Dia 30 de Novembro é o Dia Estadual das Mulheres na Política no Estado do Rio de Janeiro, data instituída pela Lei 9093/2020 (que insere a data no Calendário Oficial do Estado) e reforçada pela Lei 9315/2021, que cria o Programa Mulheres na Política no estado do Rio de Janeiro, uma forma de incentivar maior participação feminina na atividade política e ampliar o número de mulheres nos espaços de poder e de decisão, ambas de minha autoria enquanto deputada estadual.
O debate sobre as próximas eleições ao governo do estado e à Presidência da República tem tomado a mídia nos últimos meses, mas algo nos intriga. O debate político em torno de possíveis nomes estampados na imprensa passa apenas por um gênero: o masculino. Embora, nós, mulheres, sejamos 52% do eleitorado, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ainda somos excluídas das discussões políticas e da tomada de decisões.
Analisando a lista de governadores do Estado do Rio de Janeiro desde 1904, encontramos apenas duas mulheres, sendo apenas uma mulher negra, a deputada federal Benedita da Silva (PT), única governadora dos últimos 20 anos que não foi afastada nem está presa. Essa constatação é contraditória, uma vez que, de acordo com dados do IBGE, 54% da população brasileira é negra.
No contexto nacional, a única mulher eleita presidente da República, Dilma Rousseff, sofreu impedimento de seu mandato com uma violenta e misógina campanha de ódio contra ela. Temos, hoje, na Presidência da República e vice-presidência, homens que encampam uma agenda fundamentalista, machista, racista e LGBTIfóbica. Todo o debate em torno de possíveis presidenciáveis também está centralizado prioritariamente em homens brancos.
O feminismo por séculos lutou pelo direito ao voto e pela participação das mulheres na política. Nós, mulheres negras, temos um papel fundamental nessa história, desde Antonieta de Barros, primeira mulher negra a exercer um mandato no Brasil, as organizações da Marcha das Mulheres Negras, a luta pela PEC das Domésticas e a mobilização junto ao Tribunal Superior Eleitoral pela distribuição do fundo eleitoral para candidaturas negras.
As dificuldades das mulheres no acesso à política institucional começam dentro dos próprios partidos que, muitas vezes, não consideram as desigualdades de gênero, raça e classe. Este quadro se materializa na falta de financiamento, na distribuição desigual do fundo eleitoral, na divisão do tempo de rádio e TV da propaganda eleitoral e do acúmulo de jornadas de trabalho.
Desde 2018, nós perdemos muito. Perdemos nossa companheira e vereadora Marielle Franco que iniciou o movimento “Mulheres na Política”, que trata da aliança feminista entre parlamentares e lideranças de esquerda para ocupação dos espaços. Perdemos tanto, que perdemos até o medo de ocupar esses espaços.
Se, por um lado, emerge uma voz fundamentalista de ódio às mulheres, à população negra e LGBTI+, por outro lado, também emergiu a voz dos movimentos feministas, negro, LGBTI+, indígena e demais vozes dissidentes. Precisamos lembrar que fomos nós, mulheres, que ocupamos as ruas com o “Fora Cunha” e o “Ele Não”. E fomos nós, mulheres negras, que lutamos contra a violência policial e reivindicamos que “Vidas Negras Importam”.
Temos muitos desafios para retomar o nosso país e construir uma sociedade de bem-viver, fundamentada no repartir, no comunitarismo e em outro modo de fazer política que não seja baseado na concentração, e sim na distribuição. Para enfrentar todas essas dificuldades estruturais, consideramos que o feminismo negro, o encontro das lutas das mulheres e antirracistas, tanto quanto o cooperativismo, são imprescindíveis para que alcancemos a justiça participativa de que depende a consolidação do regime democrático.
Fui eleita deputada estadual com 40.631 votos e no dia do lançamento da minha candidatura afirmei e hoje reafirmo: “Não farão política sem nós!”. Ao dizer isso, convoco as populações negras e indígenas, as mulheres, pessoas LGBTI+ a se apropriarem desse debate e a seguirem explicitando que a democracia, sem nossos corpos, vozes e pautas, será sempre como a repetição dos Bonaparte no poder (Napoleão e Luís) de que fala Marx: “primeiro tragédia, depois farsa".
*Mônica Francisco é deputada estadual pelo Psol-RJ e a primeira mulher negra presidir a Comissão de Trabalho, Legislação e Seguridade Social da Alerj.
Edição: Eduardo Miranda