante realçar algumas das divulgações realizadas pelo portal de notícias The Intercept Brasil, durante os anos de 2019 e 2020, que praticamente desnudaram a Operação Lava Jato e a atuação daquele que foi o juiz federal titular da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, de onde saiu para ser ministro de Bolsonaro.
A divulgação dos diálogos veio a público por meio da denominada “Operação Spoofing”, conforme autorização da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), e as informações divulgadas foram gravíssimas, em razão da violação da ordem jurídica e até mesmo da soberania nacional; pois o que se revelou foi um grande conluio entre o ex-juiz, integrantes da acusação e agentes estrangeiros para desestabilizar a ordem democrática, política, econômica e social do Brasil.
É importante registrar o ocorrido no dia 13 de março de 2016, conforme o que foi liberado pela decisão do Supremo Tribunal Federal, pois deixa evidente o caráter político que pontuou a atuação dos líderes da Lava Jato. Naquela data, três dias antes do vazamento do diálogo obtido mediante a ilegal interceptação do telefone do Palácio do Planalto (a conversa entre a ex-Presidente da República Dilma Rousseff e o ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva), Deltan Dallagnol manifestou para o então juiz federal Sérgio Moro: “... Você hoje não é mais apenas um juiz, mas um grande líder brasileiro (...). Seus sinais conduzirão multidões, inclusive para reformas que o Brasil precisa, nos sistemas político e de justiça. ...”.
Nesse passo, o portal de notícias jurídicas Consultor Jurídico, em 1º de fevereiro de 2021, informou que “Deltan Dallagnol articulou ‘renovação política’ nas eleições de 2018”. Ou seja, com o passar do tempo, constatou-se que a referida Força Tarefa da Lava Jato e o ex-juiz federal Sérgio Moro tinham um projeto político em curso, que conduziram à custa do sacrifício da democracia e da soberania nacional, causando gigantescos prejuízos à economia, promovendo a destruição de empresas e a aniquilação de milhões de postos de trabalho.
E tudo fizeram sem quaisquer escrúpulos em se envolver de modo irregular com autoridades estrangeiras, como disse o ex-juiz federal Sérgio Moro, em 04 de novembro de 2015, para Deltan Dallagnol: “Colocar US attorneys para trabalhar pois até agora niente rs.” E mais, em 07 de dezembro de 2015, o ex-juiz federal Sérgio Moro manifestou para Deltan Dallagnol:
“Então. Seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodada por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedades de um dos filhos do ex-Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou então repassando. A fonte é séria.”
Em resposta, Deltan Dallagnol diz para o ex-juiz federal, no mesmo dia: “Liguei e ele arriou. Disse que não tem nada a falar etc... quando dei uma pressionada, desligou na minha cara... Estou pensando em fazer uma intimação oficial, com base em notícia apócrifa.”
Observa-se dos diálogos acima que o ex-juiz federal repassou contato e informação para a acusação (Dallagnol); confundindo-se entre juiz e acusador. A acusação simula “uma intimação oficial, com base em notícia apócrifa”; ou seja, inventada pelo procurador.
O ex-juiz federal Sérgio Moro, em 03 de fevereiro de 2017, dirigiu-se a Deltan Dallagnol para expor que:
“Nas ações penais do LL e do Palocci, tem dezenas de testemunhas arroladas pelas Defesas dos executivos da Odebrecht. Depois da homologação isso não parece fazer mais sentido, salvo se os depoimentos forem para confirmar os crimes. Isso está trancando minha pauta. Podem ver com as Defesas se não podem desistir?” E Deltan Dallagnol lhe responde: “Resolvemos sim. Falaremos com os advogados para desistirem.”
É neste ambiente, comandado pelo ex-juiz federal, que se desenvolveu a operação Lava Jato, em que o autoritarismo, a intimidação, a fraude processual, o abuso e a violação à Constituição e às leis se fizeram presentes.
Por isso e por outros motivos, o ex-Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, Técio Lins e Silva afirmou, em entrevista à TV 247, em 10 fevereiro de 2021: “Moro foi o representante máximo do arbítrio e da intransigência”, uma vez que “não são da ‘natureza do relacionamento do Poder Judiciário’, ‘combinações espúrias, ilegais e clandestinas para prejudicar e obter o resultado condenatório’”.
