57,6% dos trabalhadores entrevistados disseram que a jornada está mais pesada
Profissionais que atuam na porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS), e que já sofriam com a precarização, estão sob condições de crescente vulnerabilidade com a pandemia do coronavírus. Faltam equipamentos de proteção, treinamento e até água e sabão.
Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz ouviu trabalhadores da enfermagem, agentes de combate a endemias, médicos e psicólogos que estão na Estratégia de Saúde da Família (ESF), nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).
As conclusões são de que parte dessas categorias trabalham sob vínculos empregatícios frágeis, pouco acesso a Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), sem orientação e relatam sentimentos de angústia e tristeza.
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Dos mais de 250 entrevistados, todos atuando na cidade do Rio de Janeiro, mais de 14% estão em contrato temporário; 3,9%, recebem remuneração por bolsas, nos moldes de residência, são contratados como pessoas jurídicas ou têm outros tipos de vínculos.
A pesquisadora Regimarina Reis afirma que foram notados "vínculos empregatícios que não asseguram a estabilidade e o acesso a direitos trabalhistas para esses profissionais. O que expõe os trabalhadores à vulnerabilidade e insegurança, inclusive em caso de necessidade de afastamento por covid-19".
Regimarina, que é uma das coordenadoras do estudo, complementa, "esse dado chama mais atenção ainda se nós notarmos a ampla exposição dos trabalhadores aos riscos, evidenciada pelos problemas de acesso a uso de EPIs durante a pandemia".
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O índice dos que relatam não terem recebido EPIs em quantidade suficiente para o trabalho é de 32,9%. Mais de 17% disseram não ter acesso a água e sabão sempre que necessário nas unidades de atendimento.
Parte dos trabalhadores (35,3%) também afirma sentir insegurança quanto ao uso dos equipamentos de proteção e mais de 50% disseram não ter passado por treinamento para lidar com o aparato.
Nem mesmo a formação sobre a covid-19 foi inteiramente disponibilizada. A falta de acesso a essas informações esteve presente nas respostas de 44,5% dos participantes da pesquisa.
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Problemas como atraso dos salários e falta de apoio à saúde mental desses profissionais prevalecem. Em 57,6% das respostas, os participantes disseram que a jornada está mais pesada e mais de 20% tiveram o pagamento atrasado. Mais de 60% mencionaram sentimentos de angústia e tristeza.
Os resultados completos da pesquisa estão disponíveis para consulta no site da Fiocruz. Além de um painel digital, a pesquisadora a professora-pesquisadora, Mariana Nogueira, que também liderou a pesquisa, explica que será produzido um curta metragem sobre o estudo.
"Estamos produzindo um curta metragem e realizando grupos focais online com trabalhadores de diferentes serviços. Nesses grupos focais, os trabalhadores têm relatado e avaliado as situações que vivenciam no combate à pandemia", explica Mariana.
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Segundo ela, os relatos tratam dos impactos da crise sanitária na vida dos profissionais, "das condições de trabalho, da precariedade das condições de trabalho nos serviços municipais na cidade do Rio de Janeiro e da própria saúde dos trabalhadores."
O estudo foi desenvolvido pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), em parceria com o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), do Núcleo de Saúde do Trabalhador (Nust/Fiocruz).
Também estiveram envolvidas as universidades Federal Fluminense (UFF) e do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). O financiamento da pesquisa foi feito pelo edital Encomendas Estratégicas, do Programa da Fiocruz de Fomento à Inovação, o Inova Fiocruz.
Edição: Rebeca Cavalcante