MAIS RICA QUE AÇAÍ

Colheita consciente do fruto da juçara em quilombo ajuda a salvar espécie da extinção

Consumo da polpa do 'primo do açaí' se tornou alternativa sustentável à extração predatória do palmito nativo

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Cada palmeira de juçara frutifica uma vez por ano e algumas árvores dão mais de um cacho - Secretaria de Desenvolvimento Regional - SP
A juçara é superior ao açaí em vários nutrientes, como o ferro, o potássio, até o manganês

O consumo dos frutos da juçara – palmeira típica da Mata Atlântica – têm ajudado a salvá-la da extinção. O risco chegou quando o palmito dessa árvore passou a ser extraído para comercialização em massa. O corte das palmeiras, em larga escala e sem respeito ao ciclo da planta, trouxe a ameaça para a espécie. 

“Começaram a vir invasores na Mata Atlântica, cortar o palmito, fazer 'envidrado' pra vender e ela entrou em ameaça de extinção. Quando a gente entendeu isso, começou a fazer uma conscientização das pessoas sobre o quanto a juçara é mais importante em pé do que cortar e vender num pote de vidro”, explica Daniele Santos, integrante do Coletivo da Juçara do Quilombo do Campinho da Independência. 

Os frutos que não rendem polpa são lançados de volta na mata para gerar novas árvores

O quilombo fica no município de Paraty-RJ e, por lá, alguns moradores se uniram para colher os frutos, extrair e comercializar a polpa da juçara.


Coletivo do Quilombo do Campinho da Independência em Paraty-RJ se reúne para para colher os frutos, extrair e comercializar a polpa da juçara / Reprodução

Uma parte da produção fica no restaurante local e é servida como suco ou caipirinha. O restante vai para comércios da cidade ou para consumo próprio, de acordo com o desejo de quem colheu. 

No mercado, o fruto da juçara ganha cada vez mais espaço e tem como apelo a semelhança com seu primo do norte, o açaí. A cor e o sabor são, de fato, parecidos, mas as plantas têm algumas diferenças. 

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De acordo com a nutricionista Lisa Cordeiro, moradora de Paraty e apreciadora dos frutos da região, a polpa da juçara é ainda mais nutritiva que o açaí.

“A juçara é superior em vários nutrientes, como o ferro, o potássio, até o manganês. As duas são boas fontes de nutrientes, mas a juçara tem o dobro. Além disso, são alimentos que têm potencial além de nutritivo, terapêutico. Ambos os frutos têm flavonoides, que são antioxidantes e combatem os radicais livres”, avalia. 

Ronaldo Santos, que também faz parte do coletivo do Quilombo do Campinho da Independência, explica que, enquanto o açaí nasce em touceiras, com mais de uma árvore por muda, a juçara é uma planta solitária. Essa característica aumenta ainda mais o risco da sua extinção. 

A valorização dos frutos evita a derrubada da palmeira e atende ao tempo natural da espécie

No entanto, antes da ameaça, o palmito fazia parte da cultura da comunidade.  

“A gente sempre comeu juçara. Só que a nossa relação com a juçara no mato era de respeito aos ciclos. A gente nunca cortava uma árvore para extrair o palmito se não tivesse dado cacho, porque depois que dá cacho, as frutas caem, passarinho come, nascem novas árvores na mata”, lembra Ronaldo. 


Fruto da palmeira juçara, espécie nativa da Mata Atlântica está ameaçada de extinção / Fundação Florestal/ Governo de SP

Agora, o consumo do palmito está relacionado às memórias de família e dos antepassados. A valorização dos frutos evita a derrubada da palmeira e atende ao tempo natural da espécie, cuja temporada de colheita é no período de outono e inverno. 

Cada palmeira frutifica uma vez por ano e algumas árvores dão mais de um cacho.

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Na organização do Quilombo do Campinho da Independência, há os coletores, que sobem nas palmeiras para pegar os cachos e selecionam os bons frutos; e os despolpadores, que extraem a polpa.

Os frutos que não rendem polpa são lançados de volta na mata para gerar novas árvores. As sementes também retornam à terra, alimentando o ciclo natural da espécie, e a juçara permanece integrada à vida da comunidade. 

“A gente ama tomar suco de juçara, a gente ama ver os pássaros ao redor dos quintais e trazer esse equilíbrio para a fauna e para a flora”, ressalta Daniele. 

 

 

Edição: Douglas Matos