Na Cidade de Deus, favela localizada na Zona Oeste do Rio de Janeiro, a pandemia teve impactos não só nos adoecimentos e mortes causadas pela covid-19, mas também no agravamento de doenças crônicas e mentais. É o que aponta estudo do Coletivo de Pesquisa Construindo Juntos, realizado entre outubro de 2020 e março de 2021, com a participação de 648 moradores da região.
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A pesquisa mediu o impacto da pandemia na renda e trabalho, educação, crianças e adolescentes, saúde física e mental, relações familiares, resiliência social e atitudes sobre o vírus e a vacina. O coletivo responsável agrega pesquisadores de universidades brasileiras, como a Universidade Federal Fluminense (UFF), e norte-americanas, como a Tufts University.
A partir dos dados coletados e de entrevistas com moradores, os pesquisadores responsáveis pelo estudo constataram que mais pessoas faleceram por doenças crônicas e outras doenças do que com sintomas de covid na Cidade de Deus. Entre os entrevistados, foram relatadas 41 mortes por covid e 59 mortes por outras doenças entre pessoas morando nas suas casas.
Ao todo, a favela registrou 1440 casos e 163 óbitos por covid, até esta terça-feira (3), segundo dados do Painel Unificador Covid nas Favelas.
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De acordo com Mirian de Andrade, moradora e educadora da Cidade de Deus, que faz parte da equipe Construindo Juntos, isso é um indicativo de que a pandemia mascarou outros problemas de saúde que já estavam acometendo há décadas os moradores na localidade.
“Até a pandemia muitos moradores tinham dificuldades de acessar médicos, exames, tratamentos. Durante a pandemia isso se agravou, graças a falta de leitos e consultas médicas, trazendo pioras em vários outros ramos da saúde física da comunidade”, aponta.
Saúde mental
Outra conclusão apontada pelo estudo indica o agravamento de doenças de saúde mental na Cidade de Deus. Entre os entrevistados, 88% apontaram uma piora nos problemas emocionais e, entre os que tem crianças em casa, 82% apontaram que pelo menos uma delas sofreu com a mesma questão.
Para Jacob Portela, analista da Assessoria de Gestão Social de Farmanguinhos e colaborador da pesquisa, a pandemia significou uma ruptura no cotidiano das pessoas, o que explica o impacto direto na saúde mental dos moradores.
“Relatos dos moradores indicam que alguns motivos para a piora da saúde mental foram o isolamento social, preocupação sobre pagar contas, o medo de contrair o coronavírus, as mortes de familiares e pessoas próximas. Os sintomas mais relatados foram estresse, ansiedade, dificuldade para dormir e falta de ânimo para as atividades diárias”, explica.
Edição: Mariana Pitasse