Das 106 universidades públicas espalhadas pelo país, 67 federais e 39 estaduais, apenas 20%, oferecem cotas para ingresso de quilombolas. Essas instituições de ensino superior que oferecem cotas estão concentradas em apenas oito estados, dos 27 da federação. São eles: Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Pará, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins.
Os dados são do levantamento feito pelo Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa), ligado ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ), com informações disponíveis até 2019. Ao todo as universidades públicas comportam até 384 mil alunos. Desse total, apenas 2.035 vagas são entregues aos quilombolas, ou 0,52%, aponta a entidade.
No Brasil não há uma legislação que obrigue as universidades públicas a reservarem vagas por cotas a população quilombola. As instituições que adotaram essa política afirmativa, o fizeram provocando alterações em seu regimento interno, como explica o pesquisador Jefferson Belarmino de Freitas, um dos responsáveis pelo levantamento do Gemaa.
“Isso significa que o corpo diretivo dessas instituições é mais progressista e flexível às demandas quilombolas. Outro fator importante, é que observamos que o número maior de vagas ocorre em estados onde essa população está mais organizada”, aponta Freitas, doutor em sociologia pelo IESP-UERJ.
Em números absolutos, as universidades da Bahia são as que oferecem mais vagas aos quilombolas, 599. Em seguida, Pará, 482, e Goiânia, 421. Foi justamente em território baiano que ocorreu a primeira política específica para os quilombos, em 2005, na Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Porém, cruzando o número total de vagas ofertadas por cotas e a quantidade disponibilizada aos quilombolas dentro desse grupo, a Bahia cai para o quatro lugar no país, com apenas 2,3%. Em primeiro, está o Tocantins (4,5%), depois Goiás (3,4%) e o Pará (2,8%).
Vergonha sudestina
Biko Rodrigues, articulador nacional da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), lamentou e confirmou os dados.
“Seria importante que as cotas fossem estendidas para todo o país. Alguns estados estão puxando a dianteira, como Pará e Tocantins, percebemos isso nos territórios. Mas ainda está muito longe da realidade do nosso povo. Em São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, onde temos uma presença grande de quilombolas, a realidade é muito ruim, não acessamos as universidades.”, explica.
Os fluminenses abrigam 31.354 estudantes em suas universidades federais e estaduais, sendo 15.447, ou 49%, para cotistas. No entanto, nenhuma dessas reservas foram destinadas à população oriunda dos quilombos.
Entre os 29.856 estudantes das universidades federais e estaduais de São Paulo, 11.669, ou 39%, são cotistas. Assim como ocorre no Rio de Janeiro, não há políticas afirmativas para os quilombolas.
O Nordeste (706) é a região brasileira com maior número de vagas destinadas aos quilombolas, seguida pelo Norte (671), Centro-Oeste (626), Sul (32) e por último, o Sudeste, que não possui processos para ingresso da população oriunda de quilombos em suas universidades públicas.
No texto do estudo, o corpo de pesquisadores faz ressalvas sobre a necessidade da distinção das vagas oferecidas aos diversos grupos e porque não seria conveniente supor que os quilombolas estariam incluídos nas cotas raciais.
“A adoção de conteúdos didáticos que façam parte do modo de vida das comunidades quilombolas é uma demanda de militantes e intelectuais que atuam na causa quilombola. Muitas vezes esposando uma perspectiva decolonial, tais agentes ressaltam que a realidade quilombola não pode ser inteiramente submetida a sistemas ocidentais e (falsamente) universalistas de conhecimento”, conclui o estudo.
Edição: Anelize Moreira