cultura urbana

Dos territórios indígenas aos museus: o hip hop ocupa cada vez mais espaços

Dia Mundial do Hip Hop é celebrado em 12 de novembro: no Brasil, o movimento atual é marcado pela pluralidade

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Primeiro museu voltado ao hip hop da América Latina tem abertura prevista para maio de 2022 em Porto Alegre (RS) - Museu da Cultura Hip Hop RS
Em 90, quando eu me descubro uma mulher feminista, eu começo a falar do universo feminino

Ferramenta de protesto, produto de sucesso, tema de livro e até de museu. O hip hop brasileiro tem muitas faces, e vem conquistando novos espaços a cada dia.

Quem acompanha essa história de perto é a rapper Sharylaine. Ativa no movimento desde 1985, ela começou a frequentar rodas de break quando a presença de mulheres não era muito bem-vinda. 

“A roda abria, eu queria entrar na roda e os caras ficavam com o braço travado. Eu ia empurrando, porque eu queria olhar o movimento, acompanhar aquele movimento. Tinha que fazer que nem o metrô: empurrar pra poder entrar, recorda.

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A rapper conta ainda sobre como foi o seu processo de empoderamento, importante, também, para a sua vivência dentro da música.

"Em 90, quando eu me descubro uma mulher feminista, eu começo a falar do universo feminino, de várias formas: a mulher na sociedade, a mulher e questões de violência doméstica, a mulher empoderada. Essa coisa de podemos estar em qualquer lugar”, contextualiza a rapper.

Hoje as mulheres estão em peso no rap, e não para por aí: também há espaço para artistas LGBTQIA+ e indígenas. É o caso do Brô MCs, grupo formado por quatro jovens Guarani-Kaiowá de Dourados, no Mato Grosso do Sul. 

Bruno Veron, um dos integrantes, conta que eles começaram a ouvir rap ainda crianças, em um programa da rádio local. 

“A gente fazia um círculo em volta do rádio e ficava ouvindo com os amigos tomando tereré. Quando eu comecei a prestar atenção nas letras, o que queria dizer nas letras, eu entendi que falava da sua realidade, falava da sua quebrada. A mídia local sempre falava mal do indígena: 'ah, o indígena não presta, é vagabundo'. Mas eu via como era a situação aqui dentro, não era o que a mídia falava do povo Guarani-Kaiowá. E isso me levou a fazer rap, isso me indignou”, conta.


Brô MC's: o rap é uma ferramenta para denunciar preconceito e mostrar a realidade do povo Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul / Brô MC's

Da aldeia no Mato Grosso do Sul, para Porto Alegre. A capital gaúcha vai abrigar o primeiro museu voltado ao hip hop da América Latina. Com previsão de abertura para maio de 2022, o Museu da Cultura Hip Hop RS vai ocupar um antigo complexo escolar abandonado.

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Rafa Rafuagi, que faz parte da coordenação do museu, conta que a ideia é reunir um acervo que conte a história do movimento no estado desde os primórdios, nos anos 1980. 

“É muito interessante o que a gente tem visto: o diálogo entre o Gê Powers, que tem 65 anos, e a Aretha [Ramos], que tem 20 e poucos, é uma menina do hip hop daqui. Realmente é uma troca muito genuína. A gente imagina que o exemplo que o Museu da Cultura Hip Hop do Rio Grande do Sul tá dando é realmente fazer com que outros estados se motivem. Pra fazer com que, numa perspectiva muito otimista, nos próximos 5 anos possivelmente, a gente consiga estar em conjunto criando um museu nacional da cultura hip hop”, afirma Rafuagi.

Para o pesquisador Arthur Dantas, autor de um livro que analisa o disco Sobrevivendo no Inferno, dos Racionais MCs, o grupo teve um papel fundamental para o rap nacional ter o destaque de hoje. Ele aponta que o momento atual é marcado pela pluralidade e pelo sucesso comercial. 

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“O rap tá virando uma música pop, como é nos Estados Unidos. A música pop estadunidense é o rap. Aqui no Brasil, o rap está começando a ganhar feições de música pop. É só olhar os números do Spotify, por exemplo, de artistas mais ouvidos. A maior parte é artista de rap competindo com artista de sertanejo universitário”, ressalta.

Edição: Letícia Viola