Ademais, é de conhecimento geral que, no dia 16 de março de 2016 (três dias depois do Procurador da República Deltan Dallagnol declarar ao ex-juiz federal Sérgio Moro que ele já não era mais “apenas um juiz, mas um grande líder brasileiro, cujos sinais conduzirão multidões”), o telefone do Palácio do Planalto foi ilegalmente interceptado e a conversa mantida entre a Presidente da República Dilma Rousseff e o ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva foi gravada, sendo no mesmo dia liberada ilegalmente pelo ex-juiz federal para ser divulgada pelo Jornal Nacional da Rede Globo de Televisão.
O falecido Ministro Teori Zavascki, relator da Reclamação número 23.457/PR, proposta pela Presidente da República, no Supremo Tribunal Federal, manifestou em sua decisão que:
“... Com efeito, a violação da competência do Supremo Tribunal Federal se deu no mesmo momento em que o juízo reclamado (13ª Vara Federal Criminal de Curitiba), ao se deparar com possível envolvimento de autoridade detentora de foro na prática de crime, deixou de encaminhar a este Supremo Tribunal Federal o procedimento investigatório para análise do conteúdo interceptado. E, o que é ainda mais grave, procedeu a juízo de valor sobre referências e condutas de ocupantes de cargos (Presidente da República) previstos no art. 102, I, b e c, da Constituição da República e sobre matéria probatória que, segundo a própria decisão, não mais se encontrava na esfera de competência do reclamado.”
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O ex-juiz federal Sergio Moro sabia que agia de forma contrária à lei, porque não era de sua competência (como explicitado pelo falecido Ministro Teori) atuar sobre atos da Presidência da República (competência do STF, por prerrogativa do foro, artigo 102, I, alínea “b”, da Constituição), e também porque a Lei 9.296/96 proíbe expressamente a divulgação de qualquer conversação interceptada (que deve ser mantida em sigilo, em respeito à intimidade, à privacidade e à presunção de inocência, garantidas pela Constituição).
A divulgação do referido áudio, ilegalmente autorizada pelo mencionado ex-juiz, provocou a ocorrência de distúrbios em várias ruas e cidades brasileiras (na denominada “noite da balbúrdia”), levando o caos à ordem política e social e à segurança pública, com veículos incendiados e pessoas agredidas simplesmente por estarem vestindo camisas na cor vermelha.
O ex-juiz Sérgio Moro, em plena consciência do seu ato, promoveu uma convulsão social e estimulou a desordem no país, numa sucessão de atos incompatíveis com a função de um magistrado.
Ao contrariar a ordem democrática e o estado de direito, Sérgio Moro atentou diretamente contra a instituição da Presidência da República e, o mais grave, atacou diretamente a Constituição, que proíbe esse comportamento indevido e próprio de agentes autoritários.
Acrescente-se o fato de que esses acontecimentos abriram as portas para a conspiração que conduziu ao impedimento de Dilma Rousseff; o que, sem dúvida, enfraqueceu a ordem constitucional de 1988 e, desde então, jogou no caos a democracia brasileira. Tanta destruição provocada por um ex-juiz que deveria fazer cumprir e respeitar a Constituição. Imaginemos, então, o que mais ele se atreverá a fazer, sendo Presidente da República?
Continuaremos a tratar das gravíssimas violações à Constituição, promovidas pelo ex-juiz federal, que, para realizar seu projeto político pessoal, não hesitou em trabalhar sistematicamente contra os interesses do país, e, com seus atos, somente favoreceu os mais ricos e os interesses internacionais, em detrimento da soberania do Brasil. E que, ao final de tudo, não apresentou nenhum resultado concreto em seu alardeado combate à corrupção.
*Doutor em ciência política (IUPERJ), com pós-doutorado (CPDA/UFRRJ), mestre em Direito (UFRJ) e graduado pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É membro do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), integrando a diretoria no mandato de 2020/2021, e diretor de Direitos Humanos da Casa da América Latina.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Mariana Pitasse