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Mães e Pais pela Democracia critica decreto que autoriza aulas presenciais no RS

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Sala de aula vazia
Aulas presenciais estão suspensas no RS pela Justiça, mas novo decreto retoma atividades - Créditos da foto: ABRAFI
Manobra legislativa contida no novo decreto estadual tem único intuito de burlar a decisão judicial

O governo do Rio Grande do Sul publicou, nesta sexta-feira (23), o decreto nº 55.852, que autoriza a retomada das atividades presenciais na Educação Infantil e no primeiro e segundo anos do Ensino Fundamental nas cidades em bandeira preta que estiverem registradas no sistema de cogestão.

Lamentável. Primeiro há que se controlar a pandemia, com redução drástica das contaminações e internações. Depois, de forma planejada, com base em dados e evidências, garantindo transparência e segurança aos envolvidos, deve-se garantir o retorno presencial das aulas, com limite de alunos por sala de aula. O Decreto 55.759 que retira o teto de 50% de alunos por sala precisa ser revogado, deve-se fazer contratos temporários para enfrentar o duplo déficit de professores e profissionais da limpeza, muitos dos quais, tragicamente, tombaram por conta da pandemia.

Voltar sem condições, sem uma capacitação adequada e sem a ciência como baliza, refém da pressão política ou empresarial, não se apresenta como razoável. Ao que parece, a decisão tomada pelo governador só pode ser compreendida se amparada por um eventual acordo com os demais poderes de Estado e chefes do Poder Executivo Municipal, favoráveis à abertura indiscriminada das escolas e da economia, porque negam ou ignoram o atual estágio da pandemia no estado e no país.

Precisamos garantir a isonomia do direito à educação entre as redes de ensino públicas e privadas, como determina a Constituição Federal, e entre as escolas da mesma rede, já que 328 estaduais não têm sequer banheiro. Somente com controle da circulação do vírus, um bom planejamento técnico e muito diálogo com as comunidades escolares, e amparo na ciência, reforce-se, será possível a abertura segura das escolas, na linha do que preconiza a Associação Mães e Pais pela Democracia e a Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul.

A prioridade para a educação com a vacinação dos seus profissionais, sobretudo de 40 a 60 anos, é condição sine qua non para uma escola segura. Crianças abusadas não vão à escola na pandemia. Já sabemos disso. O remédio aqui, mais uma vez, é a inteligência de dados e informações com a busca ativa de crianças em situação de vulnerabilidade, a partir do pronto e urgente restabelecimento do COE como instância articuladora de toda a política, inclusive de provimento de alimentação e assistência tecnológica (acesso à internet e computador) para todos os alunos da rede pública estadual e municipais.

O que se viu na coletiva do governador, realizada na manhã desta sexta-feira (23), no entanto, e lamentavelmente, foi apenas um esforço discursivo para travestir a verdade dos fatos. Ainda vivemos um contexto de descontrole, de falta de leitos e infraestrutura básica para o retorno (como as vacinas para os profissionais da Educação). Tanto isso é verdade que o governo do estado não altera a bandeira de preta para vermelha. Joga para a torcida, para os prefeitos, uma responsabilidade que incumbe ao Poder Executivo estadual.

Ora, estamos diante de flagrante violação de decisão judicial, o que requer providências imediatas das demais autoridades constituídas, como o Ministério Público e o Poder Judiciário. Do contrário, as escolas serão fechadas novamente, retardando a volta às aulas efetiva, com enorme custo de vidas humanas.

Nossos filhos e filhas não são cobaia para pseudoexperimentos de políticas públicas. Mais um ano sem condições de volta às aulas, governador? Queremos a volta às aulas, com as vidas preservadas! Afinal, como sacramentou o Poder Judiciário gaúcho e brasileiro, ao corroborar a manutenção da liminar da Ação Civil Pública ajuizada pela AMPD: o essencial é a vida!

A Associação Mães e Pais pela Democracia, que entende que o novo decreto é uma manobra com o único intuito de burlar a decisão judicial que impede a reabertura das escolas em meio à pandemia, lançou uma nota a respeito. Confira:

NOTA DA ASSOCIAÇÃO MÃES E PAIS PELA DEMOCRACIA A RESPEITO DO NOVO DECRETO ESTADUAL, QUE PRETENDE O RETORNO DAS AULAS PRESENCIAIS EM BANDEIRA PRETA

A Associação Mães e Pais pela Democracia (AMPD), autora, em conjunto com o CPERS, da Ação Civil Pública em que restou deferida a liminar de suspensão das aulas presenciais em todo o Estado do RS, decisão judicial esta que também foi corroborada pelo TJRS e STF, entende que não há possibilidade de volta às aulas enquanto houver a manutenção da bandeira preta no RS.

A cogestão e a mudança de bandeira nos municípios pelos prefeitos, mera manobra legislativa contida no novo decreto estadual com o único intuito de burlar a decisão judicial, não muda a realidade que justificou a suspensão das aulas presenciais: o ainda elevado índice de ocupação de UTIs e leitos hospitalares e o alto número de novos infectados pela covid-19. Fatores estes, à evidência, que justificam, segundo o modelo de distanciamento controlado implementado pelo RS a mencionada bandeira preta.

Além do mais, nos quase 2 (dois) meses de suspensão das aulas durante a bandeira preta, não houve melhoras significativas nas condições sanitárias e de circulação do vírus, adequação de protocolos e reformas estruturais nas escolas públicas para garantir um retorno seguro para todos. Mesmo nas escolas particulares, as medidas mitigatórias não são suficientes neste momento.

Já sabemos igualmente que crianças também são vetores da doença. A escola não é um ambiente isolado do restante da sociedade. Crianças, pais e professores precisam de transporte público, aumentando a circulação de pessoas e, consequentemente, agravando o risco de contaminação. Que se garantam já as condições de ensino remoto e o alimento para os estudantes necessitados, enquanto não for possível a volta às aulas de modo presencial.

A AMPD entregará na próxima semana ao governador Leite, prefeito Melo e presidente da ALRS, deputado Gabriel Souza, documento em que apresenta agenda prioritária para tornar possível o retorno seguro às aulas presenciais. A começar pela vacinação dos professores e profissionais da educação, ao menos na faixa etária entre 40 e 60 anos, em que há maior índice de letalidade e transmissão do vírus, sem prejuízo do imperativo de que medidas concretas no cumprimento dos protocolos e na implementação das medidas preventivas e mitigatórias dos riscos de contágio sejam efetivamente tiradas do papel por parte das autoridades públicas estaduais (e municipais) competentes.

#EscolaAbertaNaHoraCerta #NaLutaPelaVoltaSegura

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira