Assim que foi oficializada a vitória do presidente eleito Jair Bolsonaro, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) foi às redes sociais parabenizá-lo. Ela está entre os cotados para ser a próxima presidente do Senado, embora a possível volta de Renan Calheiros (MDB-AL) ao posto possa levá-la a presidir a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Bem vista entre os políticos do PSL, Simone pode ganhar força para demandas caras à sua base eleitoral, o Mato Grosso do Sul, onde estão seus doadores de campanha e onde mantém negócios. Entre essas bandeiras estão medidas que cerceiam os processos de demarcação de terras indígenas.
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A senadora é constante defensora do projeto de lei que garante indenização em dinheiro aos proprietários para a demarcação de terras indígenas. Segundo a assessoria de imprensa da senadora, ela é a autora do artigo que garante o uso em dinheiro, sem a possibilidade de títulos ou precatórios, como nos assentamentos da reforma agrária, segundo Marcio Santilli, do Instituto Socioambiental (ISA).
Na sua justificativa, Simone argumenta que “não basta que seja criada a pretensão à indenização dos não-índios: ela precisa ser proveitosa. Admitir o risco de que os detentores dos títulos dominiais em questão fiquem nas intermináveis filas para recebimento de precatórios, ou recebam títulos estéreis e ilíquidos, equivale a prorrogar o conflito, perpetuar a injustiça e adiar a solução.”
Segundo sua assessoria de imprensa, a matéria tramita como PEC 132/2015 na Câmara e foi aprovada na CCJ, mas devido à intervenção federal no Rio de Janeiro, todas as PECs estão com tramitação suspensa.
Em outro projeto de lei (PLS 494/2015), Simone pediu a suspensão por dois a quatro anos de qualquer processo de demarcação em terras indígenas se houver questionamento e não houver estudo antropológico.
A medida, cujo arquivamento foi pedido pela própria senadora, é tão ampla que abarca a turbação, ou seja, a simples manifestação contrária à posse do imóvel pode parar o processo de demarcação. A falta de avaliação antropológica afetaria pelo menos 144 terras indígenas em fase de estudo ao longo do território, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai).
Dinheiro da JBS, ajuda para JBS
Casado com a senadora, o deputado estadual reeleito Eduardo Rocha (MDB) atua em Campo Grande conforme os mesmos interesses. Em junho de 2016, quando o agente de saúde Clodiodi Aquileu Rodrigues de Sousa foi assassinado, ele se solidarizou com os ruralistas. O assassinato do Guarani Kaiowá marcou o episódio que ficou conhecido como Massacre de Caarapó.
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Durante o atual mandato na Assembleia, Rocha participou ativamente da CPI do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Essa Comissão Parlamentar de Inquérito buscava criminalizar a instituição que trabalha para denunciar a violência sofrida por grupos indígenas pelo país. O relatório acabou sendo arquivado pela Justiça.
Na política da boa vizinhança, o deputado agrada os ruralistas locais. Ele condecorou o prefeito de Costa Rica, Waldeli Rosa (MDB), que já foi cotado para ser governador e possui 12 mil hectares de terra. “Um só prefeito tem mais hectares que terra indígena em disputa no MS".
Simone e Eduardo têm suas campanhas majoritariamente financiadas pelo agronegócio. A campanha de 2014 da senadora somou R$ 3 milhões em empresas e pessoas físicas ligadas ao agronegócio, 94% do que arrecadou naquele ano. O deputado estadual recebeu R$ 317 mil de um grupo similar de doadores, metade do valor de sua campanha.
Em 2018, a receita de campanha de Rocha caiu pela metade (R$ 351 mil), mas ficou praticamente em família. A sogra Fairte Nassar Tebet (viúva de Ramez Tebet, ex-presidente do Senado) e Simone Tebet, proprietárias de terras, doaram R$ 90 mil.
Entre as empresas, a principal doadora em 2014 foi a JBS, com R$ 52 mil para Rocha e R$ 1,7 milhão para Simone. Após a delação premiada dos sócios da empresa, ambos participaram de Comissões Parlamentares de Inquérito na Assembleia e no Congresso. Rocha chegou a propor um acordo de leniência para resolver o bloqueio de R$ 115 milhões dos bens da JBS, determinado pela Justiça.
O setor sucroalcooleiro também fez doações para o casal. Em 2014, as empresas Iaco Agrícola, Rio Claro Agroindustrial e Usina Eldorado, as duas últimas do grupo Odebrecht, deram R$ 150 mil para ele e R$ 1,07 milhão para ela. Todas têm atividade no estado. A Coopersucar, líder do mercado, doou R$ 50 mil para a senadora.
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O setor de celulose também contribuiu para a carreira política de Simone Tebet. A senadora recebeu R$ 100 mil da Fibria Celulose. Em maio de 2015, ela comemorava na tribuna a expansão da fábrica no município de Três Lagoas, onde foi prefeita, além de defender os incentivos fiscais que a empresa recebe.
A senadora possui uma fazenda em Caarapó, a Santo Antônio da Matinha. Seu irmão, Rames Nassar Tebet, produz eucalipto nos municípios de Santa Rita do Pardo e Três Lagoas. Rames contribuiu com R$ 30 mil para a campanha da irmã.
Ramez Tebet investiu em terras
O patriarca Ramez Tebet chegou na região em 1975, investindo em terras. Ele foi ministro da Integração Nacional por alguns meses, durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Anos antes, foi acusado de desvio de dinheiro público quando esteve à frente da extinta Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste, a Sudeco, entre 1987 e 1990.
Em 2012, o Ministério Público Federal investigava Simone por contratação ilegal de fundação para cuidar da saúde de Três Lagoas, quando era prefeita. Em 2016, a senadora teve os bens bloqueados por causa de outra ação do Ministério Público Federal, relativa ao desvio de verbas para a construção de um balneário no município. Em fevereiro, a Justiça, após recurso, manteve a decisão.
No Senado, Simone irá discutir a reforma previdenciária. Sua mãe, Fairte Nassar Tebet, recebe R$ 31 mil mensais de pensão. Motivo: Ramez Tebet governou por dez meses o Mato Grosso do Sul, entre maio de 1986 e março de 1987.