O Comitê de Defensores de Direitos Humanos do Saara Ocidental (Codesa) informou que seu presidente Babouzid Mohamed Said labaihi e outros dois estudantes saaráuis foram sequestrados na última segunda-feira (10) por forças marroquinas e encontrados horas depois com marcas de tortura.
Independente da Espanha desde 1975, o Saara Ocidental fica no Norte da África, voltado para o Oceano Atlântico, e faz fronteira com Marrocos ao norte, com Argélia a leste e com a Mauritânia ao sul. Desde 1960, integra a lista das Nações Unidas de territórios não autônomos.
Um ataque marroquino à região da chamada "fenda de Guerguerat", porção sul do Saara Ocidental, em novembro de 2020, rompeu o acordo de cessar-fogo assinado entre o Marrocos e a Frente Polisário, movimento pela autodeterminação saaráui, em 1991. Como não houve reação da Organização das Nações Unidas (ONU) ao ataque, os saaráuis declararam “estado de guerra” e regresso à luta armada após quase 30 anos.
O presidente do Codesa e os estudantes Salek Mohamed Salek Baber e Khaled Hussein Lahcen Boufrioua foram encontrados a cerca de 60 km ao sul de El-Aaiún, ocupada ilegalmente pelo Marrocos.
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Os três relatam que cerca de 70 homens mascarados, identificados como membros das forças de ocupação marroquinas, atacaram seus quartos, os vendaram e algemaram.
A família Sid Ibrahim Khaya, que hospedava os três ativistas antes do sequestro, foi vítima de espancamentos e "práticas humilhantes", segundo o Codesa. Entre as vítimas, estariam uma mulher de 84 anos, Mattu Abirik Najem, e seus filhos Sultana Sid Ibrahim Khaya e Luaiara Sid Ibrahim Khaya.
As lesões
Babouzid Mohammad Said Labaihi, presidente do Codesa, apresenta marcas de violência nos joelhos, no ombro direito e nas costas. O estudante Salek Mohammad Salek Baber foi ferido ao nível do olho direito e no lado direito do abdômen. Khaled Hussein Lahcen Boufrioua sofreu ferimentos no olho direito e na orelha direita. Os três tem marcas de algemas nas mãos.
Torturas de ativistas pela autodeterminação do Saara Ocidental não são novidade, e ocorriam mesmo durante os 30 anos de cessar-fogo. Foi o que relatou ao Brasil de Fato a observadora Isabel Lourenço, que representa famílias de presos políticos junto às Nações Unidas.
“Pessoas são detidas arbitrariamente e levadas a prisões dentro do Marrocos, o que é uma violação claríssima do Direito Internacional e da Convenção de Genebra”, disse em novembro de 2020.
O número de presos “fixos”, segundo Lourenço, girava em torno de 40 à época. “Houve centenas de detenções, torturas. Algumas ficaram três anos sem qualquer tipo de julgamento, e estes foram condenados em um tribunal militar, de 20 anos a prisão perpétua, acusados de atacar autoridades marroquinas, sem qualquer evidência, provas forenses, nada disso”, acrescentou.
Lourenço é a única observadora que esteve nos dois julgamentos dos presos políticos, em 2013 e 2017. “Tanto em um como no outro, via-se as marcas de torturas dos acusados. Um deles, mesmo durante o julgamento, continuava sangrando, e tinha a roupa toda manchada de sangue”, finalizou.
O Reino de Marrocos não assume a responsabilidade por esses casos de violência e afirma ter o controle da região desde o Acordo de Madri, em 1975. Um plebiscito prometido à época pelas Nações Unidas, sobre a autodeterminação do território do Saara Ocidental, nunca foi realizado.
Edição: Vivian Virissimo