Lucro é dividido entre os acionistas, mas o passivo ambiental é dividido pelo conjunto da sociedade
A devastação da Amazônia alcançou patamares inéditos em 2021. O primeiro semestre registrou o pico da série histórica registrada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O pior mês foi abril, com 580 km² de área desmatada, um aumento de 43% em relação ao mesmo período do ano passado.
Sob a gestão Bolsonaro, não houve nenhum avanço no controle do desmatamento. A situação só piora. A entrada do Exército em 2020, com a Operação Verde Brasil 2, foi um vexame. Os militares criaram intrigas com os órgãos de fiscalização. Não contiveram a sanha do coronelato sem farda, as milícias que mandam, desmantam, invadem terras, cometem assassinatos e fazem o serviço sujo para as multinacionais do agronegócio.
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Agora o fazem enrolados na bandeira do Brasil, protegidos pela necropolítica bolsonaristas e financiados com dinheiro de bancos públicos, como o Banco do Brasil e o BNDES.
Em setembro de 2020, a coalizão internacional Forest & Finance, que investiga empresas envolvidas no desmatamento, identificou que o Banco do Brasil e o BNDES são as instituições brasileiras que mais financiam setores ligados ao desmatamento. Segundo a Repórter Brasil, que integra a coalizão, bilhões de dólares são direcionados para indústrias ligadas ao desmatamento, como a da carne bovina.
Para piorar o cenário, chega a informação de que a pandemia não conteve a sanha das multinacionais do desmatamento. Dados deste final de semestre mostram que a situação se agrava. Durante a pandemia do covid-19, segundo a Mongabay, os bancos internacionais aumentaram em US$ 8 bilhões os investimentos ligados ao desmatamento.
Durante a pandemia, entre as 50 maiores instituições financeiras internacionais que financiam grupos ligados ao desmatamento, o BNDES ficou entre as três que mais aportaram recursos em empresas predatórias. Ficou atrás de duas instituições da Malásia, tradicional foco de desmatamentos. Ficou à frente de grandes instituições norte-americanas, japoneses e coreanas.
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Na prática, tudo isso significa o seguinte: no Brasil, crime ambiental é política de governo. Política protegida pelo governo e financiada pelos bancos púbicos.
Banco do Brasil e BNDES têm sólidas normas de governança, no que diz respeito a empréstimos e financiamentos de empresas ligadas ao desmatamento. Mas não cumprem suas próprias diretrizes. E mais: financiam negócios privados que invadem terras, desmatam, matam e geram riquezas aos investidores e prejuízos à comunidade.
Nos negócios predatórios financiados pelo sistema financeiro, o lucro é dividido entre os acionistas, mas o passivo ambiental é dividido pelo conjunto da sociedade.
E assim a vida segue, um dia depois do outro. Será que muda? O que você acha?
*Marques Casara é jornalista especializado em investigação de cadeias produtivas. Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Leia outras colunas.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Vivian Virissimo