Desemprego, inflação e o retrocesso das políticas públicas no governo de Jair Bolsonaro (sem partido) e nos níveis estadual e municipal são os fatores que empurraram quase 600 famílias para as ruas frente ao dilema de pagar o aluguel ou se alimentar. Essa é a situação de quem vive hoje na ocupação dos conjuntos habitacionais Novo Horizonte 1, 2 e 3, em Campos dos Goytacazes, na região norte do estado do Rio de Janeiro.
No local, situado no bairro Parque Aeroporto, deveriam existir desde 2016 quase 800 residências prontas do programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), mas até hoje os sorteados não viram as chaves dos lares aos quais têm direito. A ocupação teve início no dia 13 de abril e reúne, além de contemplados pelo programa, famílias com crianças e idosos que ficaram inadimplentes por não pagarem aluguel.
Entre os movimentos populares e entidades que apoiam a ocupação estão o Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF), o Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro (Sepe-RJ), a Associação dos Docentes da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Aduenf) e partidos políticos.
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Desde o início da ocupação, uma guerra de ações e recursos vêm sendo travada na Justiça. Dois dias depois da chegada de mais de 2 mil pessoas ao local, a Construtora Realiza entrou com um processo de reintegração de posse. A liminar foi deferida e os ocupantes foram obrigados a deixar o conjunto em cinco dias. Mas uma equipe jurídica chegou ao local e reportou à Justiça algumas irregularidades.
"Quando temos uma ação de grande impacto social e em um contexto de pandemia, o correto é que a Defensoria Pública da União seja intimada antes pelo Juízo. Isso não ocorreu. Por isso, tivemos uma vitória parcial e ganhamos mais um mês para dar encaminhamento a essa situação", disse a advogada Rafaelly Galossi, ativista de direitos humanos do coletivo Nós por Nós, em conversa com o Brasil de Fato.
Desocupação
Ao longo do processo, o coletivo e os movimentos populares incluíram a Prefeitura de Campos na negociação com o objetivo de estender o prazo e evitar uma desocupação violenta do local. Assistentes sociais do município estiveram no local para realizar um mapeamento sócio-econômico das famílias que não estavam em nenhum programa habitacional. Mas o planejamento não foi levado adiante.
"A prefeitura não cumpriu com o acordo. Na negociação, foi elaborado um calendário de cadastramento com previsão de três dias para a realização do procedimento, tendo em vista o grande número de ocupantes. Mas a prefeitura só foi ao local no primeiro dia e não realizou o restante do cadastramento, deixando, pelo menos, 182 famílias fora do cadastramento e sem nenhuma resposta", relatou Rafaelly Galossi.
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A última decisão judicial é a determinação de que as quase 600 famílias deixem o conjunto habitacional na próxima segunda-feira (31). Nesta quinta-feira (27), os moradores provisórios do local vão realizar um ato para protestar contra a falta de iniciativas do poder público nas esferas federal, estadual e municipal. Um dos objetivos do protesto é chamar a Prefeitura à responsabilidade na luta por moradia.
"Só queremos um lugar para morar, nossa luta é por um teto. Nossa ocupação tem pessoas idosas, crianças e estão todos dormindo em colchonetes. Vivemos sem água, sem luz. Só pedimos ao poder público uma solução para o nosso problema porque vai ser muito difícil ver quase 600 famílias sendo despejadas e sem ter para onde ir", afirma Marcelo Pereira da Silva, um dos integrantes da ocupação.
Juliana Tavares, professora de Física do Instituto Federal Fluminense (IFF) de Campos e que tem colaborado como militante na ocupação, lembrou que na gestão passada houve corte das refeições do restaurante popular da cidade, fim do transporte público a R$ 1 e interrupção da complementação municipal do Cheque Cidadão, programa de transferência de renda do governo estadual.
"Houve corte de políticas públicas em todos os níveis, muitos retrocessos aqui em Campos na gestão passada, redução do auxílio emergencial pago pelo governo federal e o agravamento da pandemia. Quando as pessoas não têm mais dinheiro para comer, menos ainda elas terão para pagar um aluguel", constatou a professora.
Futuro
No site da Prefeitura de Campos, notícias sobre a entrega das casas do MCMV e a divulgação da lista dos beneficiários só começaram a ser publicadas em 19 de abril, uma semana após a ocupação, quando a construtora Realiza, responsável pelo empreendimento, decidiu então entrar com liminar para a desapropriação.
Nesta quinta-feira (27), a Justiça deferiu um pedido de audiência feira pelo movimento da ocupação e intimou a Prefeitura a comparecer à negociação. Às 14h30 da próxima sexta-feira (28) será decidido o destino das famílias do Novo Horizonte.
Edição: Mariana Pitasse