Homenagem

Joaquin Piñero provou que o sonho da comunicação popular é possível

Joaquin foi um dos principais responsáveis pela criação do Brasil de Fato em formato tablóide no Rio de Janeiro (RJ)

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Ao fundo, Joaquín posa com a equipe do Brasil de Fato RJ em 2019 - Brasil de Fato RJ

A sexta-feira (12) amanheceu mais triste com a notícia da despedida de Joaquin Piñero, apaixonado militante das causas sociais e da luta pela comunicação popular.

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Joaquin foi um dos principais responsáveis pela criação do Brasil de Fato em formato tablóide na cidade do Rio de Janeiro, iniciativa pioneira do campo popular e que foi lançada posteriormente em diversas capitais do país.

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Um projeto extremamente ousado que distribuiu, de graça, milhares de exemplares de jornais para a classe trabalhadora. O objetivo era mostrar uma visão popular do Brasil e do mundo, radicalmente diferente da apresentada pelo monopólio da imprensa brasileira.

No início, em maio de 2013  - ou seja, às vésperas das manifestações de junho de 2013 - , chegou a ter 100 mil exemplares distribuídos gratuitamente, sobretudo para os passageiros que chegavam de trem ou metrô na Central do Brasil.

Tal iniciativa só havia sido concretizada pela esquerda no Rio de Janeiro em períodos ditatoriais, jamais em tempos democráticos, e Joaquin trabalhou duro para realizar esse feito.

Antigo sonho do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o jornal gratuito lançou a esquerda no grande desafio de sair da sua bolha e dialogar diretamente com a classe trabalhadora.

Nunca foi fácil a escolha dos temas e do tom a ser usado para debater as ideias de esquerda com uma linguagem mais próxima do povo. Para isso, Joaquin e os demais conselheiros e conselheiras se revezam para fazer o exercício da análise da conjuntura e também na elaboração de editoriais sobre pautas da semana.

O projeto prosperou e chegou a ter duas edições semanais, uma na segunda-feira e outra na quinta-feira, dias escolhidos não à toa, mas para contemplar os resultados das partidas de futebol na contracapa - uma forma de iniciar a prosa sobre as pautas da semana com a perspectiva da esquerda.

Porém, em diversos momentos o projeto cambaleou com períodos de suspensão de circulação devido aos custos de impressão e passou a centrar sua produção jornalística na internet.

A última edição impressa do jornal circulou em fevereiro de 2020 logo após a decretação da pandemia. Ao longo desses anos, o jornal resistiu com apoio de sindicatos de trabalhadores petroleiros e também da Prefeitura de Maricá.

Joaquin escrevia semanalmente e de forma disciplinada sobre a conjuntura na América Latina em sua coluna que era publicada no jornal, reproduzida na internet e locutada para o programa de rádio do Brasil de Fato, veiculado de segunda a sexta-feira na rádio Band AM por mais de um ano.

Muitas vezes escrevia nas madrugadas, direto da Escola Florestan Fernandes, após as aulas dos cursos de formação ou também de países da América Latina em função de suas viagens em missões internacionalistas representando o MST.

Mas se engana quem pensa que a participação de Joaquin nos projetos de comunicação se restringia ao Brasil de Fato RJ. Antes disso, participou da construção do Brasil de Fato em formato standard, fundado em 2003, do jornal Sem Terra, da Agência Notícias do Planalto (ANP) e mais recentemente do CPMídias. Também colaborou regularmente com diversos veículos da América Latina, sobretudo a Telesur da Venezuela.

No Brasil de Fato RJ, Joaquin sonhou junto com os saudosos militantes Vito Gianotti, Alvaro Neiva e Mario Augusto Jakobskind criar um veículo de comunicação para expressar os anseios e demandas da classe trabalhadora.

Testemunhei os grandes esforços e sacrifícios realizados pelo MST e pela Consulta Popular para colocar esse projeto nas ruas e só tenho a agradecer a honra de ter tido a chance de sonhar e também de ter certeza que um projeto popular de comunicação é possível.

Joaquin, presente!

*Vivian Virissimo é jornalista e atuou como editora na fundação do Brasil de Fato RJ de 2013 até 2020.

Edição: Leandro Melito