PANDORA PAPERS

"Dólar alto é bom": falas de Guedes coincidem com variação cambial que lhe garantiu lucro

Gráfico mostra que declarações polêmicas de ministro da Economia antecederam alta do dólar; variação beneficiou offshore

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Falas não guardam relação com alta do dólar, mas apontam possível conflito de interesses - Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

Desde o início do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em janeiro de 2019, o ministro da Economia, Paulo Guedes, ganhou, no mínimo, R$ 14 milhões apenas com a variação cambial em sua empresa offshore aberta em um paraíso fiscal, revelada pelo Pandora Papers.

Um levantamento do cientista de dados e jornalista Marcelo Soares, da Lagom Data, mostra que declarações do ministro coincidiram com a alta do dólar, o que beneficiou seu patrimônio no exterior. As falas não guardam relação direta com a variação cambial, mas apontam um possível conflito de interesse.

"As frases na linha do tempo apenas coletam declarações em que ele menciona o nível de câmbio, não implicando relação direta com os aumentos", pondera Soares. O jornalista, no entanto, aponta que, "como o mercado financeiro trabalha com expectativas de futuro, declaração de autoridades econômicas costumam ser levadas em conta no cálculo dos investidores". 

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O pesquisador escolheu três declarações feitas pelo ministro sobre a alta do dólar e cruzou a data das frases com as oscilações cambiais. Leia o infográfico:


Infográfico publicado pelo jornalista Marcelo Soares / Lagom Data

Segundo os documentos, Guedes criou a Dreadnoughts International Group em 2014, nas Ilhas Virgens Britânicas. Naquele ano possuía pelo menos 8 milhões de dólares investidos na companhia, registrada em seu nome e nos de sua mulher, Maria Cristina Bolívar Drumond Guedes, e filha, Paula Drumond Guedes. Esse número subiu para 9,5 milhões de dólares no ano seguinte, segundo os documentos.

O cálculo do valor que lucrou com as oscilações do câmbio desconsidera a possibilidade de o ministro ter enviado dinheiro à empresa no exterior depois do início do mandato de Bolsonaro. Caso isso não tenha ocorrido, a alta dólar garantiu ao ministro cerca de R$ 14 mil por dia desde que assumiu o cargo.

O nome de Guedes veio à tona em reportagem publicada no domingo (3), projeto do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), formado por mais de 600 repórteres de 151 veículos em 117 países e territórios.

O Pandora Papers investigou milhões de documentos de paraísos fiscais em todo o mundo. No Brasil, participaram da apuração a Agência Pública, revista Piauí e os sites do Poder360 e Metrópoles.

Normas do serviço público indicam que o ministro teria desrespeitado os procedimentos demandados de altos funcionários do governo federal –o que ele nega.

Oposição protesta

Para o líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), trata-se de um “escândalo gravíssimo”.

“Viola frontalmente o artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal e, portanto, deveria levar à demissão do Ministro. Nós, da oposição, vamos propor a convocação do Ministro e do presidente do Banco Central para prestar esclarecimentos à Câmara dos Deputados e entrar com representação no Ministério Público Federal (primeira instância) por improbidade administrativa contra ambos.”

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O líder da bancada do PT na Câmara, deputado Bohn Gass (PT-RS), também se manifestou. Por meio de sua conta no Twitter, disse que “não é coincidência".

"Paulo Guedes, ministro da Economia, Campos Neto, presidente do Banco Central, têm off shores em paraíso fiscal do Caribe”, postou.

E chamou atenção para o fato de empresários apoiadores de Jair Bolsonaro, Otávio Fakhoury e Marcos Bellizia, investigados por financiar a propagação de notícias falsas, também lucrarem com essas empresas abertas em outros países sem pagar impostos.

Edição: Leandro Melito