A quantidade de territórios quilombolas reconhecidos pelo governo federal chegou ao menor número desde 2004, quando as regras atuais de certificação foram criadas.
A informação está presente no estudo “Direito à terra quilombola em risco - Reconhecimento de territórios tem baixa histórica no governo Bolsonaro”, elaborado pelo projeto Achados e Perdidos, iniciativa da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e da Transparência Brasil, em parceria com a agência de dados Fiquem Sabendo.
O estudo, publicado na última sexta-feira (16), mostrou que apenas 29 certificações foram emitidas em 2020: 56% a menos do que em 2019. A certificação, de responsabilidade da Fundação Cultural Palmares (FCP), é o primeiro passo para a regularização de um território quilombola. Somente a titulação, de responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), é que oficializa a posse.
Quanto a esta última fase, ainda em 2020, apenas um território quilombola concluiu o processo e recebeu a titulação: o Quilombo Rio dos Macacos, no norte da Bahia.
Durante todo o governo Bolsonaro, apenas três territórios foram titulados e 12 editais de Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), um dos passos à titulação, foram publicados pelo Incra.
Para os pesquisadores, a decadência dos números reflete a “concretização da visão da atual gestão federal em relação à garantia e exercício dos direitos de povos tradicionais”, já expressa antes mesmo de Bolsonaro se tornar presidente.
Em 2017, por exemplo, o capitão reformado disse, durante um evento no Clube Hebraica do Rio de Janeiro, que havia visitado um quilombo em Eldorado Paulista, no interior de São Paulo, e que “o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas”. “Não fazem nada! Eu acho que nem para procriadores servem mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado (sic) com eles”, afirmou. Bolsonaro ainda disse que, no governo, não demarcaria nem um centímetro de terras indígenas e quilombolas.
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Segundo o relatório, “o discurso é colocado na prática de três principais formas: falta de transparência sobre a execução das políticas, esvaziamento institucional e redução de orçamentos aos menores índices da história recente”.
Com a aprovação do Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) enviado pelo Planalto ao Congresso para 2021, órgãos como o Incra e a FCP devem receber menos verba, o que inviabiliza ainda mais a demarcação de terras, por exemplo.
De acordo com o PLOA, haverá um corte de 90% dos recursos destinados para ações de reconhecimento e indenização de territórios quilombolas, concessão de crédito às famílias assentadas e aquisição de terras.
O relatório completo pode ser acessado na íntegra aqui.
Edição: Poliana Dallabrida