A política monetária empreendida pelo Banco Central para lidar com crise errou
A política monetária empreendida pelo Banco Central para lidar com crise errou e está sendo equivocada do início ao fim. Ao contrário do apregoado, o recente patamar mais baixo de juros nominais da história brasileira – que chegou a 2% ao ano no período mais dramático da pandemia – não se deve a âncora fiscal do teto de gastos, nem mesmo as tais reformas estruturais, como a trabalhista e a previdenciária.
A taxa básica de juros chegou ao menor patamar histórico não ancorada na “saúde” de uma economia que caminha para equilibrar as contas públicas mediante a restrição do gasto público, mas sim como atestado de uma “doença”, leia-se: uma economia que não decola e que vive de crises seguidas de semi-estagnação.
Portanto, reduzir o custo mediante derrubada dos juros era condição inconteste de uma economia que amarga em uma profunda crise, não somente com redução do consumo mas, sobretudo, do investimento.
No entanto, a redução drástica dos juros – dentro de um padrão de desregulação quase completa das contas de capitais e em um período de profunda crise e incerteza internacional – não parece ter sido a estratégia mais sensata.
Como já nos alertava Keynes: em períodos de normalidade a política monetária desempenha um papel crucial no que tange a manutenção das expectativas e no incentivo ao investimento, quando compara-se a taxa de retorno do investimento produtivo e a o patamar de rentabilidade de aplicações financeira medida pela taxa básica de juros.
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Porém, em períodos de crises – que nesse momento são, fundamentalmente, de demanda agregada, a política monetária perde poder de determinação do investimento, uma vez que a taxa de juros pode estar a “zero” que ainda assim não será um estímulo substancial ao investimento, uma vez que ele depende menos do custo de crédito e mais da realização do valor, que está condicionado a um mercado consumidor com renda disponível para o consumo.
Nesse sentido, é via política fiscal, com expansão do gasto público – mesmo que deficitário – que se sustenta o nível de atividade. A reposta do Banco Central, somada a contração do gasto público foi substancialmente a redução do diferencial de juros na comparação internacional e o aguçamento da fuga de capitais.
Em outras palavras: inflação de custos, pela desvalorização do real que, em grande medida, deveu-se a juros extremamente baixos. Ou seja, a política monetária não somente não cumpriu seu desígnio quanto aprofundou a crise para os mais pobres, que passaram a conviver com uma inflação muito mais elevada justamente naquilo que ocupa quase a totalidade da sua renda, que são as mercadorias e, dentre elas, especialmente os alimentos.
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Frente ao cenário de avanço da inflação de custos, somou-se mais uma ação desmedida do governo federal, expressa pela política de preços da Petrobrás e o tarifaço na conta de luz.
O aumento substancial desses preços administrados é o responsável por a inflação medida pelo IPCA estar chegando aos dois dígitos nos cumulado dos últimos 12 meses e já ter passado dos 10% quando se refere a inflação medida pelo INPC, que é o indicador mais sensível as baixas rendas.
Frente ao aumento da inflação – de responsabilidade do Banco Central, num primeiro momento, e dos preços administrados em um segundo momento – o remédio para conter a escalada inflacionária não poderia ser mais estúpido: aumentar aceleradamente a taxa básica de juros, justamente no período em que, com a relativa volta da normalidade, os fluxos de capitais já daria conta de apreciar, novamente, a nossa moeda. O “time” está totalmente equivocado.
Recentemente o presidente do Banco Central do Brasil, Campos Neto, apontou que é, justamente, a política de preços da Petrobrás que mais têm comprometido a capacidade de manter a inflação no teto da meta.
No entanto, em que pese o diagnóstico correto, o remédio segue sendo um choque de juros, o que claramente não tem mais resultado sobre o nível de preços (basta ver como aumenta a inflação concomitantemente aumentam os juros), tendo efeitos apenas sobre o nível de atividade econômica e o encarecimento da rolagem da dívida pública.
*Juliane Furno é Doutora em Desenvolvimento Econômico pela Unicamp, assessora parlamentar da Câmara Federal e militante do Levante Popular da Juventude e da Consulta Popular. Leia outros textos
*Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Anelize Moreira