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Cinco anos após impeachment, protagonistas do processo respondem a crimes na Justiça

Série de reportagens do Brasil de Fato mostra como a retirada da presidenta eleita ecoa na política brasileira até hoje

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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17 de abril de 2016: Câmara dos Deputados abre o processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff (PT) - Evaristo Sá-AFP

No dia 17 de abril de 2016, 367 deputados federais votaram “sim” e decidiram que o processo de impeachment contra a então presidenta Dilma Roussef (PT) deveria ser instaurado pela Câmara dos Deputados. O episódio, que completa cinco anos, é lembrado, a partir de agora, em uma série de reportagens que o Brasil de Fato passa a publicar, de hoje (14) até o final desta semana.

Os discursos de alguns dos parlamentares foram ridicularizados em diversos setores e a contabilidade das justificativas dos votos escancaram como os motivos para o impeachment era o que menos importava. Por 136 vezes, os deputadas citaram a palavra “família”, “corrupção” foi mencionada 65 vezes, “Deus” foi citado em 59 discursos e dez políticos aludiram aos evangélicos, segundo levantamento feito pelo Congresso em Foco, na época.

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Com o passar do tempo, chamou a atenção a dupla moral de alguns dos parlamentares que decidiram o destino de Dilma Rousseff, que nunca foi condenada por qualquer crime. O Brasil de Fato destacou nove deputados federais que votaram a favor do golpe e que, após cinco anos da votação, estão nas fileiras dos tribunais ou presos.

Michel Temer (MDB)

Em seu livro “Tchau, querida – O diário do impeachment”, Eduardo Cunha, ex-deputado federal do MDB, que presidia a Câmara dos Deputados na época da votação, conta que o vice-presidente Michel Temer (MDB), que se queixava de ser apenas figura decorativa em Brasília, trabalhou para o golpe contra a petista.

“Jamais esse processo de impeachment teria sido aprovado sem que Temer negociasse cada espaço a ser dado a cada partido ou deputado que iria votar a favor da abertura dos trâmites”, afirma Cunha na publicação, que deve ser lançada em abril. Temer sempre negou que tenha cooperado para o golpe, mas não escondeu a satisfação em assumir o lugar de Dilma, reeleita em 2014 com 54 milhões de votos.

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Três anos após se beneficiar do golpe, Temer foi preso em São Paulo, acusado de desvio de dinheiro nas obras da usina nuclear de Angra 3. O ex-presidente passou seis dias detido no Comando de Policiamento de Choque, na região da Lapa, zona oeste da capital paulista, e ainda responde à Justiça.

Eduardo Cunha

Era o presidente da Câmara que aceitou o processo de impeachment e colocou para ser votado pelo plenário da Casa. Cinco meses depois, em 19 de outubro de 2016, foi preso por decisão do então juiz Sérgio Moro, no âmbito da Operação Lava Jato.

Em setembro de 2020, Cunha foi condenado a 15 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Em março de 2020, por conta da pandemia do coronavírus, teve autorizada a sua prisão domiciliar. O ex-deputado deixou, então, o Complexo Penitenciário de Bangu 8, usando tornozeleira eletrônica, para cumprir sua pena em casa.

Jair Bolsonaro

Um dos discursos mais contraditórios do dia 17 de abril de 2016 foi o do então deputado federal Jair Bolsonaro. Na época, o ex-capitão dedicou seu voto à memória do torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-coronel do Exército brasileiro, que morreu em 15 de outubro de 2015.

Impulsionado por um populismo de direita que ascendia em diversas regiões do mundo, Bolsonaro chegou à Presidência da República em 2018. Desde então, 71 pedidos de impeachments se acumulam na Câmara dos Deputados contra o mandatário, que é considerado o pior presidente da história brasileira.

A maior parte dos pedidos de impeachment foram protocolados no período da pandemia, entre março de 2020 e março de 2021. Bolsonaro negou, desde o princípio, o potencial trágico do coronavírus, e hoje o Brasil acumula mais de 350 mil mortes. Para muitos, a responsabilidade direta é do presidente, que agora será investigado, também, pela CPI da Pandemia, instalada no Senado Federal.

