A violência sexual se mostra presente na vida de um significativo percentual de meninos e meninas que frequentam escola. Dentre as meninas, uma em cada cinco adolescentes (20,1%) de 13 a 17 anos diz já ter sido tocada, manipulada, beijada ou ter tido partes do corpo expostas contra a sua vontade. E 8,8% das meninas nessa idade já foram forçadas ao sexo, a maioria antes dos 14 anos.
Os garotos também são alvos desse tipo de violência, mas em percentuais bem menores. Os agressores costumam ser pessoas próximas às vítimas. Além disso, o contexto socioeconômico pode determinar onde cada tipo de agressão é mais comum, sendo que os índices de importunação sexual são mais altos dentre alunos da rede privada e os de estupro dentre os da pública.
Esses são alguns dos dados obtidos pela Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) 2019, que entrevistou escolares dessa faixa etária em todo o Brasil sobre diversos temas, que vão desde os hábitos e a saúde até a autoimagem e a saúde mental. O método de coleta de informação da PeNSE, por meio de um dispositivo móvel utilizado pelo próprio adolescente, garante o anonimato e a individualidade de quem responde, de modo que os estudantes fiquem com menos receio de responder sobre temas sensíveis.
:: Governador de NY pode ser o primeiro político de alto escalão dos EUA a ser punido por assédio ::
“Dessa forma conseguimos captar melhor as informações sobre casos de violência sexual que, normalmente, não chegam a ser reportados a nenhuma autoridade ou figura de autoridade, principalmente no caso de menores de 18 anos, que, em geral, não sabem a quem recorrer”, comenta Cristiane Soares, uma das analistas da PeNSE.
No geral, 14,6% dos estudantes de 13 a 17 anos narraram já terem sofrido algum tipo de violência sexual pelo menos uma vez na vida. Mas o percentual entre as meninas (20,1%) foi mais que o dobro do observado entre os meninos (9,0%). E na rede privada houve mais relatos desse tipo de violência (16,3%) do que na rede pública (14,4%).
:: Violência contra mulheres e meninas no campo sangram territórios tradicionais ::
“É preciso estar atento. Muitas vezes caracterizado como “brincadeira”, a importunação ou assédio sexual pode assumir contornos de estupro e levar as vítimas ao medo e ao abandono escolar, por exemplo. Esse tipo de violência pode ter várias consequências para os jovens, podendo criar uma cultura permissiva quando tais atos não são vistos como sérios e passíveis de punição”, ressalta Cristiane Soares.
Entre os principais agressores os adolescentes apontaram o namorado ou namorada (29,1%), amigos (24,8%), pessoas desconhecidas (20,7%), outros familiares (16,4%) e pai, mãe ou responsável (6,3%). Considerando que os casos de violência sexual podem ter ocorrido mais de uma vez e, inclusive, sido praticados por pessoas diferentes, os escolares puderam identificar mais de um autor no questionário.
“Ao se pensar em políticas públicas para ajudar esses adolescentes, é preciso estar muito atento ao fato de que os agressores, grande parte das vezes, são pessoas do ambiente doméstico das vítimas ou pessoas com quem elas têm relação de afetividade. Isso provoca um sentimento de desamparo e de não ter a quem recorrer. O adolescente sente que não tem com quem falar sobre o que está acontecendo com ele”, alerta Cristiane Soares, que destaca, nesse sentido, a importância das políticas públicas de escuta, acolhimento, acompanhamento e orientação. “A culpabilização afeta social e emocionalmente essas pessoas”, complementa.
Leia mais: Lei Maria da Penha completa 15 anos, e ainda carece de esforços para ser cumprida efetivamente
Além disso, 6,3% dos adolescentes disseram já terem sido obrigados a ter relações sexuais contra a sua vontade. E mais uma vez as meninas se mostraram o principal alvo dos agressores: 8,8% disseram já terem sido forçadas, frente a um percentual de 3,6% para os meninos. A ocorrência foi mais alta entre os estudantes da rede pública (6,5%, frente a 4,9% na rede privada).
Um dado ainda mais alarmante foi que, em 68,2% dos casos desse tipo de violência, o aluno tinha 13 anos ou menos quando foi forçado. Namorado ou namorada foram apontados como os principais autores (26,1%), seguido por outro familiar (22,4%). Mas pessoa desconhecida (19,2%), amigo (17,7%), outra pessoa além das relacionadas (14,7%) e pai, mãe ou responsável (10,1%) tiveram percentuais também relevantes.
Agressão física é mais alta dentro de casa do que fora dela
Os demais tipos de agressão física parecem ser mais comuns em casa. Pelo menos 21,0% dos adolescentes de 13 a 17 anos afirmaram terem sido agredidos pelo pai, mãe ou responsável alguma vez nos doze meses anteriores à pesquisa. Mais escolares de 13 a 15 anos afirmaram terem sofrido esse tipo de agressão (23,0%), enquanto no grupo etário de 16 a 17 anos o percentual foi menor (17,3%).
“Vale ressaltar que o questionário da PeNSE não leva em conta se foi um corretivo leve ou grave por uma atitude inadequada ou se foi o que chamamos de violência gratuita, mas sim o sentimento em relação àquela agressão, se o adolescente se sentiu agredido e desprotegido pela pessoa que deveria protegê-lo”, ressalta Cristiane Soares.
E foram também as meninas que mais relataram esse tipo de agressão (22,1%, contra 19,9% dos meninos). Quanto ao contexto socioeconômico, foram os estudantes da rede privada que mais afirmaram terem sido agredidos pelo responsável (23,6%, contra 20,6% no ensino público).
:: Organizações do RS lançam guia sobre aborto legal e prevenção à violência sexual ::
Por outro lado, a agressão física perpetrada por outra pessoa que não seja o pai, mãe ou responsável foi apontada por 13,2% dos escolares. E mais uma vez os estudantes da rede privada foram os que mais reportaram esse tipo de agressão (16,4%, contra 12,7% na rede pública).
Sendo que, na maior parte das vezes, os agressores são amigos (48,2%) ou outros familiares (17,6%). Mas também pode ser outra pessoa (15,8%), namorado (12,3%) ou desconhecido (11,7%). Além disso, houve relatos de violência policial (7,0%) ou, em casos mais raros, efetuada por algum funcionário da escola (1,7%).