Por conta de um atraso na divulgação de um dos estudos anuais mais importantes da área, o sistema de saúde brasileiro trabalha com dados desatualizados sobre os fatores de risco para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs).
As informações, que são divulgadas há 15 anos pelo Ministério da Saúde, são essenciais para políticas de combate ao tabagismo, consumo excessivo de álcool, nutrição inadequada e inatividade física.
A pesquisa Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico (Vigitel) com os dados do ano passado ainda não foi publicada. Além disso, não há informações sobre a realização este ano. No site do Ministério sobre o tema, ainda estão no ar os anúncios da edição de 2020.
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Por meio da Vigitel, o poder público tem condições de traçar um perfil dos brasileiros que convivem com as DCNTs. O estudo levanta dados sobre os fatores de risco para esses males, monitora a frequência, a distribuição e a evolução dos indicadores e é essencial para nortear políticas.
Na última terça-feira (2) a organização ACT Promoção da Saúde divulgou uma carta pública em que demonstra preocupação com o atraso dos dados. A entidade atua na defesa de políticas de saúde pública, especialmente nas áreas de controle do tabagismo, alimentação saudável, controle do álcool e atividade física. Para ler o documento completo, clique aqui.
Na carta, a ONG destaca a importância da Vigitel, não só para implementação das políticas públicas, mas também para avaliar se o Brasil tem atingido metas internacionais, como o Plano de Ação Global para a Prevenção e Controle das Doenças Crônicas Não Transmissíveis da Organização Mundial da Saúde (OMS).
"Dados científicos são essenciais para o desenho e implementação de políticas públicas, especialmente na saúde", alerta o texto. Segundo a ONG, é grande a relevância desse tipo de doença no cenário nacional, e um apagão de dados é muito prejudicial, "A pesquisa é imprescindível", destaca.
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No combate ao tabagismo, por exemplo, a avaliação permitiu perceber que as políticas implementadas contribuíram "significativamente" para a redução da prevalência até 2014. Nos anos seguintes, houve estabilidade ou crescimento.
"Indiretamente, a pesquisa também permite que o Instituto Nacional do Câncer (Inca) estime o tamanho do mercado ilegal de cigarros, com dados mais independentes daqueles trazidos pela indústria do tabaco", explica o documento.
A pesquisa também é essencial para entender melhor as condições nutricionais dos brasileiros. Foi por meio dela que o sistema de saúde pôde observar o aumento expressivo nos indicadores de excesso de peso e obesidade de adultos brasileiros e partir para a ação.
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Hábitos de consumo de alimentos in natura e ultraprocessados também são compilados desde 2019. O monitoramento é feito para avaliar se frutas, legumes e verduras ainda estão nas mesas dos brasileiros, e quais são os índices de uso dos industrializados relacionados às DCNTs.
A ACT ressalta que a não publicação da Vigitel 2020 e as dúvidas sobre a realização do estudo este ano representam "não apenas um entrave à consistência do monitoramento e à aplicação das políticas públicas, mas também uma grave ameaça e retrocesso à transparência, pilar da democracia".
O Ministério da Saúde foi consultado pela reportagem do Brasil de Fato e enviou um link que traz possibilidade de download com os dados de 2020. No entanto, as informações demandam programas específicos para serem acessadas.
Segundo a pasta, os dados estão disponíveis para análise técnica dos gestores e especialistas da área da saúde. O ministério informou também que está tomando as providências para contratação de nova empresa para execução da pesquisa este ano.
Edição: Vinícius Segalla