É o caminho do esperançar que decidimos trilhar
No centenário do educador popular Paulo Freire, a metodologia de organização popular que ele sistematizou como pedagogia do oprimido, a partir de diálogos em círculos de cultura durante anos de trabalhos de base e alfabetização, tem animado e se reinventado no processo formativo do curso “Trabalho de base é Educação Popular”, realizado pela Escola Nacional Paulo Freire, Campanha Periferia Viva e Escola Nacional Florestan Fernandes junto a diversos movimentos populares.
Fruto de várias ações de solidariedade, que se fizeram emergenciais diante da crise econômica e da fome que assolam o povo brasileiro agudamente em tempos de pandemia, esse processo de diálogo reúne mais de 200 militantes para refletir sobre as práticas de trabalho de base no meio urbano, buscando aprofundá-las e fazê-las mais eficazes.
Para isso, a sistematização dos trabalhos de base em curso é um momento essencial e tema principal desse processo, iniciado em agosto deste ano, e que segue até dezembro na primeira etapa formativa.
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Mas, o que compreendemos por sistematização de trabalhos de base?
A sistematização é o momento de interpretação crítica e coletiva de uma ou de várias experiências com o povo. É o tempo de respiro para educadoras e educadores assentarem as variadas memórias dos encontros com o povo – as falas, os sentimentos, os estranhamentos, as lutas. A partir do registro das atividades no trabalho de base (seja uma reunião com famílias, ou uma ação de solidariedade para arrumar uma horta ou para organizar uma biblioteca comunitária e etc), é preciso organizar e reler criticamente o significado dessas ações, para destacar como e porque aconteceram e estão acontecendo dessa forma. Sistematizar experiências de trabalho de base é teorizar a partir de nossas práticas, como fez Paulo Freire em todas as suas obras.
O processo de sistematização que estamos desenvolvendo junto com a militância, busca produzir em nível nacional uma interpretação crítica do desenvolvimento da política de solidariedade concebida como ativa, orgânica e popular. É momento de reflexão para assentar um chão comum para diferentes ações de inserção e vinculação de trabalho de base voltado para a construção de força social, nas grandes periferias urbanas, fortalecendo a formação de Agentes Populares.
O desafio de ler e compreender o que temos construído no cotidiano do trabalho de base em nossos territórios é parte do que compreendemos por Educação Popular. Portanto, buscamos refletir, teorizar e sistematizar as nossas práticas de vinculação popular nas periferias das grandes e médias cidades, extraindo elementos locais, com força de princípios e de unidade nacional, que darão condições para a construção de um processo consciente e crítico de mobilização e construção de força social e política.
Para isso, queremos colocar em diálogo pessoas que vivem o trabalho de base como um processo mútuo de aprendizagens, de troca de saberes, que parte dos problemas concretos do povo, busca compreender a lógica de como o povo pensa, reage e age, em uma dinâmica processual e contínua, que reúne formação, organização e lutas com o objetivo estratégico de transformação da sociedade.
A metodologia deste processo de sistematização é estruturada nos momentos de formação coletiva nacional, tendo como ponto de partida principalmente as sínteses elaboradas a partir da realidade dos trabalhos de base, e nos momentos do tempo comunidade, em que a turma deve voltar aos seus territórios de ação munidas com os elementos da análise e formação coletiva, para assim aprofundar ainda mais as sínteses elaboradas em cada um desses momentos nacionais do curso.
A militância participante desse processo está organizada em Núcleos de Base, o principal espaço de animação e convivência para a construção desta formação, um espaço em que reunimos experiências semelhantes acontecendo em diferentes territórios, para encontrar elementos comuns, de caráter nacional, revelados a partir da análise coletiva dos trabalhos de base sendo realizados.
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Esse processo formativo em que estamos imersos está em sintonia com o esforço urgente de atualizar o método de Trabalho de Base, compreendido como Educação Popular, em que o povo é sujeito de seu processo histórico. Nos anima saber que outras forças populares também se mobilizam nesse sentido, se desafiando a amadurecer a mística da narrativa da história popular de resistências, de solidariedades, de uma inteligência da sobrevivência que eleve a estima do nosso povo como sujeito político na luta por assumir nas próprias mãos o destino do Brasil, amadurecendo a compreensão coletiva da concepção de que trabalho de base é educação popular.
Diante do enfrentamento histórico que fazemos para construir uma nação sem opressão e sem oprimidos, é o caminho do esperançar que decidimos trilhar: aprender a teorizar e sistematizar as práticas de inserção, vinculação, enraizamento e organização popular nas periferias urbanas, atualizando as leituras da realidade, sistematizando princípios e sínteses de unidade nacional que dão lastro à construção de força social e política com o horizonte do Projeto Popular para o Brasil.
*Texto escrito pela Comissão Político Pedagógica do curso Trabalho de Base é Educação Popular, realizado pela Escola Nacional Paulo Freire, Campanha Periferia Viva e Escola Nacional Florestan Fernandes.
**O Periferia Viva nasce como resposta ao governo genocida com sua política de morte que nos deixou a própria sorte em uma pandemia. A ideia é conectar iniciativas, campanhas e demandas da sociedade que podem contribuir e fortalecer essa rede de solidariedade. Leia outros textos.
***Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Vivian Virissimo