Cerca de 4 mil mulheres de 150 povos originários começam a desembarcar em Brasília nesta terça-feira (7), Dia da Independência, para participar da Segunda Marcha das Mulheres Indígenas, prevista para terminar no sábado (11).
No feriado, a capital federal é palco de manifestações pró e contra o governo de Jair Bolsonaro (sem partido). Os atos devem começar, respectivamente, na Esplanada dos Ministérios e no estacionamento da Torre de TV, com acompanhamento da Polícia Militar (PM).
Temendo ataques de bolsonaristas e defensores da política anti-indígena conduzida pelo governo federal, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que organiza a mobilização, aderiu ao esquema de segurança proposto pela Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF).
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“Não vou generalizar, mas são pessoas que têm demonstrado um ódio muito fluido, que não têm escrúpulos em nos atingir. Então a gente vai se resguardar de uma agenda de violência que está anunciada”, afirma, referindo-se a partidários de Bolsonaro, Christiane Julião, do povo Pankararu de Pernambuco, uma das organizadoras da Marcha.
Neutralidade
O acampamento indígena foi transferido da Praça da Cidadania para o prédio da Funarte. Ao longo do dia, a prioridade das lideranças será recepcionar as caravanas vindas de várias regiões do país, sem se envolver com os protestos.
“É claro que fica o medo, a insegurança. Mas mesmo assim a gente está aqui firme. Acreditando no nosso propósito de lutar por aqueles que nos antecederam, garantiram nossos territórios. A gente continua nessa luta, cobrando essa dívida histórica no Brasil”, afirma Christiane.
Segundo a liderança, a orientação para as mulheres indígenas é não interagir com as manifestações. “Por mais que todo mundo saiba que somos contra Bolsonaro, nós não vamos fazer eco a movimento algum, nem pró nem contra o governo”, explica.
Contra o “marco temporal”
Com o tema "Mulheres originárias: Reflorestando mentes para a cura da Terra”, a marcha também tem por objetivo manter a estratégia de sensibilizar o Supremo Tribunal Federal (STF).
A partir de quarta-feira (8), a Corte volta a julgar o “marco temporal”, tese jurídica defendida por Bolsonaro que impede indígenas de reivindicarem terras não ocupadas até a data da promulgação da Constituição Federal de 1988, restringindo processos de demarcação.
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"Caso a tese seja referendada, teremos a paralisação das demarcações e certamente pedidos de revisões de terras já demarcadas", explica Paloma Gomes, assessora jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
"Nós teremos ainda mais a ausência de políticas públicas destinadas aos indígenas, teremos mais violência, mais expulsões dos povos originários. Enfim, um processo de absoluto extermínio da cultura e dos povos indígenas no nosso pais", complementa a advogada.
As manifestantes se juntarão aos cerca de mil indígenas remanescentes do acampamento “Luta Pela Vida”, que teve início em 22 de agosto e chegou a reunir 6 mil pessoas. Segundo a Apib, que organizou o evento, foi a maior mobilização indígena da história do Brasil.
“Qual independência?”
Sob fogo-cerrado do governo federal, que promove ataques por múltiplas frentes contra os indígenas denunciados por lideranças no Brasil e no exterior, Christiane, organizadora da marcha, diz que os povos originários não têm muito a celebrar no Dia da Independência.
“Eu não sei qual independência o Brasil busca, se vive numa represa colonialista, represado psicologicamente e afetuosamente num sistema patriarcal e não sabem o que é realmente liberdade. Não sabem”, opina a liderança indígena.
Edição: Leandro Melito