Nem a população idosa e adulta acima de 50 anos está completamente vacinada
Por Helena Dias e Paulette Cavalcanti*
Analisando os dados sobre a vacinação contra a covid-19 no Brasil, observa-se que cerca de 45 milhões de pessoas estão completamente vacinadas com uma ou duas doses dos imunizantes. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, as pessoas com mais de 60 anos representavam 15,7% da população, enquanto as com idade entre 50 e 59 anos correspondiam a 12,4%.
Juntos, esses números representam cerca de 60 milhões de pessoas e, se comparados com os dados de vacinação, demonstram que nem a população idosa e adulta acima de 50 anos está completamente vacinada.
Com a ausência dos serviços básicos de saúde, de acesso à internet e informação de qualidade, a maioria dessas pessoas dessa faixa etária que não foram vacinadas podem estar nas periferias brasileiras.
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É o exemplo do estudo Avanço na pandemia X Vacinação da Covid-19 no Recife, realizado pelo mandato do vereador da capital pernambucana, Ivan Moraes (PSOL), que traz um panorama da vacinação na cidade e propõe algumas medidas de urgência para a população em situação de vulnerabilidade social.
Segundo o estudo, os postos de vacinação do Recife não foram posicionados de acordo com as maiores taxas de letalidade pela covid-19 e os pontos localizados nas regiões de morro da cidade, com menores taxas de renda mensal por domicílio, têm estruturas menores quando comparados aos de outras regiões.
Os bairros Linha do Tiro, Fundão, Rosarinho, Dois Unidos, Porto Madeira, Mustardinha, Peixinhos, Cidade Universitária, San Martin e Sancho lideram o ranking de maior taxa de letalidade, na ordem da esquerda para a direita. São, em sua maioria, bairros periféricos.
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Contrapondo o ranking com a localização dos postos de vacinação, é possível constatar que um bairro como o Barro, localizado na periferia do Recife e que está na 13ª posição com 50,6% no índice de letalidade, não tem um ponto de vacinação próximo. Já em Boa Viagem, na Zona Sul e ocupando a posição 63ª no ranking, é o bairro mais vacinado.
Na cidade de São Paulo, a situação não é diferente. No dia 21 de julho, pesquisadores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP) divulgaram um estudo que mostra a desigualdade no processo de vacinação nas diferentes regiões da Grande São Paulo.
Comunidades em maior situação de vulnerabilidade tinham menor número de pessoas vacinadas na faixa entre 40 a 49 anos quando comparadas aos bairros mais ricos e aos centros, no mesmo período em que o estado de São Paulo e a capital já vacinavam pessoas abaixo dessa faixa etária.
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Levando em consideração que a expectativa de vida das populações mais abastadas é maior, o critério de faixas etárias para o processo de vacinação acaba por aprofundar a desigualdade, segundo pesquisadores do LAB Cidade – USP. Enquanto o bairro de Cidade Tiradentes tinha imunizado menos de 30% da população, a Sé, localizada no centro da capital, registrava quase 100%.
Mutirão de Luta pela Vacinação
Muitas vezes, essas comunidades da periferia são consideradas “descobertas”. Isto é, não têm uma Unidade de Saúde da Família (USF) ou Agente Comunitário responsável pelo seu território.
Nestas e em muitas outras situações, as USFs não estão localizadas próximas às comunidades, o que gera dificuldade de acesso para além das exigências como a obrigatoriedade de ter um comprovante de residência ou ter que marcar uma consulta como condição para agendar a vacina.
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Situações como as citadas acima afastam as pessoas das comunidades periféricas do processo de vacinação. Geralmente, são pessoas que trabalham de oito a doze horas por dia ou mais. Muitas delas se convencem de que a vacina não é para elas, de que não querem tomar, ou ainda de que não precisam porque são fortes e sadias.
Diante disso, a Periferia Viva, por meio dos Agentes Populares de Saúde (APS), tem atuado intensamente para desconstruir essas crenças reforçadas pela ausência do Estado em meio à pandemia, fazendo com que as pessoas agendem sua vacinação e acreditem na ciência e no Sistema Único de Saúde (SUS).
Neste mês de agosto, foi lançado o Mutirão de Luta pela Vacinação da campanha, que tem como objetivo mobilizar os APS para identificar pessoas não vacinadas, convencê-las a se vacinar e agendar a vacina pelo aplicativo ou outra plataforma definida por cada cidade.
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Os dados desse processo serão sistematizados pelas organizações políticas envolvidas para basear a discussão sobre equidade no processo de vacinação contra a covid-19 e de outros imunizantes, como é o caso da vacina contra a gripe.
A Periferia Viva está presente em comunidades de muitas cidades do Brasil. Na maioria das atividades desenvolvidas, é possível encontrar pessoas idosas que não conseguiram marcar suas vacinas. Quando questionados, os representantes e até profissionais dos serviços de saúde das cidades respondem: “É só ir ali no posto que agendamos a sua vacinação”. Mas, como visto nessa coluna, a realidade não é bem assim.
Por isso, é preciso estar em mutirão de luta. A periferia quer viver!
Nós queremos a Periferia Viva: Vacina para todos!
*Helena Dias e Paulette Cavalcanti compõem a Coordenação da Campanha Periferia Viva
**O Periferia Viva nasce como resposta ao governo genocida com sua política de morte que nos deixou a própria sorte em uma pandemia. A ideia é conectar iniciativas, campanhas e demandas da sociedade que podem contribuir e fortalecer essa rede de solidariedade. Leia outros textos.
***Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Leandro Melito