Em declaração dada no início da tarde desta quarta-feira (8), o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), frustrou quem esperava a abertura de um dos mais de 120 processos de impeachment que repousam em sua gaveta.
Mandou um recado a Bolsonaro ao dizer que não poderia admitir “questionamentos sobre decisões tomadas e superadas como o voto impresso”, mas propôs trabalhar para o Legislativo ser uma “ponte de pacificação” entre Executivo e o Judiciário.
Ele chamou a atenção para o fato de o Brasil “ter problemas reais” como inflação e que a crise seria “superdimensionada” nas redes sociais. Elogiou ainda os brasileiros “que foram às ruas de modo pacífico”.
“Bravatas em redes sociais, vídeos e um eterno palanque deixaram de ser um elemento virtual e passaram a impactar o dia a dia do Brasil de verdade. O Brasil que vê a gasolina chegar a R$ 7 reais, o dólar valorizado em excesso e a redução de expectativas. Uma crise que, infelizmente, é superdimensionada pelas redes sociais, que apesar de amplificar a democracia estimula incitações e excessos”, disse.
Em sua fala, Arthur Lira não mencionou as ameaças de Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF) feitas ontem. Na sua participação em ato antidemocrático realizado em Brasília, o presidente atacou o Supremo Tribunal Federal e o ministro Luiz Fux.
“Ou o chefe desse poder (Fux) enquadra seu ministro, ou esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos”, disse. Já no ato de São Paulo, o presidente da República reforçou que não cumpriria determinação judicial do ministro Alexandre de Moraes, se dirigindo a ele como “canalha”.
Indiretas
Também pode-se entender na falar de Lira um recado ao próprio Supremo. “Vou seguir defendendo o direito dos parlamentares à livre expressão – e a nossa prerrogativa de puni-los internamente se a Casa com sua soberania e independência entender que cruzaram a linha”, afirmou, o que pode ser uma referência à prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ).
O presidente da Câmara tem a prerrogativa de pautar a abertura de um processo de impeachment de Bolsonaro e não havia se manifestado até agora sobre as declarações dadas nas manifestações do 7 de Setembro por Bolsonaro.
Pressão sobre Arthur Lira
“Lira diz em pronunciamento que a Câmara não deixou de cumprir seu papel e que a crise é superdimensionada nas redes sociais e na imprensa. Em que planeta ele vive? Impeachment já!”, reagiu a deputada federal Fernanda Melchionna (Psol-RS), após o pronunciamento.
Nas redes sociais, o presidente da Câmara vem sendo bastante questionado por personalidades do mundo político desde ontem. “Hoje, mais do que nunca, é dia de reforçar a lembrança do deputado Arthur Lira para que ele abra o processo de impeachment. O Brasil não pode aguentar até 2022!”, postou o líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) Guilherme Boulos.
Colegas de Casa também exigiram um posicionamento do presidente da Câmara. “Arthur Lira, não adianta ficar em silêncio e agir como avestruz. O discurso golpista de Bolsonaro contra a democracia e as instituições exige que o impeachment seja pautado imediatamente!”, publicou ontem a deputada federal Erika Kokay (PT-DF).
Reações
O teólogo Leonardo Boff lembrou de uma declaração anterior do parlamentar para cobrá-lo. “O presidente da Câmara Arthur Lira havia estabelecido como critério para tirar um pedido de impeachment a Bolsonaro se houvesse algum fato novo. Creio que no dia 7 de setembro veio a gota d’água. Se esse não for o fato novo, não saberia que fato poderia ser novo”, publicou, em seu perfil no Twitter.
Em entrevista ao Jornal Brasil Atual, a advogada, historiadora, pesquisadora e integrante da coordenação-executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Tânia Oliveira, também cobrou uma reação das instituições para frear um processo “golpista” que, garante, “ficou absolutamente claro no dia de ontem pela boca do presidente”.
Para a jurista, a resposta pode vir por meio da abertura de um processo de impeachment pelo Legislativo ou mesmo na cassação da chapa Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão por conta da ocorrência de crimes na eleição de 2018 pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).