Indio da Costa

Preso no dia 6 de setembro de 2019, Indio da Costa foi um dos 367 responsáveis pelo golpe contra Dilma Rousseff. O ex-deputado federal chegou a disputar, pelo PSD, em 2018, o governo do Rio de Janeiro, mas recebeu a confiança de apenas 454 fluminenses, pouco mais de 5% dos votos.

Costa foi preso em uma operação da Polícia Federal contra um esquema de fraude no Correios. De acordo com os investigadores, o prejuízo à estatal causado pela organização, da qual o ex-deputado fazia parte, foi de R$ 13 milhões.

Indio da Costa aguarda o julgamento em liberdade e exerce a advocacia.

Celso Russomanno

Desde que votou pelo impeachment de Dilma Rousseff, Celso Russomanno já perdeu duas eleições para a Prefeitura de São Paulo. A última delas, em 2020, com apenas 10% das intenções de votos, depois de ter liderado a corrida eleitoral até a véspera do pleito.

Russomanno acumula condenações na Justiça. Em grande parte, seus problemas nos tribunais ocorrem por conta de sua postura no quadro “Patrulha do Consumidor”, hoje na TV Record, mas que já passeou por outras emissoras.

Atualmente, o ex-candidato é deputado federal pelo Republicanos.

Jerônimo Goergem

Conhecido por suas políticas anti-indigenista, o deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) também cooperou para o golpe do dia 17 de abril de 2016. O parlamentar foi citado, em maio de 2017, por Ricardo Saud, diretor da JBS, em depoimento à Polícia Federal. Na época, o executivo afirmou que o parlamentar recebeu R$ 100 mil em propina. O “favor” era para que o político não falasse mal da empresa.

Em agosto de 2019, Goergen foi condenado pela 7ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre por improbidade administrativa. De acordo com a denúncia do Ministério Público, o parlamentar mantinha funcionários fantasmas em seu gabinete quando era deputado estadual no Rio de Grande do Sul.

Paulo Maluf

O político paulista, reconhecido por sua longa ficha de escândalos na política nacional, também cooperou para o golpe. Em dezembro de 2017, Paulo Maluf, do PP, foi preso, após determinação do Supremo Tribunal federal (STF). A mesma corte condenou o parlamentar a 7 anos e 9 meses de prisão por lavagem de dinheiro.

Em agosto de 2018, Maluf teve seu mandato cassado pela Câmara dos Deputados. Desde o dia 28 de março de 2020, o ex-deputado federal cumpre prisão domiciliar.

Alfredo Kaefer

O Paraná é um dos estados mais importantes para o agronegócio brasileiro. Na Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), somente Minas Gerais possui mais deputados federais do que os paranaenses. No estado sulista, Alfredo Kaefer sempre foi a liderança entre os ruralistas e assim como toda a bancada, votou pelo golpe de Dilma Rousseff.

Em 2014, Kaefer era o deputado mais rico da Câmara, com uma fortuna de R$ 108 milhões declarados. Em 2018, no entanto, o patrimônio do paranaense despencou para R$ 1,3 milhão.

Pois bem, por crime financeiro, Kaefer cumpre sua pena de quatro anos e seis meses em prisão domiciliar, utilizando tornozeleira eletrônica, desde o dia 15 de junho de 2020.

Cristiane Brasil

Filha de Roberto Jefferson, a ex-deputada Cristiane Brasil era uma das mais fiéis defensoras do golpe em Dilma Rousseff. Sua visibilidade com a causa foi tamanha que chegou a ser cogitada candidata à Prefeitura do Rio de Janeiro, em 2020. Porém, às vésperas da eleição, o PDT desistiu de lançá-la no pleito pela legenda.

A desistência ocorreu quando Brasil estava presa, em 18 de setembro. Uma semana antes, em 11 de setembro de 2020, Brasil se entregou a Polícia Civil do Rio de Janeiro, onde passou 33 dias presa, acusada de ter recebido propina quando comandava a Secretaria do Envelhecimento Saudável da Prefeitura carioca. Hoje em dia, responde a processo em liberdade.

Edição: Vinícius Segalla